Bombas sobre Bagdad para salvar a Bolsa

03-03-2001
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Bancada Económica

Bombas Sobre Bagdad para Salvar a Bolsa

Por FRANCISCO LOUÇÃ

Segunda-feira, 26 de Fevereiro de 2001

(Francl@ar.parlamento.pt)

Na sexta feira, dia 16 de Fevereiro, a Bolsa de Nova Iorque viveu outro dia turbulento. O índice Nasdaq mergulhou mais cinco por cento, confirmando que temos vivido um período de euforia e sobrevalorização das empresas da "nova economia" e que a factura já chegou. O líder mundial em fibras ópticas, Nortel, foi um dos maiores perdedores do dia. A Dell Computers, a Hewlett Packard e outros foram atrás. Os analistas tinham vindo a avisar desta crise iminente: ainda há-de ser pior, e a recessão americana, se se confirmar, começará com o colapso destas empresas "high-tech" nas bolsas.

Mas nesse mesmo dia, umas horas antes de fechar a bolsa, cerca de 80 aviões de combate, americanos e britânicos, fizeram um raide devastador sobre Bagdad: o Pentágono chamou-lhe uma "missão de rotina de autodefesa". No entanto, esta diplomacia de mísseis teve um efeito imediato no relançamento da confiança num mercado muito especial, muito lucrativo e muito importante: o das empresas petrolíferas e, sobretudo, o das indústrias de armamento.

As cotações da Exxon, Chevron, Texaco, dispararam. O mesmo aconteceu com as da Harken Energy Corporation, uma empresa-chave na exploração do petróleo colombiano, e de que George Bush foi director executivo. A Harken está directamente envolvida na Operação Colômbia, um ambicioso plano de acção militar americana na zona amazónica. O mercado respirou de alívio.

No entanto, a grande alteração deu-se nas indústrias de defesa. O bombardeamento de Bagdad relançou a confiança no futuro dessas empresas. A Boeing, a General Dynamics, a Lockheed Martin, a Northrop-Grumman e a Raytheon, os cinco grandes beneficiários dos contratos militares, ressurgiram na bolsa. Para bom entendedor, meio ponto basta: o colapso do "high-tech" civil é compensado pela nova oportunidade no sector militar.

Uns poucos dias antes, a Lockeed Martin tinha anunciado despedimentos maciços e cortes orçamentais no seu departamento de satélites, declarando que ia deslocar o seu esforço de actividades civis para a indústria do armamento, onde a empresa é dos maiores beneficiários de contratos do Estado americano. Tem toda a razão para estar confiante. Bush declarou ao "New York Times" (12 de Fevereiro): "Planeio romper com a ortodoxia do Pentágono e criar uma nova arquitectura para a defesa da América e dos nossos aliados, investindo em novas tecnologias e sistemas de armamentos".

Confirmou-se entretanto a encomenda do novo caça F-22 Raptor, que a Lockeed vai desenvolver numa operação de cerca de 60 mil milhões de dólares. Dois dias depois, Bush ratificou um novo investimento imediato de 2,6 mil milhões de dólares para reforçar a investigação e desenvolvimento de novas armas. Mais dois dias, e Bagdad era bombardeada.

Bush estabeleceu assim um santuário para as bolsas, através do recurso ao "keynesianismo militar" que já tinha feito a fama e o proveito do seu antecessor republicano, Ronald Reagan. O risco é grande, mas a parada também é muito alta. Por tudo isto, teremos em 2001 bolsas mais instáveis, turbulência mais acentuada, sobredeterminação política, predomínio das empresas militares, ameaças de recessão internacional: aqui está a nova ordem mundial em todo o seu esplendor.

Bancada Económica

Bombas Sobre Bagdad para Salvar a Bolsa

Por FRANCISCO LOUÇÃ

Segunda-feira, 26 de Fevereiro de 2001

(Francl@ar.parlamento.pt)

Na sexta feira, dia 16 de Fevereiro, a Bolsa de Nova Iorque viveu outro dia turbulento. O índice Nasdaq mergulhou mais cinco por cento, confirmando que temos vivido um período de euforia e sobrevalorização das empresas da "nova economia" e que a factura já chegou. O líder mundial em fibras ópticas, Nortel, foi um dos maiores perdedores do dia. A Dell Computers, a Hewlett Packard e outros foram atrás. Os analistas tinham vindo a avisar desta crise iminente: ainda há-de ser pior, e a recessão americana, se se confirmar, começará com o colapso destas empresas "high-tech" nas bolsas.

Mas nesse mesmo dia, umas horas antes de fechar a bolsa, cerca de 80 aviões de combate, americanos e britânicos, fizeram um raide devastador sobre Bagdad: o Pentágono chamou-lhe uma "missão de rotina de autodefesa". No entanto, esta diplomacia de mísseis teve um efeito imediato no relançamento da confiança num mercado muito especial, muito lucrativo e muito importante: o das empresas petrolíferas e, sobretudo, o das indústrias de armamento.

As cotações da Exxon, Chevron, Texaco, dispararam. O mesmo aconteceu com as da Harken Energy Corporation, uma empresa-chave na exploração do petróleo colombiano, e de que George Bush foi director executivo. A Harken está directamente envolvida na Operação Colômbia, um ambicioso plano de acção militar americana na zona amazónica. O mercado respirou de alívio.

No entanto, a grande alteração deu-se nas indústrias de defesa. O bombardeamento de Bagdad relançou a confiança no futuro dessas empresas. A Boeing, a General Dynamics, a Lockheed Martin, a Northrop-Grumman e a Raytheon, os cinco grandes beneficiários dos contratos militares, ressurgiram na bolsa. Para bom entendedor, meio ponto basta: o colapso do "high-tech" civil é compensado pela nova oportunidade no sector militar.

Uns poucos dias antes, a Lockeed Martin tinha anunciado despedimentos maciços e cortes orçamentais no seu departamento de satélites, declarando que ia deslocar o seu esforço de actividades civis para a indústria do armamento, onde a empresa é dos maiores beneficiários de contratos do Estado americano. Tem toda a razão para estar confiante. Bush declarou ao "New York Times" (12 de Fevereiro): "Planeio romper com a ortodoxia do Pentágono e criar uma nova arquitectura para a defesa da América e dos nossos aliados, investindo em novas tecnologias e sistemas de armamentos".

Confirmou-se entretanto a encomenda do novo caça F-22 Raptor, que a Lockeed vai desenvolver numa operação de cerca de 60 mil milhões de dólares. Dois dias depois, Bush ratificou um novo investimento imediato de 2,6 mil milhões de dólares para reforçar a investigação e desenvolvimento de novas armas. Mais dois dias, e Bagdad era bombardeada.

Bush estabeleceu assim um santuário para as bolsas, através do recurso ao "keynesianismo militar" que já tinha feito a fama e o proveito do seu antecessor republicano, Ronald Reagan. O risco é grande, mas a parada também é muito alta. Por tudo isto, teremos em 2001 bolsas mais instáveis, turbulência mais acentuada, sobredeterminação política, predomínio das empresas militares, ameaças de recessão internacional: aqui está a nova ordem mundial em todo o seu esplendor.

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