"É tão bom ter maioria absoluta"

29-11-2000
marcar artigo

"É Tão Bom Ter Maioria Absoluta"

Por EUNICE LOURENÇO

Quarta-feira, 29 de Novembro de 2000 É como se tivesse maioria absoluta que o Governo chega hoje à provação final global do Orçamento do Estado para 2001. Dominado pelo caso Campelo, que a oposição teme que venha a repetir-se nos próximos anos, este é um orçamento em que a oposição não conseguiu fazer valer as suas propostas, acusando os socialistas de serem responsáveis por um debate autista. Quanto à reforma fiscal que, desde o início, lhe esteve ligada, deve ser aprovada ainda antes do final do ano. A reforma fiscal debatida na Assembleia da República no passado dia 11 de Outubro deverá entrar em vigor no início do próximo ano, estando a sua aprovação final global prevista para o dia 21 de Dezembro. Cai, assim, por terra o argumento que o Governo sempre utilizou para ter incluído as novas tabelas de IRS na proposta de lei do Orçamento do Estado (OE) e não nas propostas de reforma fiscal: era necessário fazê-lo para que os portugueses pudessem ter um desagravamento fiscal já no próximo ano. Esta estratégia de condicionar o desagravamento dos impostos à aprovação do OE foi vista pela oposição como uma chantagem do Governo, que, tendo o PCP disposto a fazer a reforma fiscal, queria condicionar também o voto da oposição no Orçamento. Afinal, agora é o próprio Governo a anunciar que a reforma fiscal sobre os rendimentos também estará pronta a tempo de entrar em vigor no início do ano, tal como o OE. Mas o PCP não deixa de reclamar os louros de assim ser. O líder da bancada comunista, Octávio Teixeira, disse ao PÚBLICO que a celeridade na aprovação da reforma tributária sobre os rendimentos (IRS e IRC) se deve à pressão do seu partido: "Estamos empenhados e disponíveis para chegar a um consenso que permita que esteja em vigor a 1 de Janeiro. Se o Governo e o PS não forem tão fechados como foram no Orçamento, achamos que é possível." Se Octávio Teixeira acusa o Governo de ser fechado na discussão orçamental, que hoje termina, com a discussão e votação final global, Luís Fazenda (do Bloco de Esquerda) acusa o executivo de autismo, Paulo Portas (líder do CDS-PP) diz que não houve quaisquer concertações com outras bancadas e o presidente do PSD, Durão Barroso, afirma que houve uma "crispação" que levou a que todas as propostas da oposição fossem chumbadas. No fundo, toda a oposição dá conta de que o Governo se comportou neste debate orçamental como se tivesse maioria absoluta, o que de facto teve nestes 15 dias, mercê do acordo com Daniel Campelo, autarca de Ponte de Lima e deputado do CDS-PP, entretanto "excluído" da respectiva bancada, que se absteve na votação na generalidade. A sua abstenção tem-se repetido na votação na especialidade, artigo a artigo, sempre que é necessária para que a proposta do Governo passe, e irá repetir-se hoje na votação final global. Esta situação "nova e anómala", como lhe chama Durão Barroso, acabou por marcar todo o debate e ofuscar o Orçamento propriamente dito. Segundo Durão Barroso, era necessário que os portugueses percebessem que o país vai "andar para trás" e que "os portugueses vão ficar mais pobres" em relação à média da União Europeia. O presidente do PSD, no entanto, reconhece que os portugueses podem ainda não sentir os efeitos da crise no próximo ano, pois, afirma, o Governo pode "recorrer à habitual desorçamentação" para os aumentos da Função Pública. "Não é verdadeiramente o Orçamento que conta, são as opções de política económica do Governo. O Orçamento tem um valor muito relativo para o Governo", diz ainda Durão Barroso, que acusa o executivo de não ter um plano a médio prazo para retomar a convergência com a União Europeia. Por isso, conclui, todos os sacrifícios que peça aos portugueses são "sacrifício inúteis". Também Paulo Portas está preocupado com a "desaceleração do crescimento" e o decréscimo da produtividade, mas considera que a maioria das pessoas ainda não se deu conta de que a situação económica é má. "Daqui a um ano o país está económica e socialmente pior", prevê Portas, que explica: "O país precisava de um choque fiscal para pôr a economia a crescer, e em matéria de políticas sociais de combate à pobreza ficou-se aquém do necessário, sobretudo num ano em que os preços dos bens essenciais cresceram muito." Já Octávio Teixeira e Luís Fazenda consideram que os portugueses vão sentir no dia-a-dia o facto de não existir um aumento real dos salários. "É verdade que há um desagravamento fiscal, mas não chega para compensar as políticas negativas", diz o deputado do BE, que acusa o Governo de "auto-satisfação orçamental" e de autismo, por não ter aceite qualquer proposta para melhorar a justiça social. A todas estas críticas, o presidente do grupo parlamentar socialista, Francisco Assis, responde com o elogio ao OE de 2001, que considera "mais qualificado que o anterior", denotando uma "vontade de modernizar" o país. Assis realça a contenção da despesa pública e o desagravamento fiscal, e acusa a oposição de não ter mostrado divergências de fundo, mas apenas a "indisponibilidade para o diálogo com o Governo". Tal perspectiva é rejeitada, naturalmente, por Octávio Teixeira: "O balanço que faço é que o debate decorreu na melhor das situações para o Governo, que, face à operação que estabeleceu com Daniel Campelo, não teve mais que preocupar-se e teve a vida facilitada para impor o seu orçamento inicial." Ou, como dizia ontem um membro de um gabinete governamental: "É tão bom ter maioria absoluta." OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE "É tão bom ter maioria absoluta"

Caso Campelo pode repetir-se em véspera de autárquicas

Alterações aprovadas ao OE

Governo pode chegar aos quatro por cento

"É Tão Bom Ter Maioria Absoluta"

Por EUNICE LOURENÇO

Quarta-feira, 29 de Novembro de 2000 É como se tivesse maioria absoluta que o Governo chega hoje à provação final global do Orçamento do Estado para 2001. Dominado pelo caso Campelo, que a oposição teme que venha a repetir-se nos próximos anos, este é um orçamento em que a oposição não conseguiu fazer valer as suas propostas, acusando os socialistas de serem responsáveis por um debate autista. Quanto à reforma fiscal que, desde o início, lhe esteve ligada, deve ser aprovada ainda antes do final do ano. A reforma fiscal debatida na Assembleia da República no passado dia 11 de Outubro deverá entrar em vigor no início do próximo ano, estando a sua aprovação final global prevista para o dia 21 de Dezembro. Cai, assim, por terra o argumento que o Governo sempre utilizou para ter incluído as novas tabelas de IRS na proposta de lei do Orçamento do Estado (OE) e não nas propostas de reforma fiscal: era necessário fazê-lo para que os portugueses pudessem ter um desagravamento fiscal já no próximo ano. Esta estratégia de condicionar o desagravamento dos impostos à aprovação do OE foi vista pela oposição como uma chantagem do Governo, que, tendo o PCP disposto a fazer a reforma fiscal, queria condicionar também o voto da oposição no Orçamento. Afinal, agora é o próprio Governo a anunciar que a reforma fiscal sobre os rendimentos também estará pronta a tempo de entrar em vigor no início do ano, tal como o OE. Mas o PCP não deixa de reclamar os louros de assim ser. O líder da bancada comunista, Octávio Teixeira, disse ao PÚBLICO que a celeridade na aprovação da reforma tributária sobre os rendimentos (IRS e IRC) se deve à pressão do seu partido: "Estamos empenhados e disponíveis para chegar a um consenso que permita que esteja em vigor a 1 de Janeiro. Se o Governo e o PS não forem tão fechados como foram no Orçamento, achamos que é possível." Se Octávio Teixeira acusa o Governo de ser fechado na discussão orçamental, que hoje termina, com a discussão e votação final global, Luís Fazenda (do Bloco de Esquerda) acusa o executivo de autismo, Paulo Portas (líder do CDS-PP) diz que não houve quaisquer concertações com outras bancadas e o presidente do PSD, Durão Barroso, afirma que houve uma "crispação" que levou a que todas as propostas da oposição fossem chumbadas. No fundo, toda a oposição dá conta de que o Governo se comportou neste debate orçamental como se tivesse maioria absoluta, o que de facto teve nestes 15 dias, mercê do acordo com Daniel Campelo, autarca de Ponte de Lima e deputado do CDS-PP, entretanto "excluído" da respectiva bancada, que se absteve na votação na generalidade. A sua abstenção tem-se repetido na votação na especialidade, artigo a artigo, sempre que é necessária para que a proposta do Governo passe, e irá repetir-se hoje na votação final global. Esta situação "nova e anómala", como lhe chama Durão Barroso, acabou por marcar todo o debate e ofuscar o Orçamento propriamente dito. Segundo Durão Barroso, era necessário que os portugueses percebessem que o país vai "andar para trás" e que "os portugueses vão ficar mais pobres" em relação à média da União Europeia. O presidente do PSD, no entanto, reconhece que os portugueses podem ainda não sentir os efeitos da crise no próximo ano, pois, afirma, o Governo pode "recorrer à habitual desorçamentação" para os aumentos da Função Pública. "Não é verdadeiramente o Orçamento que conta, são as opções de política económica do Governo. O Orçamento tem um valor muito relativo para o Governo", diz ainda Durão Barroso, que acusa o executivo de não ter um plano a médio prazo para retomar a convergência com a União Europeia. Por isso, conclui, todos os sacrifícios que peça aos portugueses são "sacrifício inúteis". Também Paulo Portas está preocupado com a "desaceleração do crescimento" e o decréscimo da produtividade, mas considera que a maioria das pessoas ainda não se deu conta de que a situação económica é má. "Daqui a um ano o país está económica e socialmente pior", prevê Portas, que explica: "O país precisava de um choque fiscal para pôr a economia a crescer, e em matéria de políticas sociais de combate à pobreza ficou-se aquém do necessário, sobretudo num ano em que os preços dos bens essenciais cresceram muito." Já Octávio Teixeira e Luís Fazenda consideram que os portugueses vão sentir no dia-a-dia o facto de não existir um aumento real dos salários. "É verdade que há um desagravamento fiscal, mas não chega para compensar as políticas negativas", diz o deputado do BE, que acusa o Governo de "auto-satisfação orçamental" e de autismo, por não ter aceite qualquer proposta para melhorar a justiça social. A todas estas críticas, o presidente do grupo parlamentar socialista, Francisco Assis, responde com o elogio ao OE de 2001, que considera "mais qualificado que o anterior", denotando uma "vontade de modernizar" o país. Assis realça a contenção da despesa pública e o desagravamento fiscal, e acusa a oposição de não ter mostrado divergências de fundo, mas apenas a "indisponibilidade para o diálogo com o Governo". Tal perspectiva é rejeitada, naturalmente, por Octávio Teixeira: "O balanço que faço é que o debate decorreu na melhor das situações para o Governo, que, face à operação que estabeleceu com Daniel Campelo, não teve mais que preocupar-se e teve a vida facilitada para impor o seu orçamento inicial." Ou, como dizia ontem um membro de um gabinete governamental: "É tão bom ter maioria absoluta." OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE "É tão bom ter maioria absoluta"

Caso Campelo pode repetir-se em véspera de autárquicas

Alterações aprovadas ao OE

Governo pode chegar aos quatro por cento

marcar artigo