EXPRESSO: Opinião

28-02-2002
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Um debate esquizofrénico

«Ainda há pouco, certas pessoas que agora se opõem ao TPI, revelando-se preocupadíssimas com a ressocialização dos presos, punham em causa a justiça portuguesa e, nomeadamente, a brandura das penas, defendendo que estas deveriam ser imediatamente agravadas.A verdade é que, se nos podemos orgulhar de não ter pena de morte nem prisão perpétua, o mesmo já não podemos dizer do excesso de garantias que, reconhecidamente, temos.»

A ADESÃO de Portugal ao Tribunal Penal Internacional tem gerado uma polémica absurda. De início, algumas intervenções, como a do próprio bastonário da Ordem dos Advogados, Pires de Lima, foram de molde a confundir a opinião pública, levando parte dela a acreditar que estávamos perante a reintrodução da pena de prisão perpétua no nosso país. Desfeita essa confusão, o debate tem mesmo assim continuado, apesar de intervenções clarificadoras tanto por parte do Governo e do PS como por parte do PSD, nomeadamente pelas vozes do ministro da Justiça, António Costa, e do próprio líder da oposição, Durão Barroso.

Como é óbvio, a possibilidade de o TPI aplicar a pena de prisão perpétua, ainda assim obrigatoriamente revista ao cabo de 25 anos, não passa disso mesmo - de uma possibilidade que se refere a crimes particularmente graves. Por outro lado, o TPI apenas julgará criminosos se os próprios Estados não o fizerem. Ou seja, desde que Portugal julgue qualquer acusado dos crimes previstos pelo TPI, será a lei portuguesa a ser aplicada. Por último, como não podia deixar de ser, as penas previstas pelo TPI resultam de acordos e negociações entre mais de uma centena de países, representando o consenso possível. Seria estulto pensar-se que um país como Portugal estaria em condições de impor a sua ordem jurídica aos outros. Enfim, como frisava Fernando Seara nas páginas do «DN», quem, a propósito do TPI, põe em causa a prisão perpétua devia ter a coragem de pôr em causa o próprio TPI.

ACRESCE que, como em muitas discussões em Portugal, esta parece claramente esquizofrénica. Na verdade, ela ocorre na sequência de outras com sinal contrário. Ainda há pouco, certas pessoas que agora se opõem ao TPI, revelando-se preocupadíssimas com a ressocialização dos presos, punham em causa a justiça portuguesa e, nomeadamente, a brandura das penas, defendendo que estas deveriam ser imediatamente agravadas.

A verdade é que, se nos podemos orgulhar de não ter pena de morte nem prisão perpétua, o mesmo já não podemos dizer do excesso de garantias que, reconhecidamente, temos. Esse excesso de garantias, aliado a uma preocupação tão excessiva na reinserção dos criminosos que parece deixar para segundo plano a ideia do castigo, é bem mais discutível do que o falso problema da adesão ao TPI.

A criação deste tribunal internacional, destinado a julgar crimes de genocídio e contra a humanidade, representa um marco civilizacional de inegável importância neste mundo global. Torna-se, assim, incompreensível, para não dizer bastante suspeita, a razão de tanta oposição ao TPI.

hmonteiro@mail.expresso.pt

Um debate esquizofrénico

«Ainda há pouco, certas pessoas que agora se opõem ao TPI, revelando-se preocupadíssimas com a ressocialização dos presos, punham em causa a justiça portuguesa e, nomeadamente, a brandura das penas, defendendo que estas deveriam ser imediatamente agravadas.A verdade é que, se nos podemos orgulhar de não ter pena de morte nem prisão perpétua, o mesmo já não podemos dizer do excesso de garantias que, reconhecidamente, temos.»

A ADESÃO de Portugal ao Tribunal Penal Internacional tem gerado uma polémica absurda. De início, algumas intervenções, como a do próprio bastonário da Ordem dos Advogados, Pires de Lima, foram de molde a confundir a opinião pública, levando parte dela a acreditar que estávamos perante a reintrodução da pena de prisão perpétua no nosso país. Desfeita essa confusão, o debate tem mesmo assim continuado, apesar de intervenções clarificadoras tanto por parte do Governo e do PS como por parte do PSD, nomeadamente pelas vozes do ministro da Justiça, António Costa, e do próprio líder da oposição, Durão Barroso.

Como é óbvio, a possibilidade de o TPI aplicar a pena de prisão perpétua, ainda assim obrigatoriamente revista ao cabo de 25 anos, não passa disso mesmo - de uma possibilidade que se refere a crimes particularmente graves. Por outro lado, o TPI apenas julgará criminosos se os próprios Estados não o fizerem. Ou seja, desde que Portugal julgue qualquer acusado dos crimes previstos pelo TPI, será a lei portuguesa a ser aplicada. Por último, como não podia deixar de ser, as penas previstas pelo TPI resultam de acordos e negociações entre mais de uma centena de países, representando o consenso possível. Seria estulto pensar-se que um país como Portugal estaria em condições de impor a sua ordem jurídica aos outros. Enfim, como frisava Fernando Seara nas páginas do «DN», quem, a propósito do TPI, põe em causa a prisão perpétua devia ter a coragem de pôr em causa o próprio TPI.

ACRESCE que, como em muitas discussões em Portugal, esta parece claramente esquizofrénica. Na verdade, ela ocorre na sequência de outras com sinal contrário. Ainda há pouco, certas pessoas que agora se opõem ao TPI, revelando-se preocupadíssimas com a ressocialização dos presos, punham em causa a justiça portuguesa e, nomeadamente, a brandura das penas, defendendo que estas deveriam ser imediatamente agravadas.

A verdade é que, se nos podemos orgulhar de não ter pena de morte nem prisão perpétua, o mesmo já não podemos dizer do excesso de garantias que, reconhecidamente, temos. Esse excesso de garantias, aliado a uma preocupação tão excessiva na reinserção dos criminosos que parece deixar para segundo plano a ideia do castigo, é bem mais discutível do que o falso problema da adesão ao TPI.

A criação deste tribunal internacional, destinado a julgar crimes de genocídio e contra a humanidade, representa um marco civilizacional de inegável importância neste mundo global. Torna-se, assim, incompreensível, para não dizer bastante suspeita, a razão de tanta oposição ao TPI.

hmonteiro@mail.expresso.pt

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