Governo protege candidata PS em Felgueiras

30-10-2001
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Governo Protege Candidata PS em Felgueiras

Por JOSÉ AUGUSTO MOREIRA

Segunda-feira, 10 de Setembro de 2001 Secretário de Estado da Administração Local protela decisão sobre proposta da IGAT de perda de mandato da Presidente da Câmara de Felgueiras. Atitude do governante impede também que a matéria chegue ao conhecimento da Inspecção-Geral de Finanças Concluído há quase um ano, o inquérito da Inspecção-Geral da Administração do Território (IGAT) à Câmara Municipal de Felgueiras, que propõe a perda de mandato da presidente, continua sem ter aplicação prática. O Secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, a quem compete aprovar o relatório final e dar execução às propostas dos inspectores, resolveu devolver o processo à IGAT - que funciona sob sua tutela -, para novamente "aferir de forma clara" os factos constantes das conclusões do inquérito. Uma medida muito pouco comum e com evidente leitura política, numa altura em que se aproxima o período de campanha eleitoral para as autárquicas e a presidente da câmara, Fátima Felgueiras, é de novo candidata pelo Partido Socialista. Contactado pelo PÚBLICO, o secretário de Estado, José Augusto Carvalho, rejeita não só a ideia de que a devolução do processo aos inspectores seja um mero expediente dilatório ou uma medida de protecção à candidata socialista por parte do Governo. "Havia falta de demonstração de algumas permissas", e que "a autarca não ganha alguma coisa com a dilação", já que "se tiver que ser punida sê-lo-á". Quanto ao facto de se tratar de uma autarca socialista, José Augusto Carvalho refere que se trata de pura coincidência, explicando que "o processso é até idêntico ao da Câmara de Sernancelhe, que tem outra cor partidária". Coincidência ou não, o certo é que foi precisamente no período que mediou entre a proposta da IGAT (12 Março) e o despacho do secretário de Estado a ordenar a devolução do processo a este organismo (22 Julho), que o PS, pela voz de Narciso Miranda, veio reafirmar a confiança na autarca e patrocinar o lançamento da sua recandidatura, com as presenças do próprio Narciso Miranda e de Jorge Coelho que disse então (4 Julho) que a sua presença era "uma prova de confiança numa pessoa que tem tido uma obra notável". A inspecção da IGAT, que decorreu entre Agosto e Setembro do ano passado, seguiu-se à forte pressão política a que foi submetida a presidente da câmara após a publicação de várias notícias que alegadamente a comprometiam com a prática de irregularidades na autarquia e com a angariação ilícita de fundos para o PS. O despacho do secretário de Estado da Administração Local que ordenou a realização do inquérito referia-se mesmo à "verificação dos factos constantes das notícias desenvolvidas nas edições do jornal PÚBLICO de 21, 27, 29 e 30 de Junho de 2000 e no jornal 'O Independente' de 7 de Julho". As conclusões foram apresentadas em 11 de Outubro, e aí se propõe, entre outras medidas, o envio do processo para o "Digno Agente do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo do Porto, para efeitos de eventual interposição da acção de perda de mandato", o que decorre do facto de ter sido apurado que "a presidente da câmara praticou inúmeros actos administrativos" num processo de loteamento em que "é parte interessada por si e pelo seu ex-marido", e que "a sua prática teve subjacente a intenção de obtenção de vantagem patrimonial". Na contestação, Fátima Felgueiras alegou que desconhecia o envolvimento do seu ex-marido no processo de loteamento em causa, que teria praticado apenas actos de mero expediente, e que não haveria um interesse directo, pessoal e legítimo do seu ex-marido no processo de loteamento, argumentos que, no entanto, não convenceram o gabinete de Serviços e Estudos da IGAT, cujo parecer jurídico concluí que "a senhora presidente estava a par da ligação do seu então marido ao licenciamento, e, por conseguinte, sabia ou devia saber que se encontrava legalmente impedida de intervir no respectivo procedimento", pelo que "terá incorrido na perda de mandato". IGF deveria averiguar Além do processo para perda de mandato, a IGAT propõe também ao secretário de Estado da Administração Local que sejam remetidas cópias para o Ministério Público (MP) de Felgueiras e para a Inspecção-Geral de Finanças (IGF), entidades a quem cabe averiguar "alegadas ilegalidades na execução de contratos de aquisição de bens e serviços, com pagamentos de facturas pela Câmara Municipal de Felgueiras a empresas que posteriormente poderão ter devolvido parte do dinheiro a título particular" (ver texto e documentos ao lado), matéria sobre a qual foi recolhida documentação mas que a IGAT não se pronuncia "por se encontrar sob investigação da Polícia Judiciária (PJ)". Esta é precisamente a questão mais controversa da gestão da autarca, e que tem ocupado o grosso das investigações da PJ, já que os relatos que então foram feitos apontavam para a existência de um "saco azul" no PS de Felgueiras, em grande parte alimentado com contributos de empresas que para aí canalizariam verbas que poderiam corresponder a montantes pouco antes saídos dos cofres camarários. As denúncias apontavam para movimentos superiores a cem mil contos em apenas dois anos (1997/99), e a documentação recolhida pela IGAT leva mesmo a que no relatório se sugira o seguinte: "atendendo à natureza da matéria em questão ter uma vertente financeira e, consequentemente, se integrar no âmbito da gestão patrimonial e financeira das autarquias locais e, ainda, por se mostrar indispensável o controlo indirecto das entidades do sector privado adjudicatárias dos contratos de aquisição de bens e serviços, entendemos ser a IGF o organismo vocacionado para proceder às eventuais averiguações nesta área, salvaguardando-se, porém, as respectivas competências, face ao facto de tal matéria já se encontrar sob investigação da PJ". Uma sugestão que acaba por não ter também, até agora, qualquer efeito prático face à postura do secretário de Estado, que além de protelar a apreciação pelos tribunais da proposta de perda de mandato da autarca, tem também o efeito de impedir que a matéria chegue ao conhecimento da IGF e do MP em Felgueiras. Estas são precisamente as propostas do inspector-geral da IGAT, que assim despachou em 12 de Março, mas sobre as quais José Augusto Carvalho não se quis ainda pronunciar, remetendo antes o assunto para a sua adjunta jurídica que acabou por propor que o processo regressasse à IGAT, para "aferir de forma clara" os factos que suportam as suas conclusões. "Faça-se como proposto", assim despachou o secretário de Estado em 22 de Julho, numa altura em que Jorge Coelho e Narciso Miranda tinham estado já em Felgueiras na cerimónia de apresentação da candidata. O secretário de Estado diz que uma posição final sobre o assunto só deverá ser tomada depois de concluída a inspecção regular da IGAT à Câmara de Felgueiras "que está actualmente em curso, e que deverá reunir as provas complementares que foram solicitadas" sobre as conclusões do anterior inquérito. Quanto às leituras políticas que possam ser feitas sobre a coincidência entre os seus despachos e o lançamento da recandidatura da autarca, "espero que a minha atitude seja avaliada quando for conhecido o teor do despacho", cuja "fundamentação e objectividade não devem deixar qualquer espécie de dúvidas". OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Governo protege candidata PS em Felgueiras

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Dinheiros pagos pela câmara acabavam no "saco azul" socialista

Câmara não se reúne há mais de cinco meses

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Uma medida muito pouco comum e com evidente leitura política, numa altura em que se aproxima o período de campanha eleitoral para as autárquicas e a presidente da câmara, Fátima Felgueiras, é de novo candidata pelo Partido Socialista. Contactado pelo PÚBLICO, o secretário de Estado, José Augusto Carvalho, rejeita não só a ideia de que a devolução do processo aos inspectores seja um mero expediente dilatório ou uma medida de protecção à candidata socialista por parte do Governo. "Havia falta de demonstração de algumas permissas", e que "a autarca não ganha alguma coisa com a dilação", já que "se tiver que ser punida sê-lo-á". Quanto ao facto de se tratar de uma autarca socialista, José Augusto Carvalho refere que se trata de pura coincidência, explicando que "o processso é até idêntico ao da Câmara de Sernancelhe, que tem outra cor partidária". Coincidência ou não, o certo é que foi precisamente no período que mediou entre a proposta da IGAT (12 Março) e o despacho do secretário de Estado a ordenar a devolução do processo a este organismo (22 Julho), que o PS, pela voz de Narciso Miranda, veio reafirmar a confiança na autarca e patrocinar o lançamento da sua recandidatura, com as presenças do próprio Narciso Miranda e de Jorge Coelho que disse então (4 Julho) que a sua presença era "uma prova de confiança numa pessoa que tem tido uma obra notável". A inspecção da IGAT, que decorreu entre Agosto e Setembro do ano passado, seguiu-se à forte pressão política a que foi submetida a presidente da câmara após a publicação de várias notícias que alegadamente a comprometiam com a prática de irregularidades na autarquia e com a angariação ilícita de fundos para o PS. O despacho do secretário de Estado da Administração Local que ordenou a realização do inquérito referia-se mesmo à "verificação dos factos constantes das notícias desenvolvidas nas edições do jornal PÚBLICO de 21, 27, 29 e 30 de Junho de 2000 e no jornal 'O Independente' de 7 de Julho". As conclusões foram apresentadas em 11 de Outubro, e aí se propõe, entre outras medidas, o envio do processo para o "Digno Agente do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo do Porto, para efeitos de eventual interposição da acção de perda de mandato", o que decorre do facto de ter sido apurado que "a presidente da câmara praticou inúmeros actos administrativos" num processo de loteamento em que "é parte interessada por si e pelo seu ex-marido", e que "a sua prática teve subjacente a intenção de obtenção de vantagem patrimonial". Na contestação, Fátima Felgueiras alegou que desconhecia o envolvimento do seu ex-marido no processo de loteamento em causa, que teria praticado apenas actos de mero expediente, e que não haveria um interesse directo, pessoal e legítimo do seu ex-marido no processo de loteamento, argumentos que, no entanto, não convenceram o gabinete de Serviços e Estudos da IGAT, cujo parecer jurídico concluí que "a senhora presidente estava a par da ligação do seu então marido ao licenciamento, e, por conseguinte, sabia ou devia saber que se encontrava legalmente impedida de intervir no respectivo procedimento", pelo que "terá incorrido na perda de mandato". IGF deveria averiguar Além do processo para perda de mandato, a IGAT propõe também ao secretário de Estado da Administração Local que sejam remetidas cópias para o Ministério Público (MP) de Felgueiras e para a Inspecção-Geral de Finanças (IGF), entidades a quem cabe averiguar "alegadas ilegalidades na execução de contratos de aquisição de bens e serviços, com pagamentos de facturas pela Câmara Municipal de Felgueiras a empresas que posteriormente poderão ter devolvido parte do dinheiro a título particular" (ver texto e documentos ao lado), matéria sobre a qual foi recolhida documentação mas que a IGAT não se pronuncia "por se encontrar sob investigação da Polícia Judiciária (PJ)". Esta é precisamente a questão mais controversa da gestão da autarca, e que tem ocupado o grosso das investigações da PJ, já que os relatos que então foram feitos apontavam para a existência de um "saco azul" no PS de Felgueiras, em grande parte alimentado com contributos de empresas que para aí canalizariam verbas que poderiam corresponder a montantes pouco antes saídos dos cofres camarários. As denúncias apontavam para movimentos superiores a cem mil contos em apenas dois anos (1997/99), e a documentação recolhida pela IGAT leva mesmo a que no relatório se sugira o seguinte: "atendendo à natureza da matéria em questão ter uma vertente financeira e, consequentemente, se integrar no âmbito da gestão patrimonial e financeira das autarquias locais e, ainda, por se mostrar indispensável o controlo indirecto das entidades do sector privado adjudicatárias dos contratos de aquisição de bens e serviços, entendemos ser a IGF o organismo vocacionado para proceder às eventuais averiguações nesta área, salvaguardando-se, porém, as respectivas competências, face ao facto de tal matéria já se encontrar sob investigação da PJ". Uma sugestão que acaba por não ter também, até agora, qualquer efeito prático face à postura do secretário de Estado, que além de protelar a apreciação pelos tribunais da proposta de perda de mandato da autarca, tem também o efeito de impedir que a matéria chegue ao conhecimento da IGF e do MP em Felgueiras. Estas são precisamente as propostas do inspector-geral da IGAT, que assim despachou em 12 de Março, mas sobre as quais José Augusto Carvalho não se quis ainda pronunciar, remetendo antes o assunto para a sua adjunta jurídica que acabou por propor que o processo regressasse à IGAT, para "aferir de forma clara" os factos que suportam as suas conclusões. "Faça-se como proposto", assim despachou o secretário de Estado em 22 de Julho, numa altura em que Jorge Coelho e Narciso Miranda tinham estado já em Felgueiras na cerimónia de apresentação da candidata. O secretário de Estado diz que uma posição final sobre o assunto só deverá ser tomada depois de concluída a inspecção regular da IGAT à Câmara de Felgueiras "que está actualmente em curso, e que deverá reunir as provas complementares que foram solicitadas" sobre as conclusões do anterior inquérito. Quanto às leituras políticas que possam ser feitas sobre a coincidência entre os seus despachos e o lançamento da recandidatura da autarca, "espero que a minha atitude seja avaliada quando for conhecido o teor do despacho", cuja "fundamentação e objectividade não devem deixar qualquer espécie de dúvidas". OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Governo protege candidata PS em Felgueiras

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