Guterres rompe com o PS histórico

22-07-2001
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Guterres Rompe com o PS Histórico

Por SÃO JOSÉ ALMEIDA

Domingo, 6 de Maio de 2001

Num estilo inédito entre os socialistas, o próprio Guterres cortou com a história do PS. Roseta consumou a ruptura. E Alegre não aceitou integrar a comissão nacional

O XII Congresso do PS que hoje termina representa um momento de viragem inédito. António Guterres usou a autoridade de quem chefia o partido há uma década e o levou ao poder para romper com o PS histórico e assumir preto no branco que não dará mais "cobertura política" ao tradicional estilo socialista dos grandes debates e confrontos político-ideológicos que acabam em grandes abraços e declarações de solidariedade.

Parece, assim, ter chegado o momento de uma nova geração de socialistas - de José Sócrates a António Costa, de Carlos Zorrinho a Vitalino Canas. Junte-se a isto Jaime Gama, Ferro Rodrigues, António Vitorino e Jorge Coelho e têm-se o novo PS - baseado na força do aparelho. Une-os a todos a partilha do poder e a recusa em continuar a venerar o mito-fundador Mário Soares.

À parte a ruptura pessoal Guterres-Carrilho, o segundo dia de congresso mais não foi do que a concretização do enterro da memória do PS soarista, republicano e laico e a consagração do PS tecnocrático, aparelhístico e guiado pela consciência social. Uma ruptura que, paradoxalmente, foi assumida pessoalmente por uma relativamente recente militante do PS que aderiu ao partido com Guterres: Helena Roseta. Acabou por subir ao palco para recusar que o Congresso se transformasse numa espécie de Kosovo socialista. Anunciou que se absteria na moção de estratégia do líder por não concordar com a "pouca esquerda" que achava existir na mesma.

Mas Helena Roseta lá foi dizendo a Guterres que não gostava de ver a questão do aborto tratada como "colateral" pelo secretário-geral - moção que face à falência de tentativas de entendimento será hoje derrotada pelo Congresso E não cortando com o que é a nova geração do soarismo, tratou de se perfilar para a luta do PS para manter João Soares na presidência da Câmara de Lisboa - um apoio que funcionou como resposta simbólica à forma como João Soares abrira o Congresso, lembrando o ausente Manuel Alegre.

Era o fim das esperanças que restavam em alguns socialistas de que ainda houvesse uma saída airosa que permitisse salvar a fraternidade à antiga. Face à posição de Helena Roseta e ao fim das expectativas quanto à permanência de outro crítico deste Congresso, Henrique Neto também excluído por Guterres, restava a dúvida sobre se Manuel Alegre aceitava ou não ficar na nova comissão nacional. As pressões para que ficasse em nome da cultura de resistência multiplicavam-se. Sobretudo dos sectores soaristas. Mas também existiram, ao que o PÚBLICO apurou, pressões de figuras próximas de Jorge Coelho, tentando fazer a ponte. O poeta-deputado não aceitou, contudo, permanecer na direcção.

Alegre recusa Comissão Nacional

Ao PÚBLICO, o poeta-deputado explicou: "Não aceito, porque não teria lógica não ir ao Congresso por razões críticas e depois ficar na comissão nacional." Sobre o decorrer dos trabalhos apenas quis comentar a vaia do Congresso a Carrilho: "Embora eu não concorde com muitas das posições de Carrilho, estou muito chocado com o facto de ele ter sido assobiado. Isso não aconteceu com João Amaral quando ele falou no Congresso do PCP. Os assobios a Carrilho são um sinal de intolerância, incompatível com a tradição e a cultura democrática do PS."

No pavilhão, ao lado de Alegre, Roseta, Neto e Carrilho apenas deram a cara dois delegados: Ferro Rodrigues e Francisco Assis. Ferro considerou que "este Congresso não pode ser de purga" e Assis rejeitou que "o PS se antagonize com o PS" e apelou a que o "impulso reformador" do PS contasse com "todos os socialistas".

Contra a conciliação e a favor da ruptura anunciada por Guterres destaquem-se as intervenções de Jorge Coelho e de José Sócrates - isto depois de José Junqueiro e Mesquita Machado terem aberto as hostilidades e começado a levantar o Congresso em nome do aparelhismo e do basismo.

A guerra total a qualquer cedência e o desfazer das dúvidas seria assumido pelo agora relegitimado como número dois, Jorge Coelho, que, já ao princípio da noite, depois de pedir aos críticos "solidariedade e acima de tudo respeito" pelos delegados e militantes, disse: "Tenham coragem, assumam-se!"

Um grito de guerra que poderá ter resposta depois das próximas autárquicas. Isto porque, havia já ontem quem garantisse que depois do esforço de unidade na próxima batalha eleitoral, o machado de guerra poderia ser desenterrado e iniciada a organização da oposição interna ao guterrismo.

Guterres Rompe com o PS Histórico

Por SÃO JOSÉ ALMEIDA

Domingo, 6 de Maio de 2001

Num estilo inédito entre os socialistas, o próprio Guterres cortou com a história do PS. Roseta consumou a ruptura. E Alegre não aceitou integrar a comissão nacional

O XII Congresso do PS que hoje termina representa um momento de viragem inédito. António Guterres usou a autoridade de quem chefia o partido há uma década e o levou ao poder para romper com o PS histórico e assumir preto no branco que não dará mais "cobertura política" ao tradicional estilo socialista dos grandes debates e confrontos político-ideológicos que acabam em grandes abraços e declarações de solidariedade.

Parece, assim, ter chegado o momento de uma nova geração de socialistas - de José Sócrates a António Costa, de Carlos Zorrinho a Vitalino Canas. Junte-se a isto Jaime Gama, Ferro Rodrigues, António Vitorino e Jorge Coelho e têm-se o novo PS - baseado na força do aparelho. Une-os a todos a partilha do poder e a recusa em continuar a venerar o mito-fundador Mário Soares.

À parte a ruptura pessoal Guterres-Carrilho, o segundo dia de congresso mais não foi do que a concretização do enterro da memória do PS soarista, republicano e laico e a consagração do PS tecnocrático, aparelhístico e guiado pela consciência social. Uma ruptura que, paradoxalmente, foi assumida pessoalmente por uma relativamente recente militante do PS que aderiu ao partido com Guterres: Helena Roseta. Acabou por subir ao palco para recusar que o Congresso se transformasse numa espécie de Kosovo socialista. Anunciou que se absteria na moção de estratégia do líder por não concordar com a "pouca esquerda" que achava existir na mesma.

Mas Helena Roseta lá foi dizendo a Guterres que não gostava de ver a questão do aborto tratada como "colateral" pelo secretário-geral - moção que face à falência de tentativas de entendimento será hoje derrotada pelo Congresso E não cortando com o que é a nova geração do soarismo, tratou de se perfilar para a luta do PS para manter João Soares na presidência da Câmara de Lisboa - um apoio que funcionou como resposta simbólica à forma como João Soares abrira o Congresso, lembrando o ausente Manuel Alegre.

Era o fim das esperanças que restavam em alguns socialistas de que ainda houvesse uma saída airosa que permitisse salvar a fraternidade à antiga. Face à posição de Helena Roseta e ao fim das expectativas quanto à permanência de outro crítico deste Congresso, Henrique Neto também excluído por Guterres, restava a dúvida sobre se Manuel Alegre aceitava ou não ficar na nova comissão nacional. As pressões para que ficasse em nome da cultura de resistência multiplicavam-se. Sobretudo dos sectores soaristas. Mas também existiram, ao que o PÚBLICO apurou, pressões de figuras próximas de Jorge Coelho, tentando fazer a ponte. O poeta-deputado não aceitou, contudo, permanecer na direcção.

Alegre recusa Comissão Nacional

Ao PÚBLICO, o poeta-deputado explicou: "Não aceito, porque não teria lógica não ir ao Congresso por razões críticas e depois ficar na comissão nacional." Sobre o decorrer dos trabalhos apenas quis comentar a vaia do Congresso a Carrilho: "Embora eu não concorde com muitas das posições de Carrilho, estou muito chocado com o facto de ele ter sido assobiado. Isso não aconteceu com João Amaral quando ele falou no Congresso do PCP. Os assobios a Carrilho são um sinal de intolerância, incompatível com a tradição e a cultura democrática do PS."

No pavilhão, ao lado de Alegre, Roseta, Neto e Carrilho apenas deram a cara dois delegados: Ferro Rodrigues e Francisco Assis. Ferro considerou que "este Congresso não pode ser de purga" e Assis rejeitou que "o PS se antagonize com o PS" e apelou a que o "impulso reformador" do PS contasse com "todos os socialistas".

Contra a conciliação e a favor da ruptura anunciada por Guterres destaquem-se as intervenções de Jorge Coelho e de José Sócrates - isto depois de José Junqueiro e Mesquita Machado terem aberto as hostilidades e começado a levantar o Congresso em nome do aparelhismo e do basismo.

A guerra total a qualquer cedência e o desfazer das dúvidas seria assumido pelo agora relegitimado como número dois, Jorge Coelho, que, já ao princípio da noite, depois de pedir aos críticos "solidariedade e acima de tudo respeito" pelos delegados e militantes, disse: "Tenham coragem, assumam-se!"

Um grito de guerra que poderá ter resposta depois das próximas autárquicas. Isto porque, havia já ontem quem garantisse que depois do esforço de unidade na próxima batalha eleitoral, o machado de guerra poderia ser desenterrado e iniciada a organização da oposição interna ao guterrismo.

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