"Porque é que não estão aqui deputados masculinos?"

22-05-2001
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"Porque É Que Não Estão Aqui Deputados Masculinos?"

Por NUNO SÁ LOURENÇO

Quinta-feira, 29 de Março de 2001

Debate sobre paridade

As deputadas da esquerda parlamentar explicaram perante uma plateia 99 por cento feminina o que as separava na questão. O resultado foi uma chuva de críticas sobre o Parlamento

"Abismada", "irritada" e "perturbada". A reacção das cerca de 30 mulheres que assistiram, ontem, ao debate "Paridade: porquê e para quê?" foi algo violenta assim que se aperceberam, pelas intervenções das representantes, das divisões existentes nos grupos parlamentares de esquerda.

A intenção das Organizações Não Governamentais dos Direitos das Mulheres era ouvir, sobre o tema, todos os partidos com assento na Assembleia da República. No entanto, conseguiram levar à Casa Amarela apenas as deputadas Maria de Belém, do PS, e Luísa Mesquita, do PCP, para além da representante do Bloco de Esquerda (BE), Helena Neves. De fora ficaram o PSD, o PP e o Partido "Os Verdes".

As parlamentares que foram, falaram, mas o debate só aqueceu depois. Isto porque quem ouvia acabou por se insurgir contra o previsível chumbo da proposta do Governo e do projecto de lei do BE. A bloquista Helena Neves acusou a proposta socialista de estar "ferida por uma contradição enorme: a questão dos círculo uninominais". Estes, segundo ela, não eram "compatíveis" com a paridade e por isso o BE é contra a proposta do Governo. "A paridade visa o alargamento da representatividade, enquanto os círculos uninominais propõem o seu estreitamento", explicou Helena Neves.

Quanto a Luísa Mesquita, depois de ter dito que as propostas nada traziam de novo, mostrou-se contra a paridade lembrando exemplos que tinham corrido mal. Segundo a deputada comunista as imposições de representação tinham de partir "de dentro dos partidos e não do texto constitucional ou da legislação". "Encontramos maior representação onde não há nenhuma imposição legislativa, como na Finlândia", justificou Luísa Mesquita.

Só que, para Carolina Tito Morais, os países nórdicos pouco têm a ver com Portugal: "Na Finlândia se calhar basta uma recomendação, mas aqui a alteração legislativa é fundamental", disparou "abismada", antes de lembrar à parlamentar comunista que na Finlândia as mulheres votam já há quase um ano. "Será que vamos ter de esperar mais um século pela representação?", perguntou.

"Raptamos os deputados e votamos nós"

As intervenções das restantes mulheres que assistiam ao debate foram tão críticas como a primeira. Ana Amâncio, depois de se ter confessado "perturbada" pelo que ouvira, argumentou que a legislação poderia servir "para dar consciência às pessoas e instrumentos à luta". Ana Coucelo acrescentou que a paridade podia ser "um instrumento pedagógico" antes de sublinhar que a legislação tinha de fazer o que "os partidos não foram capazes de fazer por si só". "Temos de queimar etapas, senão ainda ficamos mais para trás", aconselhou.

Ana Sara Brito, que se identificou como apoiante do PS, apelou ao BE para que votasse a favor da proposta do Governo. "Não deixem que se perca outra oportunidade, demonstrem que são capazes de ser a nova esquerda, não dêem esse prazer à direita mais retrógrada", pediu.

Já mais para o fim do debate, à medida que se tornava cada vez mais perceptível a probabilidade das duas propostas virem a ser chumbadas no Parlamento, alguém se lembrou de deixar no ar uma "resolução para o problema": "Raptamos os deputados e votamos nós." Uma proposta que teve quase tanta aceitação entre as que assistiam ao debate quanto a crítica aos homens: "Porque é que não estão aqui deputados masculinos?"

"Porque É Que Não Estão Aqui Deputados Masculinos?"

Por NUNO SÁ LOURENÇO

Quinta-feira, 29 de Março de 2001

Debate sobre paridade

As deputadas da esquerda parlamentar explicaram perante uma plateia 99 por cento feminina o que as separava na questão. O resultado foi uma chuva de críticas sobre o Parlamento

"Abismada", "irritada" e "perturbada". A reacção das cerca de 30 mulheres que assistiram, ontem, ao debate "Paridade: porquê e para quê?" foi algo violenta assim que se aperceberam, pelas intervenções das representantes, das divisões existentes nos grupos parlamentares de esquerda.

A intenção das Organizações Não Governamentais dos Direitos das Mulheres era ouvir, sobre o tema, todos os partidos com assento na Assembleia da República. No entanto, conseguiram levar à Casa Amarela apenas as deputadas Maria de Belém, do PS, e Luísa Mesquita, do PCP, para além da representante do Bloco de Esquerda (BE), Helena Neves. De fora ficaram o PSD, o PP e o Partido "Os Verdes".

As parlamentares que foram, falaram, mas o debate só aqueceu depois. Isto porque quem ouvia acabou por se insurgir contra o previsível chumbo da proposta do Governo e do projecto de lei do BE. A bloquista Helena Neves acusou a proposta socialista de estar "ferida por uma contradição enorme: a questão dos círculo uninominais". Estes, segundo ela, não eram "compatíveis" com a paridade e por isso o BE é contra a proposta do Governo. "A paridade visa o alargamento da representatividade, enquanto os círculos uninominais propõem o seu estreitamento", explicou Helena Neves.

Quanto a Luísa Mesquita, depois de ter dito que as propostas nada traziam de novo, mostrou-se contra a paridade lembrando exemplos que tinham corrido mal. Segundo a deputada comunista as imposições de representação tinham de partir "de dentro dos partidos e não do texto constitucional ou da legislação". "Encontramos maior representação onde não há nenhuma imposição legislativa, como na Finlândia", justificou Luísa Mesquita.

Só que, para Carolina Tito Morais, os países nórdicos pouco têm a ver com Portugal: "Na Finlândia se calhar basta uma recomendação, mas aqui a alteração legislativa é fundamental", disparou "abismada", antes de lembrar à parlamentar comunista que na Finlândia as mulheres votam já há quase um ano. "Será que vamos ter de esperar mais um século pela representação?", perguntou.

"Raptamos os deputados e votamos nós"

As intervenções das restantes mulheres que assistiam ao debate foram tão críticas como a primeira. Ana Amâncio, depois de se ter confessado "perturbada" pelo que ouvira, argumentou que a legislação poderia servir "para dar consciência às pessoas e instrumentos à luta". Ana Coucelo acrescentou que a paridade podia ser "um instrumento pedagógico" antes de sublinhar que a legislação tinha de fazer o que "os partidos não foram capazes de fazer por si só". "Temos de queimar etapas, senão ainda ficamos mais para trás", aconselhou.

Ana Sara Brito, que se identificou como apoiante do PS, apelou ao BE para que votasse a favor da proposta do Governo. "Não deixem que se perca outra oportunidade, demonstrem que são capazes de ser a nova esquerda, não dêem esse prazer à direita mais retrógrada", pediu.

Já mais para o fim do debate, à medida que se tornava cada vez mais perceptível a probabilidade das duas propostas virem a ser chumbadas no Parlamento, alguém se lembrou de deixar no ar uma "resolução para o problema": "Raptamos os deputados e votamos nós." Uma proposta que teve quase tanta aceitação entre as que assistiam ao debate quanto a crítica aos homens: "Porque é que não estão aqui deputados masculinos?"

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