Uma morgue sem cadáveres

11-05-2001
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Uma Morgue Sem Cadáveres

Por INÊS NADAIS

Terça-feira, 6 de Março de 2001

Familiares preferiram ficar em casa a deslocar-se ao Pavilhão Gimnodesportivo de Castelo de Paiva

Não houve muito que fazer no Pavilhão Gimnodesportivo de Castelo de Paiva, que ontem se converteu em morgue improvisada e centro de apoio aos familiares das vítimas do desabamento da ponte. O insucesso das operações de busca, que só conseguiram resgatar o corpo de uma das muitas vítimas, acabou por tornar inútil o imenso espaço destinado a acolher os cadáveres. Só hoje, se as circunstâncias meteorológicas favorecerem os trabalhos de resgate, o ambiente deverá ficar mais pesado, com a intensificação dos reconhecimentos e das autópsias.

As esteiras ficaram vazias, e a equipa pluridisciplinar encarregue de amparar as muitas famílias que perderam alguém manteve-se de mãos a abanar. Só a ala destinada ao trabalho dos peritos do Instituto de Medicina Legal do Porto registou alguma azáfama, uma vez que Natália José de Castro, a única vítima do acidente cujo corpo foi já encontrado, foi autopsiada logo após o seu reconhecimento pelos familiares. Que foram, de resto, os únicos a deslocar-se ao pavilhão: a maioria das pessoas optou por permanecer em casa, e ninguém fez questão de percorrer mais de uma dezena de quilómetros para beneficiar do apoio prestado pela bateria de psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais que se concentrou no local e no Centro de Saúde.

De resto, em Oliveira do Ardo, lugar onde residia a maioria das vítimas da tragédia, lamentava-se que o apoio psicológico estivesse concentrado na sede do concelho e não houvesse técnicos no terreno, a acompanhar as famílias mais afectadas pelo acidente. Uma opção que os técnicos contactados pelo PÚBLICO no Centro de Saúde consideraram, apesar de tudo, mais razoável. "Em termos de saúde mental, ir ter com as pessoas não é a melhor forma de intervir", observou Marques Gomes, psicólogo do Hospital de Magalhães Lemos. "Nesta fase, as pessoas precisam sobretudo do amparo das pessoas mais chegadas. É normal que estejam tristes e amarguradas - as pessoas que não conseguirem ultrapassar esta fase ou que tiverem manifestações patológicas de sofrimento serão naturalmente encaminhadas para aqui pelos técnicos que estão no pavilhão. Só quando chegarem os cadáveres é que o nosso trabalho vai começar a sério", completou Soledade Coutinho Varela, psiquiatra do mesmo hospital.

Embora o pavilhão esteja preparado para acolher missas de corpo presente e para funcionar como capela mortuária, como garantiu ao PÚBLICO o vereador Lino Pereira, a família de Natália José de Castro preferiu transferir de imediato o cadáver, que deverá ser enterrado já amanhã. A Câmara Municipal de Castelo de Paiva assumirá todas as despesas do funeral.

Uma Morgue Sem Cadáveres

Por INÊS NADAIS

Terça-feira, 6 de Março de 2001

Familiares preferiram ficar em casa a deslocar-se ao Pavilhão Gimnodesportivo de Castelo de Paiva

Não houve muito que fazer no Pavilhão Gimnodesportivo de Castelo de Paiva, que ontem se converteu em morgue improvisada e centro de apoio aos familiares das vítimas do desabamento da ponte. O insucesso das operações de busca, que só conseguiram resgatar o corpo de uma das muitas vítimas, acabou por tornar inútil o imenso espaço destinado a acolher os cadáveres. Só hoje, se as circunstâncias meteorológicas favorecerem os trabalhos de resgate, o ambiente deverá ficar mais pesado, com a intensificação dos reconhecimentos e das autópsias.

As esteiras ficaram vazias, e a equipa pluridisciplinar encarregue de amparar as muitas famílias que perderam alguém manteve-se de mãos a abanar. Só a ala destinada ao trabalho dos peritos do Instituto de Medicina Legal do Porto registou alguma azáfama, uma vez que Natália José de Castro, a única vítima do acidente cujo corpo foi já encontrado, foi autopsiada logo após o seu reconhecimento pelos familiares. Que foram, de resto, os únicos a deslocar-se ao pavilhão: a maioria das pessoas optou por permanecer em casa, e ninguém fez questão de percorrer mais de uma dezena de quilómetros para beneficiar do apoio prestado pela bateria de psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais que se concentrou no local e no Centro de Saúde.

De resto, em Oliveira do Ardo, lugar onde residia a maioria das vítimas da tragédia, lamentava-se que o apoio psicológico estivesse concentrado na sede do concelho e não houvesse técnicos no terreno, a acompanhar as famílias mais afectadas pelo acidente. Uma opção que os técnicos contactados pelo PÚBLICO no Centro de Saúde consideraram, apesar de tudo, mais razoável. "Em termos de saúde mental, ir ter com as pessoas não é a melhor forma de intervir", observou Marques Gomes, psicólogo do Hospital de Magalhães Lemos. "Nesta fase, as pessoas precisam sobretudo do amparo das pessoas mais chegadas. É normal que estejam tristes e amarguradas - as pessoas que não conseguirem ultrapassar esta fase ou que tiverem manifestações patológicas de sofrimento serão naturalmente encaminhadas para aqui pelos técnicos que estão no pavilhão. Só quando chegarem os cadáveres é que o nosso trabalho vai começar a sério", completou Soledade Coutinho Varela, psiquiatra do mesmo hospital.

Embora o pavilhão esteja preparado para acolher missas de corpo presente e para funcionar como capela mortuária, como garantiu ao PÚBLICO o vereador Lino Pereira, a família de Natália José de Castro preferiu transferir de imediato o cadáver, que deverá ser enterrado já amanhã. A Câmara Municipal de Castelo de Paiva assumirá todas as despesas do funeral.

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