EXPRESSO: Opinião

02-01-2002
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Orçamento: oposição demite-se

Alexandre Melo

«O PSD não só não tem novas soluções nem projectos alternativos como se mostrou incapaz de proceder no Parlamento a qualquer discussão séria e argumentada do Orçamento. A falta de seriedade com que o PSD tratou o assunto ficou comprovada com as faltas dos deputados na votação final e no modo como esta rábula se prolongou através de uma sucessão de declarações contraditórias e da culpabilização final de Duarte Lima: como se já nem a doença de um companheiro de bancada pudesse merecer algum respeito aos deputados do PSD.»

A DISCUSSÃO do Orçamento para 2002 terminou com uma clamorosa demissão a que todo o país assistiu com estupefacção. Ao contrário do que se poderia esperar não foi a demissão do Governo mas sim a demissão da oposição.

Poucas vezes na história recente da democracia portuguesa se terá assistido a uma tão divertida exibição de incompetência. A oposição começou pela repetição, um pouco requentada é certo, da rábula do ano passado contra Daniel Campelo. Por estranho que pareça, alguns deputados continuam a sentir-se incomodados com o facto de um deputado decidir livremente do sentido do seu voto. Campelo limita-se a constatar, com desarmante simplicidade, que o Governo poderia ser melhor mas que, na realidade, neste momento, não existe uma alternativa melhor. É uma constatação do mais elementar bom senso e percebe-se, por isso, a fúria da oposição.

A oposição continua incapaz de gerar uma alternativa de Governo atraente, estável ou já só apenas viável. Pior do que isso, o PSD, o maior partido da oposição, continua a ser incapaz de apresentar qualquer solução alternativa concreta para a resolução de qualquer um dos grandes problemas nacionais. Se o PSD quer conquistar a opinião pública e desafiar o Governo poderia, por exemplo, apresentar um bom Orçamento alternativo, ou um bom projecto alternativo para enfrentar os problemas da saúde, da justiça, da segurança, da educação. Talvez também desse jeito ter um líder. Mas o PSD não só não tem novas soluções nem projectos alternativos como se mostrou incapaz de proceder no Parlamento a qualquer discussão séria e argumentada do Orçamento. A falta de seriedade com que o PSD tratou o assunto ficou comprovada com as faltas dos deputados na votação final e no modo como esta rábula se prolongou através de uma sucessão de declarações contraditórias e da culpabilização final de Duarte Lima: como se já nem a doença de um companheiro de bancada pudesse merecer algum respeito aos deputados do PSD.

A demissão da oposição na discussão do Orçamento vem na sequência de um episódio ainda mais cómico. Não tendo talvez reparado ainda que a humanidade enfrenta hoje o maior desafio com que esteve confrontada desde a II Guerra Mundial, Marcelo Rebelo de Sousa terá sentido a necessidade de criar um dos seus pequenos e famosos factos políticos. Não lhe tendo ocorrido nenhum assunto importante, foi buscar um problema de aritmética burocrática que será talvez fascinante para especialistas de direito constitucional mas não tem qualquer significado político concreto. A manobra de diversão de Marcelo parece ter como únicos objectivos tentar irritar o Presidente da República e contribuir para o desprestígio do Parlamento, dando a entender que os deputados não sabem contar. Daí, talvez, as dificuldades na discussão do Orçamento.

Não consigo deixar de imaginar uma cena em que um ministro português tentasse explicar aos nossos aliados militares que a reestruturação das Forças Armadas em Portugal estava suspensa porque os deputados não chegaram a acordo sobre a forma de contar os seus próprios votos.

Se é assim que Marcelo pretende lançar a candidatura a Belém começa desde já a tornar-se clara qual a sua estatura de estadista.

Entretanto, todo o PSD continua a estremecer cada vez que o fantasma de Cavaco Silva se levanta e faz soar as grilhetas que arrasta em passos lentos no bolorento sótão em que se esconde, à espera de uma nova oportunidade.

E-mail: alexmelo@mail.telepac.pt

Orçamento: oposição demite-se

Alexandre Melo

«O PSD não só não tem novas soluções nem projectos alternativos como se mostrou incapaz de proceder no Parlamento a qualquer discussão séria e argumentada do Orçamento. A falta de seriedade com que o PSD tratou o assunto ficou comprovada com as faltas dos deputados na votação final e no modo como esta rábula se prolongou através de uma sucessão de declarações contraditórias e da culpabilização final de Duarte Lima: como se já nem a doença de um companheiro de bancada pudesse merecer algum respeito aos deputados do PSD.»

A DISCUSSÃO do Orçamento para 2002 terminou com uma clamorosa demissão a que todo o país assistiu com estupefacção. Ao contrário do que se poderia esperar não foi a demissão do Governo mas sim a demissão da oposição.

Poucas vezes na história recente da democracia portuguesa se terá assistido a uma tão divertida exibição de incompetência. A oposição começou pela repetição, um pouco requentada é certo, da rábula do ano passado contra Daniel Campelo. Por estranho que pareça, alguns deputados continuam a sentir-se incomodados com o facto de um deputado decidir livremente do sentido do seu voto. Campelo limita-se a constatar, com desarmante simplicidade, que o Governo poderia ser melhor mas que, na realidade, neste momento, não existe uma alternativa melhor. É uma constatação do mais elementar bom senso e percebe-se, por isso, a fúria da oposição.

A oposição continua incapaz de gerar uma alternativa de Governo atraente, estável ou já só apenas viável. Pior do que isso, o PSD, o maior partido da oposição, continua a ser incapaz de apresentar qualquer solução alternativa concreta para a resolução de qualquer um dos grandes problemas nacionais. Se o PSD quer conquistar a opinião pública e desafiar o Governo poderia, por exemplo, apresentar um bom Orçamento alternativo, ou um bom projecto alternativo para enfrentar os problemas da saúde, da justiça, da segurança, da educação. Talvez também desse jeito ter um líder. Mas o PSD não só não tem novas soluções nem projectos alternativos como se mostrou incapaz de proceder no Parlamento a qualquer discussão séria e argumentada do Orçamento. A falta de seriedade com que o PSD tratou o assunto ficou comprovada com as faltas dos deputados na votação final e no modo como esta rábula se prolongou através de uma sucessão de declarações contraditórias e da culpabilização final de Duarte Lima: como se já nem a doença de um companheiro de bancada pudesse merecer algum respeito aos deputados do PSD.

A demissão da oposição na discussão do Orçamento vem na sequência de um episódio ainda mais cómico. Não tendo talvez reparado ainda que a humanidade enfrenta hoje o maior desafio com que esteve confrontada desde a II Guerra Mundial, Marcelo Rebelo de Sousa terá sentido a necessidade de criar um dos seus pequenos e famosos factos políticos. Não lhe tendo ocorrido nenhum assunto importante, foi buscar um problema de aritmética burocrática que será talvez fascinante para especialistas de direito constitucional mas não tem qualquer significado político concreto. A manobra de diversão de Marcelo parece ter como únicos objectivos tentar irritar o Presidente da República e contribuir para o desprestígio do Parlamento, dando a entender que os deputados não sabem contar. Daí, talvez, as dificuldades na discussão do Orçamento.

Não consigo deixar de imaginar uma cena em que um ministro português tentasse explicar aos nossos aliados militares que a reestruturação das Forças Armadas em Portugal estava suspensa porque os deputados não chegaram a acordo sobre a forma de contar os seus próprios votos.

Se é assim que Marcelo pretende lançar a candidatura a Belém começa desde já a tornar-se clara qual a sua estatura de estadista.

Entretanto, todo o PSD continua a estremecer cada vez que o fantasma de Cavaco Silva se levanta e faz soar as grilhetas que arrasta em passos lentos no bolorento sótão em que se esconde, à espera de uma nova oportunidade.

E-mail: alexmelo@mail.telepac.pt

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