O Independente

09-05-2001
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Editorial

Uma aposta

Inês Serra Lopes

isl@oindependente.pt

Por muito que António Guterres faça saber que “exclui totalmente” a possibilidade de no congresso do PS dar um sinal de que procederá em breve a uma remodelação do Governo, a remodelação é inevitável.

Guterres chegou ao Governo apostando tudo numa política que se pretendia diametralmente oposta à de Cavaco Silva.

Virado para uma comunicação mediática e “humanóide”, Guterres passou quatro anos pacatos. Não fez muito (o que já se sentiu bastante no último ano do primeiro mandato), mas também não fez muito mal. Merecia, pensava o engenheiro, uma maioria absoluta que lhe permitisse realmente “fazer” algumas coisas. O povo, ingrato ou prudente, não lha deu. E Guterres, desiludido, virou a sua atenção e o seu brio para a Europa, um desafio suficiente para um homem cujo desígnio político era agora.

Obrigado pelo fim da presidência da União Europeia e pelo estado em que a sua ausência e a notória falência do modelo dos ministros-coordenadores deixara o Governo, Guterres foi obrigado a voltar a aterrar em São Bento.

De lá para cá, por junto, o Governo fez a reforma fiscal e pouco mais. Em compensação, uma contabilidade superficial dos estragos averba a remodelação de Fernando Gomes e Manuel Maria Carrilho (e as cenas subsequentes, com traidores, Roma e artigos de opinião duros e cínicos), a saída forçada de Armando Vara e Luís Patrão, o abandono de Jorge Coelho...

Não houve um fôlego nem um projecto digno desse nome. A política tem girado à volta dos autogolos que cada um dos ministros semanalmente se encarrega de assestar na baliza do próprio Governo. Os estragos do que os vários ministros dizem diariamente e daquilo que o Governo não faz são irreparáveis.

A remodelação é, assim, inevitável. Excepto se António Guterres estiver a preparar-se para deixar chumbar o Orçamento para o próximo ano, ou seja, se a sua verdadeira aposta no futuro forem eleições antecipadas. É isso que vai estar na cabeça dos congressistas socialistas. Eles sabem que uma remodelação não é suficiente para um novo ciclo. E que os novos ciclos não se anunciam, fazem-se.

O risco é as pessoas, cansadas de palavras, começarem a ter saudades de Cavaco Silva. Esse será, inequivocamente, o sinal de um novo ciclo — um ciclo que não será de António Guterres.

Editorial

Uma aposta

Inês Serra Lopes

isl@oindependente.pt

Por muito que António Guterres faça saber que “exclui totalmente” a possibilidade de no congresso do PS dar um sinal de que procederá em breve a uma remodelação do Governo, a remodelação é inevitável.

Guterres chegou ao Governo apostando tudo numa política que se pretendia diametralmente oposta à de Cavaco Silva.

Virado para uma comunicação mediática e “humanóide”, Guterres passou quatro anos pacatos. Não fez muito (o que já se sentiu bastante no último ano do primeiro mandato), mas também não fez muito mal. Merecia, pensava o engenheiro, uma maioria absoluta que lhe permitisse realmente “fazer” algumas coisas. O povo, ingrato ou prudente, não lha deu. E Guterres, desiludido, virou a sua atenção e o seu brio para a Europa, um desafio suficiente para um homem cujo desígnio político era agora.

Obrigado pelo fim da presidência da União Europeia e pelo estado em que a sua ausência e a notória falência do modelo dos ministros-coordenadores deixara o Governo, Guterres foi obrigado a voltar a aterrar em São Bento.

De lá para cá, por junto, o Governo fez a reforma fiscal e pouco mais. Em compensação, uma contabilidade superficial dos estragos averba a remodelação de Fernando Gomes e Manuel Maria Carrilho (e as cenas subsequentes, com traidores, Roma e artigos de opinião duros e cínicos), a saída forçada de Armando Vara e Luís Patrão, o abandono de Jorge Coelho...

Não houve um fôlego nem um projecto digno desse nome. A política tem girado à volta dos autogolos que cada um dos ministros semanalmente se encarrega de assestar na baliza do próprio Governo. Os estragos do que os vários ministros dizem diariamente e daquilo que o Governo não faz são irreparáveis.

A remodelação é, assim, inevitável. Excepto se António Guterres estiver a preparar-se para deixar chumbar o Orçamento para o próximo ano, ou seja, se a sua verdadeira aposta no futuro forem eleições antecipadas. É isso que vai estar na cabeça dos congressistas socialistas. Eles sabem que uma remodelação não é suficiente para um novo ciclo. E que os novos ciclos não se anunciam, fazem-se.

O risco é as pessoas, cansadas de palavras, começarem a ter saudades de Cavaco Silva. Esse será, inequivocamente, o sinal de um novo ciclo — um ciclo que não será de António Guterres.

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