EXPRESSO: Opinião

22-03-2002
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9/2/2002

OPINIÃO

Ferro no seu labirinto

«A verdade é que Ferro tem, na crise actual, tanta culpa como Guterres. A diferença é apenas de grau. E se num órgão colegial como o governo a responsabilidade é colectiva, ele não pode pôr-se na pele de um mero espectador, como se tivesse assistido à governação à distância, empoleirado numa árvore, como fez Zaqueu para ver passar Jesus.» COMO diria há uns anos atrás o dr. Mário Soares, «há uma malaise no ar». Donde vem esta sensação de mal-estar, de incómodo, que se avoluma dia a dia, de que a crise espreita, como um animal acocorado à espera da presa? Os sinais são diários: o alerta da Comissão Europeia sobre o grave desequilíbrio das contas públicas; a revelação dramática do falhanço do sistema educativo; o alarme das declarações do chefe do Estado Maior General das Forças Armadas, general Alvarenga Sousa Santos, esta semana no «Público»: «As Forças Armadas portuguesas estão nitidamente quase em ruptura. Não existe, de facto, dinheiro para as sustentar minimamente. Estamos abaixo dos níveis mínimos». Os exemplos poderiam multiplicar-se. Poucas serão as áreas da governação onde se não tenha esta desagradável impressão de derrocada iminente. Aqui chegámos! Aqui nos fez chegar um governo que, apesar de ter a mais mansa oposição de que há memória, se auto-imolou na tranquila idiotice do diálogo, do debate e das comissões de estudo. «É preferível o caminho à pousada», avisava Cervantes. Molengão, o governo preferiu a pousada ao caminho. Os avisos não faltaram: vieram das organizações internacionais; do Banco de Portugal; dos melhores economistas portugueses; dos sindicatos; das associações patronais; da imprensa especializada, portuguesa e estrangeira; dos descontentes dos Estados Gerais; de cada ministro remodelado. Mas foi assim o PS: sempre avisado, nunca prevenido! Por isso hoje se sente que a solução de recurso que foi Ferro Rodrigues desemboca sempre num labirinto. E essa sensação de labirinto e de perplexidade adensa-se a cada novo passo que o líder do PS dá para se demarcar da experiência governativa de que foi um dos principais obreiros: no governo contente, no partido insatisfeito; no governo comprometido, no partido distante; no governo aplaudindo, no partido chorando; no governo tudo, no partido nada. E se cada promessa é uma dívida, não é hoje possível deixarmos de esbarrar, em cada compromisso que ele assume para o futuro, nas promessas por cumprir e nas oportunidades perdidas. Equilibrar hoje as contas públicas? Porque não ontem? Reformar agora a educação? Porque não antes? Acelerar no futuro a convergência com a Europa? Porquê tão tarde? Acabar amanhã com a sisa? Porque não nos últimos seis anos? Neste quadro estranho em que Guterres olha do governo para o seu antigo ministro, e em que Ferro olha do partido para o seu antigo líder, temos a nítida sensação de um desdobramento de personalidade. É como se o PS quisesse ser dois, à semelhança do verso de Pessoa: «Sentiu-se brincando / e disse, eu sou dois! Há um a brincar / E há outro a saber, / Um vê-me a brincar / E o outro vê-me a ver...» Mas não há dois! A verdade é que Ferro tem, na crise actual, tanta culpa como Guterres. A diferença é apenas de grau. E se num órgão colegial como o governo a responsabilidade é colectiva, ele não pode pôr-se na pele de um mero espectador, como se tivesse assistido à governação à distância, empoleirado numa árvore, como fez Zaqueu para ver passar Jesus. Na longa letargia em que o governo dormiu durante seis anos, ele foi responsável. Foi Borges quem escreveu que «dormir é distrair-se do mundo». Pois é: o PS distraiu-se de Portugal, e os cuidados que hoje promete vêm tarde, porque «quem tem cuidados, não dorme».

COMENTÁRIOS AO ARTIGO

5 comentários 1 a 5

11 de Fevereiro de 2002 às 17:17

BWV 1004 ( bwv1004@vizzavi.pt )

Se Borges se aplciar ao caso, ainda vamos ver o Ferro Rodrigues a prometer encontrar-se a si próprio num outro Engenheiro. Só não sabemos quando...

10 de Fevereiro de 2002 às 21:30

ramos18 ( jrcontreiras@netcabo.pt )

Duarte Lima você começou por dizer umas coisas acertadas,mas depois acabou na mais tonta e sectária propaganda política. Evidentemente revelou-se que foi um dos "boys" do PSD. E não só...?

Ferro revelou-se um excelente ministro e fez muita coisa boa,mostrou obra. Durão esteve 10 anos no Governo de Cavaco e o que fez? Nada!

A memória dos portugueses não vai ser curta porque já estamos escaldados de "boys" e o PSD nisso foi um lídimo percursor do PS.

Quanto à corrupção no Governo de Cavaco também não vale a pena falar pois foram milhões. Os fundos da CE enviados para Portugal nos 10 anos de cavaquismo davam para colocar o nosso país à frente dos mais modernos da CE,como Durão agora quer fazer. Só que a "mama dos fundos" vai acabar e teremos que aproveitar com imaginação,competência,trabalho e determinação os nossos recursos.

E aí qualquel governante que vier a ser eleito terá que ser um homem honesto,competente e determinado. E não um "panhanhas".

10 de Fevereiro de 2002 às 17:38

bigorna

Mais um aluno da Turma dos sempre Esclarecidos.

Até ás eleições não vou ler mais este sonso.

9 de Fevereiro de 2002 às 22:20

Diogo Sotto Mai ( op3706@mail.telepac.pt )

Este homem não sabe que, ao longo de dez anos, Cavaco/Psd teve défices de 6,05% do pib em média anual, quando os défices de Guterres foram de 2,2% ao ano e em 2001 de 2,2%.

Em 1993, a economia desceu 1,1% do pib e o défice foi de quase 8%, o que significa que Cavaco foi pior que qualquer dos anos de Guterres.

O PSD tem dito que o défice real de 2001 não é de 2,2% como foi reconhecido pela união Europeia, mas de 5%. O Sr. Lima não sabe que, mesmo com esses 5%, o défice é ainda mais baixo que a média dos 6,05% de saldo negativo registado ao longo dos dez anos cavaquistas.

No último quinquénio cavaquista, a economia cresceu a 1,55 de média ao ano. No quinquénio subsequente de Guterres, o crescimento foi de 3,8% ao ano em média. Por isso, os cartazes do PSD não mostram estes valores.

A realidade dos números expressos em 33 indicadores económicos revela que Cavaco/PSD não governou bem, mas sim muito pior que Guterres/PS.

9 de Fevereiro de 2002 às 02:07

Ana Camoes ( lusaana@hotmail.com )

Olha quem fala.

O chulo mais mediatico dos mais de 10 anos de aberracoes Cavaquistas.

Se este careca tivesse vergonha na cara nunca mais aparecia em publico.

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9/2/2002

OPINIÃO

Ferro no seu labirinto

«A verdade é que Ferro tem, na crise actual, tanta culpa como Guterres. A diferença é apenas de grau. E se num órgão colegial como o governo a responsabilidade é colectiva, ele não pode pôr-se na pele de um mero espectador, como se tivesse assistido à governação à distância, empoleirado numa árvore, como fez Zaqueu para ver passar Jesus.» COMO diria há uns anos atrás o dr. Mário Soares, «há uma malaise no ar». Donde vem esta sensação de mal-estar, de incómodo, que se avoluma dia a dia, de que a crise espreita, como um animal acocorado à espera da presa? Os sinais são diários: o alerta da Comissão Europeia sobre o grave desequilíbrio das contas públicas; a revelação dramática do falhanço do sistema educativo; o alarme das declarações do chefe do Estado Maior General das Forças Armadas, general Alvarenga Sousa Santos, esta semana no «Público»: «As Forças Armadas portuguesas estão nitidamente quase em ruptura. Não existe, de facto, dinheiro para as sustentar minimamente. Estamos abaixo dos níveis mínimos». Os exemplos poderiam multiplicar-se. Poucas serão as áreas da governação onde se não tenha esta desagradável impressão de derrocada iminente. Aqui chegámos! Aqui nos fez chegar um governo que, apesar de ter a mais mansa oposição de que há memória, se auto-imolou na tranquila idiotice do diálogo, do debate e das comissões de estudo. «É preferível o caminho à pousada», avisava Cervantes. Molengão, o governo preferiu a pousada ao caminho. Os avisos não faltaram: vieram das organizações internacionais; do Banco de Portugal; dos melhores economistas portugueses; dos sindicatos; das associações patronais; da imprensa especializada, portuguesa e estrangeira; dos descontentes dos Estados Gerais; de cada ministro remodelado. Mas foi assim o PS: sempre avisado, nunca prevenido! Por isso hoje se sente que a solução de recurso que foi Ferro Rodrigues desemboca sempre num labirinto. E essa sensação de labirinto e de perplexidade adensa-se a cada novo passo que o líder do PS dá para se demarcar da experiência governativa de que foi um dos principais obreiros: no governo contente, no partido insatisfeito; no governo comprometido, no partido distante; no governo aplaudindo, no partido chorando; no governo tudo, no partido nada. E se cada promessa é uma dívida, não é hoje possível deixarmos de esbarrar, em cada compromisso que ele assume para o futuro, nas promessas por cumprir e nas oportunidades perdidas. Equilibrar hoje as contas públicas? Porque não ontem? Reformar agora a educação? Porque não antes? Acelerar no futuro a convergência com a Europa? Porquê tão tarde? Acabar amanhã com a sisa? Porque não nos últimos seis anos? Neste quadro estranho em que Guterres olha do governo para o seu antigo ministro, e em que Ferro olha do partido para o seu antigo líder, temos a nítida sensação de um desdobramento de personalidade. É como se o PS quisesse ser dois, à semelhança do verso de Pessoa: «Sentiu-se brincando / e disse, eu sou dois! Há um a brincar / E há outro a saber, / Um vê-me a brincar / E o outro vê-me a ver...» Mas não há dois! A verdade é que Ferro tem, na crise actual, tanta culpa como Guterres. A diferença é apenas de grau. E se num órgão colegial como o governo a responsabilidade é colectiva, ele não pode pôr-se na pele de um mero espectador, como se tivesse assistido à governação à distância, empoleirado numa árvore, como fez Zaqueu para ver passar Jesus. Na longa letargia em que o governo dormiu durante seis anos, ele foi responsável. Foi Borges quem escreveu que «dormir é distrair-se do mundo». Pois é: o PS distraiu-se de Portugal, e os cuidados que hoje promete vêm tarde, porque «quem tem cuidados, não dorme».

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11 de Fevereiro de 2002 às 17:17

BWV 1004 ( bwv1004@vizzavi.pt )

Se Borges se aplciar ao caso, ainda vamos ver o Ferro Rodrigues a prometer encontrar-se a si próprio num outro Engenheiro. Só não sabemos quando...

10 de Fevereiro de 2002 às 21:30

ramos18 ( jrcontreiras@netcabo.pt )

Duarte Lima você começou por dizer umas coisas acertadas,mas depois acabou na mais tonta e sectária propaganda política. Evidentemente revelou-se que foi um dos "boys" do PSD. E não só...?

Ferro revelou-se um excelente ministro e fez muita coisa boa,mostrou obra. Durão esteve 10 anos no Governo de Cavaco e o que fez? Nada!

A memória dos portugueses não vai ser curta porque já estamos escaldados de "boys" e o PSD nisso foi um lídimo percursor do PS.

Quanto à corrupção no Governo de Cavaco também não vale a pena falar pois foram milhões. Os fundos da CE enviados para Portugal nos 10 anos de cavaquismo davam para colocar o nosso país à frente dos mais modernos da CE,como Durão agora quer fazer. Só que a "mama dos fundos" vai acabar e teremos que aproveitar com imaginação,competência,trabalho e determinação os nossos recursos.

E aí qualquel governante que vier a ser eleito terá que ser um homem honesto,competente e determinado. E não um "panhanhas".

10 de Fevereiro de 2002 às 17:38

bigorna

Mais um aluno da Turma dos sempre Esclarecidos.

Até ás eleições não vou ler mais este sonso.

9 de Fevereiro de 2002 às 22:20

Diogo Sotto Mai ( op3706@mail.telepac.pt )

Este homem não sabe que, ao longo de dez anos, Cavaco/Psd teve défices de 6,05% do pib em média anual, quando os défices de Guterres foram de 2,2% ao ano e em 2001 de 2,2%.

Em 1993, a economia desceu 1,1% do pib e o défice foi de quase 8%, o que significa que Cavaco foi pior que qualquer dos anos de Guterres.

O PSD tem dito que o défice real de 2001 não é de 2,2% como foi reconhecido pela união Europeia, mas de 5%. O Sr. Lima não sabe que, mesmo com esses 5%, o défice é ainda mais baixo que a média dos 6,05% de saldo negativo registado ao longo dos dez anos cavaquistas.

No último quinquénio cavaquista, a economia cresceu a 1,55 de média ao ano. No quinquénio subsequente de Guterres, o crescimento foi de 3,8% ao ano em média. Por isso, os cartazes do PSD não mostram estes valores.

A realidade dos números expressos em 33 indicadores económicos revela que Cavaco/PSD não governou bem, mas sim muito pior que Guterres/PS.

9 de Fevereiro de 2002 às 02:07

Ana Camoes ( lusaana@hotmail.com )

Olha quem fala.

O chulo mais mediatico dos mais de 10 anos de aberracoes Cavaquistas.

Se este careca tivesse vergonha na cara nunca mais aparecia em publico.

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