"É um problema cultural"

22-05-2001
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"É Um Problema Cultural"

Por SÃO JOSÉ ALMEIDA

Quinta-feira, 29 de Março de 2001

PSD, CDS-PP, PCP e "Os Verdes" opõem-se à imposição legal de quotas para atingir paridade

A introdução legal de quotas mínimas por sexos como instrumento para atingir a paridade entre homens e mulheres na ocupação de cargos de poder electivos é rejeitada pelo PSD, pelo CDS-PP, pelo PCP e por "Os Verdes".

Manuela Ferreira Leite, vice-presidente da bancada do PSD, foi peremptória em declarar ao PÚBLICO que o PSD votará contra a proposta do Governo e o projecto do Bloco de Esquerda, tal como fez quando o assunto esteve em debate em 1999. A deputada esclareceu mesmo: "Consideramos que este não é um tema importante da reforma eleitoral e da reforma do sistema político que o país precisa."

Abordando o tema em concreto, Manuela Ferreira Leite argumentou que "não há, em Portugal, legislação proibitiva de que as mulheres participem na vida política". Na sua opinião, o que está em causa "é um problema cultural, não um problema legal". Acrescenta que "não faz sentido os partidos recorrerem a uma lei", quando "não conseguem impor a si próprios" critérios paritários na elaboração das listas. Advoga ainda que com este sistemas "as mulheres seriam encaradas, não pelo seu mérito, competência e capacidade, mas porque, obrigatoriamente, teriam de estar lá para fazer número". E desabafa sobre tal opção: "É humilhante!"

A vice-presidente da bancada do PSD lembra que "o actual quadro de frequência universitária" é maioritariamente de mulheres e defende que "a ordem natural das coisas" é que elas "vão passar a participar em mais actividades, vão interessar-se mais pela política". Para concluir: "Está-se a lutar não por um direito, que já existe, mas pelo exercício de um direito que não se exerce por uma questão cultural e os problemas culturais não se resolvem por decreto".

Frontalmente contra está também o CDS-PP. Maria Celeste Cardona foi ao ponto de afirmar ao PÚBLICO: "Não gosto de quotas. As mulheres têm muito mais problemas para resolver: Portugal tem dois por cento de creches financiadas pelo Estado e a média comunitária ronda entre 35 e 49 por cento; o trabalho em 'part-time' em Portugal é de 13 por cento e na Holanda chega a 68,5; no Luxemburgo os subsídios para três filhos são 750 euros e em Portugal são 40. Estes são só alguns dos problemas que não se resolvem com quotas, mas com a criação de condições efectivas de igualdade de circunstâncias."

Recusando "a construção da casa pelo topo sem olhar para as causas das coisas", Maria Celeste Cardona considera que o debate sobre esta questão "é ridículo" e remete-o para outro nível: "Sinceramente, para tentar perceber a vida das mulheres basta passar, por exemplo, ao sábado, em determinadas zonas como Rio de Mouro ou Mercês. Sabe o que vê nas varandas? Roupa estendida." E prossegue: "Sabe o que isto quer dizer? Que as mulheres passam a semana inteira num vai e vem louco, a trabalhar, a ir buscar e levar os filhos - às vezes aos pais porque não há creches - e ao sábado lavam a roupa e deixam a comida feita para a semana. E eu pergunto: é com quotas que isto se resolve?"

A ausência de estruturas de apoio à família e desigualdade da situação social da mulher é igualmente prioritária para Isabel Castro, de "Os Verdes". Em declarações ao PÚBLICO, a deputada exemplifica essa falta de estruturas apontando "o tratamento das crianças e idosos, o acesso ao emprego, a progressão na carreira e no salário, o acesso a cargos por nomeação". Por isso, Isabel Castro considera: "Defender o instrumento quotas só para o domínio da política é grave. Sobretudo quando não há uma estratégia para contrariar a situação actual."

E questionou: "Se as quotas são adoptadas como elemento corrector, não estamos a criar uma situação perversa? É que hoje as mulheres estão em maioria na universidade, o que se faz com estas mulheres? Retiram-se? Impede-se que frequentem?" Para concluir: "Esta solução é contraproducente, pois é uma medida desligada de qualquer estratégia sobre o problema das mulheres e da desigualdade."

Já Luísa Mesquita, do PCP, advoga outros problemas para justificar o voto contra dos comunistas. Começando por subscrever a "análise de Vital Moreira que aponta não se poder tratar do problema só ao nível do resultado, enquanto se ignoram medidas fácticas para combater a discriminação", a deputada levanta a questão da constitucionalidade.

É que, para Luísa Mesquita, no regime proposto pelo PS, a "substituição dos deputados gera desigualdade", e exemplifica: "A substituir uma deputada, tem de entrar outra mulher para manter a quota e assim são preteridos dois homens pelo meio. Ora isto não são critérios de igualdade mas de paridade que questionam direitos consagrados na Constituição."

"É Um Problema Cultural"

Por SÃO JOSÉ ALMEIDA

Quinta-feira, 29 de Março de 2001

PSD, CDS-PP, PCP e "Os Verdes" opõem-se à imposição legal de quotas para atingir paridade

A introdução legal de quotas mínimas por sexos como instrumento para atingir a paridade entre homens e mulheres na ocupação de cargos de poder electivos é rejeitada pelo PSD, pelo CDS-PP, pelo PCP e por "Os Verdes".

Manuela Ferreira Leite, vice-presidente da bancada do PSD, foi peremptória em declarar ao PÚBLICO que o PSD votará contra a proposta do Governo e o projecto do Bloco de Esquerda, tal como fez quando o assunto esteve em debate em 1999. A deputada esclareceu mesmo: "Consideramos que este não é um tema importante da reforma eleitoral e da reforma do sistema político que o país precisa."

Abordando o tema em concreto, Manuela Ferreira Leite argumentou que "não há, em Portugal, legislação proibitiva de que as mulheres participem na vida política". Na sua opinião, o que está em causa "é um problema cultural, não um problema legal". Acrescenta que "não faz sentido os partidos recorrerem a uma lei", quando "não conseguem impor a si próprios" critérios paritários na elaboração das listas. Advoga ainda que com este sistemas "as mulheres seriam encaradas, não pelo seu mérito, competência e capacidade, mas porque, obrigatoriamente, teriam de estar lá para fazer número". E desabafa sobre tal opção: "É humilhante!"

A vice-presidente da bancada do PSD lembra que "o actual quadro de frequência universitária" é maioritariamente de mulheres e defende que "a ordem natural das coisas" é que elas "vão passar a participar em mais actividades, vão interessar-se mais pela política". Para concluir: "Está-se a lutar não por um direito, que já existe, mas pelo exercício de um direito que não se exerce por uma questão cultural e os problemas culturais não se resolvem por decreto".

Frontalmente contra está também o CDS-PP. Maria Celeste Cardona foi ao ponto de afirmar ao PÚBLICO: "Não gosto de quotas. As mulheres têm muito mais problemas para resolver: Portugal tem dois por cento de creches financiadas pelo Estado e a média comunitária ronda entre 35 e 49 por cento; o trabalho em 'part-time' em Portugal é de 13 por cento e na Holanda chega a 68,5; no Luxemburgo os subsídios para três filhos são 750 euros e em Portugal são 40. Estes são só alguns dos problemas que não se resolvem com quotas, mas com a criação de condições efectivas de igualdade de circunstâncias."

Recusando "a construção da casa pelo topo sem olhar para as causas das coisas", Maria Celeste Cardona considera que o debate sobre esta questão "é ridículo" e remete-o para outro nível: "Sinceramente, para tentar perceber a vida das mulheres basta passar, por exemplo, ao sábado, em determinadas zonas como Rio de Mouro ou Mercês. Sabe o que vê nas varandas? Roupa estendida." E prossegue: "Sabe o que isto quer dizer? Que as mulheres passam a semana inteira num vai e vem louco, a trabalhar, a ir buscar e levar os filhos - às vezes aos pais porque não há creches - e ao sábado lavam a roupa e deixam a comida feita para a semana. E eu pergunto: é com quotas que isto se resolve?"

A ausência de estruturas de apoio à família e desigualdade da situação social da mulher é igualmente prioritária para Isabel Castro, de "Os Verdes". Em declarações ao PÚBLICO, a deputada exemplifica essa falta de estruturas apontando "o tratamento das crianças e idosos, o acesso ao emprego, a progressão na carreira e no salário, o acesso a cargos por nomeação". Por isso, Isabel Castro considera: "Defender o instrumento quotas só para o domínio da política é grave. Sobretudo quando não há uma estratégia para contrariar a situação actual."

E questionou: "Se as quotas são adoptadas como elemento corrector, não estamos a criar uma situação perversa? É que hoje as mulheres estão em maioria na universidade, o que se faz com estas mulheres? Retiram-se? Impede-se que frequentem?" Para concluir: "Esta solução é contraproducente, pois é uma medida desligada de qualquer estratégia sobre o problema das mulheres e da desigualdade."

Já Luísa Mesquita, do PCP, advoga outros problemas para justificar o voto contra dos comunistas. Começando por subscrever a "análise de Vital Moreira que aponta não se poder tratar do problema só ao nível do resultado, enquanto se ignoram medidas fácticas para combater a discriminação", a deputada levanta a questão da constitucionalidade.

É que, para Luísa Mesquita, no regime proposto pelo PS, a "substituição dos deputados gera desigualdade", e exemplifica: "A substituir uma deputada, tem de entrar outra mulher para manter a quota e assim são preteridos dois homens pelo meio. Ora isto não são critérios de igualdade mas de paridade que questionam direitos consagrados na Constituição."

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