EXPRESSO: País

13-12-2001
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Fim da legalização deixa 40 mil imigrantes de fora

Portugal não dá mais autorizações de permanência, o que cria uma bolsa de clandestinos

António Pedro Ferreira Iuri Dimitrev, um ucraniano em Portugal, sabe pedir a «bica cheia», mas não conseguiu que os patrões lhe passassem um contrato para se legalizar

A LEGALIZAÇÃO de imigrantes acabou esta semana. Desde segunda-feira deixaram de ser concedidas as autorizações de permanência que qualquer imigrante, desde que fosse detentor de um contrato de trabalho válido, podia obter, mesmo que tivesse chegado ilegal a Portugal. Segundo a Associação Solidariedade Imigrante, haverá cerca de

O próprio director dos Serviços de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), Júlio Pereira, admite que haverá «bolsas de imigrantes que não se conseguiram legalizar, por exemplo, no Algarve».

Mas nem o SEF nem o Ministério da Administração Interna prevêem grandes campanhas de expulsão destes ilegais. «Cada caso vai ser avaliado com bom senso», garante Carlos Zorrinho. O problema é que quem está ilegal dificilmente terá coragem para se dirigir às autoridades.

O processo de legalização estava aberto desde Janeiro e terminou, como previa a legislação, porque se consideram completas as necessidades de mão-de-obra. Legalizaram-se mais de 120 mil trabalhadores, enquanto o relatório de previsão dessas necessidades, elaborado pela secretaria de Estado do Trabalho em Agosto deste ano, previa que fossem precisos apenas 73 mil.

Apesar do que lhe dizem estes números - não estando legalizado não tem lugar em Portugal -, o ucraniano Iuri Dimitriev sabe que trabalho é o que não lhe falta. Só não conseguiu um patrão que lhe passasse um contrato para o visto de permanência. No serviço que ele faz, de ladrilhador, só há biscateiros, a dois e três meses, com quem os patrões não costumam fazer contrato. «E estou cá há quase dois anos», diz, mostrando o único visto que tem no passaporte, o de Espanha, que usou para entrar na Europa e chegar a Portugal. O último patrão despediu-o, há 15 dias, quando ele lhe pediu um contrato de trabalho.

Iuri não sabe o que fazer. Tem 32 anos, «só queria assentar», e agora está ilegal e já não tem hipóteses de legalização. Só se voltar ao país de origem, se se recensear num consulado português e esperar por um pedido de mão-de-obra que lhe dê visto de trabalho.

Carlos Zorrinho, secretário de Estado da Administração Interna, explica que as restrições são propositadas. «Vamos privilegiar a legalidade da imigração desde a origem e dificultar os que chegam ilegalmente. As autorizações de permanência serviram para regularizar a situação. Agora, acabou.»

Não haverá expulsões

Para já, a mudança de situação está a provocar confusões. A decisão do Conselho de Ministros de terminar o período de concessão das autorizações de residência esteve mais de dois meses para ser publicada em «Diário da República». E mesmo os serviços aos quais os imigrantes se dirigiam, nunca lhes davam essa informação.

Na terça-feira, por exemplo, a Inspecção de Trabalho fechou o principal gabinete de recepção de contratos, no Jardim Constantino, em Lisboa, deixando apenas um segurança à porta que, obviamente, não sabia prestar informações. Os imigrantes chegavam e eram surpreendidos com a situação de facto. Houve desespero, como o do moçambicano Edgar Sequeira, de 25 anos, que tinha estado nos serviços na sexta-feira anterior com o processo quase completo e tinha sido aconselhado a voltar na semana seguinte.

«Isto não se faz a uma pessoa», dizia continuamente Edgar, mostrando a nota da funcionária a indicar o nome da pessoa à qual se devia dirigir. Um dia mais tarde, recuando na matéria, o inspector-geral do Trabalho, Mota da Silva disse que tinha sido tomada a decisão de legalizar «quem conseguisse provar que estava a trabalhar antes do dia 30 de Novembro».

Desde segunda-feira, as associações de imigrantes recebem pedidos de ajuda. «Na construção civil há muitos patrões sem alvará e processos que apesar de já terem entrado na Inspecção, estão parados», diz Alcestina Tolentino, da Associação Cabo-verdiana.

Os contingentes de imigrantes - que o Partido Popular exigiu para aprovar a lei da imigração quando esta esteve no Parlamento - foram sempre polémicos. «As quotas não evitam a entrada em Portugal de mais imigrantes», defende Carlos Trindade, da CGTP.

O padre Alexandre Bonito, da Igreja ortodoxa, com um programa de apoio aos imigrantes do Leste, defende que «os circuitos da imigração ilegal vão continuar a enganar pessoas e a trazê-las para cá».

Fim da legalização deixa 40 mil imigrantes de fora

Portugal não dá mais autorizações de permanência, o que cria uma bolsa de clandestinos

António Pedro Ferreira Iuri Dimitrev, um ucraniano em Portugal, sabe pedir a «bica cheia», mas não conseguiu que os patrões lhe passassem um contrato para se legalizar

A LEGALIZAÇÃO de imigrantes acabou esta semana. Desde segunda-feira deixaram de ser concedidas as autorizações de permanência que qualquer imigrante, desde que fosse detentor de um contrato de trabalho válido, podia obter, mesmo que tivesse chegado ilegal a Portugal. Segundo a Associação Solidariedade Imigrante, haverá cerca de

O próprio director dos Serviços de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), Júlio Pereira, admite que haverá «bolsas de imigrantes que não se conseguiram legalizar, por exemplo, no Algarve».

Mas nem o SEF nem o Ministério da Administração Interna prevêem grandes campanhas de expulsão destes ilegais. «Cada caso vai ser avaliado com bom senso», garante Carlos Zorrinho. O problema é que quem está ilegal dificilmente terá coragem para se dirigir às autoridades.

O processo de legalização estava aberto desde Janeiro e terminou, como previa a legislação, porque se consideram completas as necessidades de mão-de-obra. Legalizaram-se mais de 120 mil trabalhadores, enquanto o relatório de previsão dessas necessidades, elaborado pela secretaria de Estado do Trabalho em Agosto deste ano, previa que fossem precisos apenas 73 mil.

Apesar do que lhe dizem estes números - não estando legalizado não tem lugar em Portugal -, o ucraniano Iuri Dimitriev sabe que trabalho é o que não lhe falta. Só não conseguiu um patrão que lhe passasse um contrato para o visto de permanência. No serviço que ele faz, de ladrilhador, só há biscateiros, a dois e três meses, com quem os patrões não costumam fazer contrato. «E estou cá há quase dois anos», diz, mostrando o único visto que tem no passaporte, o de Espanha, que usou para entrar na Europa e chegar a Portugal. O último patrão despediu-o, há 15 dias, quando ele lhe pediu um contrato de trabalho.

Iuri não sabe o que fazer. Tem 32 anos, «só queria assentar», e agora está ilegal e já não tem hipóteses de legalização. Só se voltar ao país de origem, se se recensear num consulado português e esperar por um pedido de mão-de-obra que lhe dê visto de trabalho.

Carlos Zorrinho, secretário de Estado da Administração Interna, explica que as restrições são propositadas. «Vamos privilegiar a legalidade da imigração desde a origem e dificultar os que chegam ilegalmente. As autorizações de permanência serviram para regularizar a situação. Agora, acabou.»

Não haverá expulsões

Para já, a mudança de situação está a provocar confusões. A decisão do Conselho de Ministros de terminar o período de concessão das autorizações de residência esteve mais de dois meses para ser publicada em «Diário da República». E mesmo os serviços aos quais os imigrantes se dirigiam, nunca lhes davam essa informação.

Na terça-feira, por exemplo, a Inspecção de Trabalho fechou o principal gabinete de recepção de contratos, no Jardim Constantino, em Lisboa, deixando apenas um segurança à porta que, obviamente, não sabia prestar informações. Os imigrantes chegavam e eram surpreendidos com a situação de facto. Houve desespero, como o do moçambicano Edgar Sequeira, de 25 anos, que tinha estado nos serviços na sexta-feira anterior com o processo quase completo e tinha sido aconselhado a voltar na semana seguinte.

«Isto não se faz a uma pessoa», dizia continuamente Edgar, mostrando a nota da funcionária a indicar o nome da pessoa à qual se devia dirigir. Um dia mais tarde, recuando na matéria, o inspector-geral do Trabalho, Mota da Silva disse que tinha sido tomada a decisão de legalizar «quem conseguisse provar que estava a trabalhar antes do dia 30 de Novembro».

Desde segunda-feira, as associações de imigrantes recebem pedidos de ajuda. «Na construção civil há muitos patrões sem alvará e processos que apesar de já terem entrado na Inspecção, estão parados», diz Alcestina Tolentino, da Associação Cabo-verdiana.

Os contingentes de imigrantes - que o Partido Popular exigiu para aprovar a lei da imigração quando esta esteve no Parlamento - foram sempre polémicos. «As quotas não evitam a entrada em Portugal de mais imigrantes», defende Carlos Trindade, da CGTP.

O padre Alexandre Bonito, da Igreja ortodoxa, com um programa de apoio aos imigrantes do Leste, defende que «os circuitos da imigração ilegal vão continuar a enganar pessoas e a trazê-las para cá».

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