"Lei: alteração! Julgamento: humilhação!"

03-02-2002
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"Lei: Alteração! Julgamento: Humilhação!"

Por MARIA JOÃO GUIMARÃES

Sábado, 19 de Janeiro de 2002 Manifestação de solidariedade com as mulheres julgadas na Maia ontem, em Lisboa, serviu para reivindicar uma nova lei para o aborto. Dizem que "o crime está na lei" A lei é "hipócrita" e deve ser mudada. Era este o denominador comum a todas as declarações das pessoas que se manifestaram ontem, em frente ao Tribunal da Boa Hora, em Lisboa, numa acção de solidariedade com as mulheres julgadas na Maia pelo crime de prática de aborto. O único membro do Governo presente foi Mariano Gago. "A situação actual é insustentável. É um factor de grande atraso do país. Na maioria dos países da Europa, esta questão já está resolvida", disse o ministro da Ciência e Tecnologia à Lusa. Mariano Gago defende a despenalização do aborto "em condições sérias". A deputada socialista Helena Roseta considera a situação actual vergonhosa: "Ou há uma lei e ninguém liga nenhuma e é uma vergonha, ou há uma lei e quando é aplicada é uma vergonha." E como deputada que luta há anos por esta causa, o que sente hoje? "A maior vergonha por este país. Se tivesse havido mais mulheres nos governos, talvez não fosse assim. Em mais de 1000 membros de governos em Portugal apenas 50 foram mulheres." Lembra Helena Neves, deputada do Bloco de Esquerda, que, "nos anos 70, dizia-se que se os homens abortassem, o aborto não seria crime: seria sacramento." A actual lei é classificada por Helena Neves como "fraudulenta" e "hipócrita": "A lei é semelhante à de Espanha. E em Portugal temos a segunda taxa de maternidade adolescente e temos um número muitíssimo menor de abortos do que em Espanha. E outra coisa de que não se fala é dos problemas com que ficam as mulheres após um aborto clandestino." Ana Vicente solidariza-se discretamente "Aborto: o crime está na lei!" ou "Lei: alteração! Julgamento: humilhação!" eram algumas das palavras de ordem. A deputada do PS Ana Sara Brito irritava-se pela "humilhação" que representa a lei. "Para quem anda nesta luta há 40 anos, é uma revolta todos os dias. Não comento o julgamento. É a lei que tem de ser alterada. Tanta integração europeia, mas as mulheres têm de atravessar a fronteira para abortar", diz Ana Sara Brito. Outra batalhadora pela despenalização do aborto, Odete Santos, deputada do PCP, comentou a decisão do tribunal: "O tribunal optou por uma solução que é em parte de alívio baseado em regras processuais, o que acho muito bem, e acho que as mulheres fizeram muito bem em não dizer que fizeram um aborto". "E se fizeram, nãopraticaram nenhum crime", sustentou Odete Santos, salientando que exprimia esta opinião "mesmo enquanto jurista". Justificação: "A Constituição fala da dignidade do ser humano. A mulher é um ser humano. Tem direito à dignidade e à liberdade de consciência." Já quase no fim da manifestação, vê-se Ana Vicente, do movimento "Nós somos Igreja", que esclareceu logo que não estava ali a representar este movimento: "Estou por mim. Eu sou contra o aborto como todos os que estão aqui, sou pela vida e sou contra mandar mulheres para a prisão por terem feito um aborto". O que faz com que defenda "eventualmente uma despenalização até às 12 semanas". Em frente à Boa Hora viam-se mulheres - também homens -, raparigas mais novas ao lado de "históricas" da luta pela despenalização da IVG (interrupção voluntária da gravidez), assim como representantes de várias associações, gays e lésbicas por exemplo. À hora da manifestação já era conhecida a sentença. Helena Neves fez, a propósito, um único comentário: "A absolvição não chega. É reconhecer que houve um crime. E o crime está na lei". OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Forte polémica e uma condenação

"Não posso fugir à lei", disse a única mulher condenada na Maia

EDITORIAL Passos que podem ser dados

"Onde estão os homens que engravidaram estas mulheres?"

"Lei: alteração! Julgamento: humilhação!"

Inquérito

Reacções institucionais

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Por MARIA JOÃO GUIMARÃES

Sábado, 19 de Janeiro de 2002 Manifestação de solidariedade com as mulheres julgadas na Maia ontem, em Lisboa, serviu para reivindicar uma nova lei para o aborto. Dizem que "o crime está na lei" A lei é "hipócrita" e deve ser mudada. Era este o denominador comum a todas as declarações das pessoas que se manifestaram ontem, em frente ao Tribunal da Boa Hora, em Lisboa, numa acção de solidariedade com as mulheres julgadas na Maia pelo crime de prática de aborto. O único membro do Governo presente foi Mariano Gago. "A situação actual é insustentável. É um factor de grande atraso do país. Na maioria dos países da Europa, esta questão já está resolvida", disse o ministro da Ciência e Tecnologia à Lusa. Mariano Gago defende a despenalização do aborto "em condições sérias". A deputada socialista Helena Roseta considera a situação actual vergonhosa: "Ou há uma lei e ninguém liga nenhuma e é uma vergonha, ou há uma lei e quando é aplicada é uma vergonha." E como deputada que luta há anos por esta causa, o que sente hoje? "A maior vergonha por este país. Se tivesse havido mais mulheres nos governos, talvez não fosse assim. Em mais de 1000 membros de governos em Portugal apenas 50 foram mulheres." Lembra Helena Neves, deputada do Bloco de Esquerda, que, "nos anos 70, dizia-se que se os homens abortassem, o aborto não seria crime: seria sacramento." A actual lei é classificada por Helena Neves como "fraudulenta" e "hipócrita": "A lei é semelhante à de Espanha. E em Portugal temos a segunda taxa de maternidade adolescente e temos um número muitíssimo menor de abortos do que em Espanha. E outra coisa de que não se fala é dos problemas com que ficam as mulheres após um aborto clandestino." Ana Vicente solidariza-se discretamente "Aborto: o crime está na lei!" ou "Lei: alteração! Julgamento: humilhação!" eram algumas das palavras de ordem. A deputada do PS Ana Sara Brito irritava-se pela "humilhação" que representa a lei. "Para quem anda nesta luta há 40 anos, é uma revolta todos os dias. Não comento o julgamento. É a lei que tem de ser alterada. Tanta integração europeia, mas as mulheres têm de atravessar a fronteira para abortar", diz Ana Sara Brito. Outra batalhadora pela despenalização do aborto, Odete Santos, deputada do PCP, comentou a decisão do tribunal: "O tribunal optou por uma solução que é em parte de alívio baseado em regras processuais, o que acho muito bem, e acho que as mulheres fizeram muito bem em não dizer que fizeram um aborto". "E se fizeram, nãopraticaram nenhum crime", sustentou Odete Santos, salientando que exprimia esta opinião "mesmo enquanto jurista". Justificação: "A Constituição fala da dignidade do ser humano. A mulher é um ser humano. Tem direito à dignidade e à liberdade de consciência." Já quase no fim da manifestação, vê-se Ana Vicente, do movimento "Nós somos Igreja", que esclareceu logo que não estava ali a representar este movimento: "Estou por mim. Eu sou contra o aborto como todos os que estão aqui, sou pela vida e sou contra mandar mulheres para a prisão por terem feito um aborto". O que faz com que defenda "eventualmente uma despenalização até às 12 semanas". Em frente à Boa Hora viam-se mulheres - também homens -, raparigas mais novas ao lado de "históricas" da luta pela despenalização da IVG (interrupção voluntária da gravidez), assim como representantes de várias associações, gays e lésbicas por exemplo. À hora da manifestação já era conhecida a sentença. Helena Neves fez, a propósito, um único comentário: "A absolvição não chega. É reconhecer que houve um crime. E o crime está na lei". OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Forte polémica e uma condenação

"Não posso fugir à lei", disse a única mulher condenada na Maia

EDITORIAL Passos que podem ser dados

"Onde estão os homens que engravidaram estas mulheres?"

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Inquérito

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