"A minha grande derrota é o museu"

14-07-2001
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"A Minha Grande Derrota É o Museu"

Segunda-feira, 4 de Junho de 2001

O incêndio de 1978 na Rua da Escola Politécnica mudou para sempre o destino de duas instituições que partilhavam o mesmo espaço. A Faculdade de Ciências de Lisboa mudou-se dali, primeiro para a Av. 24 de Julho, depois expandiu-se no Campo Grande. Os museus que ali ficaram, antes ricos em colecções de minerais, de fósseis e com uma biblioteca raríssima - e que depois se reuniram no Museu Nacional de História Natural -, nunca mais recuperaram da catástrofe. Por isso, este museu, que Galopim de Carvalho dirige desde a sua criação, em 1992, é virtual, nas suas palavras. Vinte e três anos depois do fogo, o geólogo considera o museu a sua grande derrota.

PÚBLICA -A estratégia de usar os dinossauros na defesa do património geológico surgiu porque o museu continua vazio desde o grande incêndio de 1978?

ANTÓNIO GALOPIM DE CARVALHO - Sim. O facto de estar num museu sem capacidade para ter as colecções expostas deu-me grande disponibilidade para me interessar pelo património natural e ambiental.

R. - Estou aqui desde 1984, era presidente da direcção do Museu Geológico e Mineralógico. Estes estabelecimentos eram museus da faculdade, que serviam de apoio às aulas. Eram o braço de apoio científico aos docentes: o mineralógico para o curso de mineralogia e geologia, o zoológico e botânico de apoio a biologia. Com a alteração do estatuto universitário, passámos a ser Museu Nacional de História Natural (MNHN) da Universidade de Lisboa, em 1992, e aí fui escolhido para director pelo reitor. Mas sou um director virtual, porque este museu não existe.

R. - O que existe é o Museu Zoológico e Antropológico (Museu Bocage), de que é director o professor Carlos Almaça, o Museu Laboratório Jardim Botânico, de que é director o professor Fernando Catarino, e o Museu Mineralógico e Geológico, em que o director sou eu. Quando fui empossado na direcção do MNHN, elaborámos um estatuto provisório para cinco anos, ao fim dos quais estávamos vinculados a apresentar à universidade um estatuto definitivo. Apresentámo-lo em 1997, mas ainda não foi homologado.

R. - Passaríamos a ter uma gestão única, um orçamento único. O quadro de pessoal do Museu Bocage é separado do Jardim Botânico e do meu. Há dois ou três meses que temos uma bibliotecária, mas durante muitos anos a Zoologia tinha três bibliotecários, a Botânica dois e nós nenhum. E a contabilidade: em vez de termos três secretarias, tínhamos só uma. Continua a funcionar separadamente, é por isso que digo que sou director virtual.

R. - Nove mil contos para o Museu Geológico, outro tanto para o Zoológico e mais quatro mil para o Jardim Botânico.

R. - Fui um cidadão que, quer do ponto de vista pessoal, quer do ponto de vista profissional, fui somando vitórias. A minha grande e única derrota é o Museu de História Natural. Evidentemente que estou frustradissímo. O meu reitor e a equipa reitoral - de quem sou extremamente amigo e sei que não podem fazer muito mais - entendem que sou injusto. Mas esta crítica é à Universidade.

R. - Para que fique bem claro, entendo que o museu deve ter como tutela científica a Universidade de Lisboa. A universidade tem capacidade, no âmbito para assegurar um museu nacional? Se não tem, tem obrigação ou de alijar essa responsabilidade ou de o transformar num museu de faculdade, como era. Se não quer perder este património, tem de obter do Governo um financiamento diferente. Penso que isto tinha solução se houvesse uma comissão comum da Ciência e da Tecnologia e do Ensino Superior.

R. - Quando disse um milhão e 500 mil contos, pensei em 500 mil contos para a mineralogia e depois multipliquei por três para fazer a tal estrutura conjunta. Para a mineralogia, podíamos escavar duas ou três caves e, como tenho visto noutros museus, fazer aqui a reprodução de galerias de minas - por exemplo, a mina da Panasqueira, ou a de Neves Corvo. Isso era um projecto maravilhoso. Também podíamos ter aqui uma grande sala para um laboratório de paleontologia de grandes vertebrados. Somos quem mais fala em dinossauros e não temos uma sala. Mas isso custa muito dinheiro.

R. - Teria equipamento para preparar os ossos, os restaurar e daí transitarem para as exposições. Se uma sala de paleontologia for para pequenos animais, não é preciso mais que um quadradinho para espreitar à lupa, desenhar, fotografar. Mas para trabalhar fémures de um apatossauro precisamos de guindastes, correntes e outro material.

"A Minha Grande Derrota É o Museu"

Segunda-feira, 4 de Junho de 2001

O incêndio de 1978 na Rua da Escola Politécnica mudou para sempre o destino de duas instituições que partilhavam o mesmo espaço. A Faculdade de Ciências de Lisboa mudou-se dali, primeiro para a Av. 24 de Julho, depois expandiu-se no Campo Grande. Os museus que ali ficaram, antes ricos em colecções de minerais, de fósseis e com uma biblioteca raríssima - e que depois se reuniram no Museu Nacional de História Natural -, nunca mais recuperaram da catástrofe. Por isso, este museu, que Galopim de Carvalho dirige desde a sua criação, em 1992, é virtual, nas suas palavras. Vinte e três anos depois do fogo, o geólogo considera o museu a sua grande derrota.

PÚBLICA -A estratégia de usar os dinossauros na defesa do património geológico surgiu porque o museu continua vazio desde o grande incêndio de 1978?

ANTÓNIO GALOPIM DE CARVALHO - Sim. O facto de estar num museu sem capacidade para ter as colecções expostas deu-me grande disponibilidade para me interessar pelo património natural e ambiental.

R. - Estou aqui desde 1984, era presidente da direcção do Museu Geológico e Mineralógico. Estes estabelecimentos eram museus da faculdade, que serviam de apoio às aulas. Eram o braço de apoio científico aos docentes: o mineralógico para o curso de mineralogia e geologia, o zoológico e botânico de apoio a biologia. Com a alteração do estatuto universitário, passámos a ser Museu Nacional de História Natural (MNHN) da Universidade de Lisboa, em 1992, e aí fui escolhido para director pelo reitor. Mas sou um director virtual, porque este museu não existe.

R. - O que existe é o Museu Zoológico e Antropológico (Museu Bocage), de que é director o professor Carlos Almaça, o Museu Laboratório Jardim Botânico, de que é director o professor Fernando Catarino, e o Museu Mineralógico e Geológico, em que o director sou eu. Quando fui empossado na direcção do MNHN, elaborámos um estatuto provisório para cinco anos, ao fim dos quais estávamos vinculados a apresentar à universidade um estatuto definitivo. Apresentámo-lo em 1997, mas ainda não foi homologado.

R. - Passaríamos a ter uma gestão única, um orçamento único. O quadro de pessoal do Museu Bocage é separado do Jardim Botânico e do meu. Há dois ou três meses que temos uma bibliotecária, mas durante muitos anos a Zoologia tinha três bibliotecários, a Botânica dois e nós nenhum. E a contabilidade: em vez de termos três secretarias, tínhamos só uma. Continua a funcionar separadamente, é por isso que digo que sou director virtual.

R. - Nove mil contos para o Museu Geológico, outro tanto para o Zoológico e mais quatro mil para o Jardim Botânico.

R. - Fui um cidadão que, quer do ponto de vista pessoal, quer do ponto de vista profissional, fui somando vitórias. A minha grande e única derrota é o Museu de História Natural. Evidentemente que estou frustradissímo. O meu reitor e a equipa reitoral - de quem sou extremamente amigo e sei que não podem fazer muito mais - entendem que sou injusto. Mas esta crítica é à Universidade.

R. - Para que fique bem claro, entendo que o museu deve ter como tutela científica a Universidade de Lisboa. A universidade tem capacidade, no âmbito para assegurar um museu nacional? Se não tem, tem obrigação ou de alijar essa responsabilidade ou de o transformar num museu de faculdade, como era. Se não quer perder este património, tem de obter do Governo um financiamento diferente. Penso que isto tinha solução se houvesse uma comissão comum da Ciência e da Tecnologia e do Ensino Superior.

R. - Quando disse um milhão e 500 mil contos, pensei em 500 mil contos para a mineralogia e depois multipliquei por três para fazer a tal estrutura conjunta. Para a mineralogia, podíamos escavar duas ou três caves e, como tenho visto noutros museus, fazer aqui a reprodução de galerias de minas - por exemplo, a mina da Panasqueira, ou a de Neves Corvo. Isso era um projecto maravilhoso. Também podíamos ter aqui uma grande sala para um laboratório de paleontologia de grandes vertebrados. Somos quem mais fala em dinossauros e não temos uma sala. Mas isso custa muito dinheiro.

R. - Teria equipamento para preparar os ossos, os restaurar e daí transitarem para as exposições. Se uma sala de paleontologia for para pequenos animais, não é preciso mais que um quadradinho para espreitar à lupa, desenhar, fotografar. Mas para trabalhar fémures de um apatossauro precisamos de guindastes, correntes e outro material.

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