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28-10-2000
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Jazz no Festival dos 100 Dias Quadros sonoros "Quadrofonia do Tempo" - o espectáculo que hoje e amanhã, no pequeno auditório do Centro Cultural de Belém, devolve as cores do jazz ao Festival dos 100 Dias - é uma oportunidade rara para ouvir no mesmo palco quatro das mais fortes personalidades da cena jazzística portuguesa: o trompetista Laurent Filipe, que é também o autor do projecto, o saxofonista Carlos Martins, o pianista Bernardo Sassetti e o contrabaixista Carlos Barretto, todos eles autores individuais e intérpretes colectivos dos quatro "quadros sonoros" que fazem a "Quadrofonia". Partindo do lema "Balanço do Século", a ideia inicial de Laurent Filipe foi juntar-se a "três colegas de profissão e amigos de várias experiências, desafiando cada um deles a representar musicalmente um acontecimento deste século que os tivesse marcado e influenciado no desenvolvimento da sua sensibilidade artística". A obra final, esta noite exposta ao público, são os quatro "quadros sonoros" representando o cinema, a pintura, a poesia e a dança, "com animação interactiva e recorrendo à projecção de imagens e bailado", salvaguardando a preocupação de que os meios técnicos utilizados funcionem como "um recurso de apoio à criatividade da obra e não uma finalidade em si". Sem o que, acrescenta Laurent, "o resultado acabaria por ser inevitavelmente tecnológico e não criativo". Segundo informações do próprio autor, o primeiro quadro, escrito por Bernardo Sassetti, foca a relação da música com o cinema. Uma opção evocativa da "primeira grande paixão" do pianista - a cumplicidade de duas linguagens - despertada por algumas das suas participações em sessões de cinema mudo organizadas pela Cinemateca. Assim nasceu a ideia de musicar "Os Crimes de Diogo Alves", um filme de 1911 de João Correia e João Tavares. Depois da recente experiência de Zé Eduardo com as imagens de Charlot, chegou a vez de Sassetti mergulhar na memória do cinema português. A dúvida já era e continua clássica: deverão as notas sobreviver sem o corpo das imagens que as criaram? Ou, pelo contrário, será essa sobrevivência, precisamente, um sintoma de falhanço? Com Laurent Filipe, a fonte inspiradora é a pintura de Amadeo Souza Cardoso, que originou um filme, igualmente assinado pelo trompetista, concebido como "uma viagem microscópica pelas linhas, texturas e pormenores" da sua obra "TSF Brut 300", raiz de "cinco pequenas peças musicais que ilustram quatro partes e um todo do quadro". Dos versos de Al Berto partiu Carlos Martins para "Jardins Subterrâneos", título do terceiro "quadro sonoro", entendido como "uma viagem errante sobre esta passagem do nosso corpo pela vida, pelo mundo". Jornada também ela visionada por imagens de Edgar Pêra e pela necessidade de afirmação das tecnologias do mundo contemporâneo e, acima de tudo, do "esbatimento das fronteiras entre todas as artes" como marca do nosso século. Dos gestos da música e do seu silêncio falarão, por fim, Carlos Barretto e os bailarinos e coreógrafos Ana Rita Barata e Peter Michael Dietz, seus convidados, em os "Os Seis Sentidos", uma peça concebida como "seis formas de perceber e sentir o mundo contemporâneo". O percussionista José Salgueiro (ao longo de todo o tempo da "Quadrofonia"), o guitarrista Mário Delgado (em "Os Crimes de Diogo Alves" e "Brut 300 TSF") e o rapper Pac (em "Jardins Subterrâneos") completam a lista de protagonistas deste "balanço do século". A ambição do projecto parece evidente e os riscos assumidos também. O cruzamento das artes e a abolição de fronteiras são um terreno tentador mas traiçoeiro. A transgressão das regras é, muitas vezes, mais criativa do que a sua abolição. Mas em matéria de arte(s), a ideia é sempre um por fazer, uma obra adiada. Só em cima do palco "Quadrofonia do Tempo" poderá encontrar, ou não, o modo de vencer a distância que separa o sonhar a vida do viver o sonho. "QUADROFONIA DO TEMPO" Lisboa, Pequeno Auditório do Centro Cultural de Belém, 11 e 12, às 22h António Curvelo (c) Copyright PÚBLICO Comunicação Social, SA Email: publico@publico.pt

Jazz no Festival dos 100 Dias Quadros sonoros "Quadrofonia do Tempo" - o espectáculo que hoje e amanhã, no pequeno auditório do Centro Cultural de Belém, devolve as cores do jazz ao Festival dos 100 Dias - é uma oportunidade rara para ouvir no mesmo palco quatro das mais fortes personalidades da cena jazzística portuguesa: o trompetista Laurent Filipe, que é também o autor do projecto, o saxofonista Carlos Martins, o pianista Bernardo Sassetti e o contrabaixista Carlos Barretto, todos eles autores individuais e intérpretes colectivos dos quatro "quadros sonoros" que fazem a "Quadrofonia". Partindo do lema "Balanço do Século", a ideia inicial de Laurent Filipe foi juntar-se a "três colegas de profissão e amigos de várias experiências, desafiando cada um deles a representar musicalmente um acontecimento deste século que os tivesse marcado e influenciado no desenvolvimento da sua sensibilidade artística". A obra final, esta noite exposta ao público, são os quatro "quadros sonoros" representando o cinema, a pintura, a poesia e a dança, "com animação interactiva e recorrendo à projecção de imagens e bailado", salvaguardando a preocupação de que os meios técnicos utilizados funcionem como "um recurso de apoio à criatividade da obra e não uma finalidade em si". Sem o que, acrescenta Laurent, "o resultado acabaria por ser inevitavelmente tecnológico e não criativo". Segundo informações do próprio autor, o primeiro quadro, escrito por Bernardo Sassetti, foca a relação da música com o cinema. Uma opção evocativa da "primeira grande paixão" do pianista - a cumplicidade de duas linguagens - despertada por algumas das suas participações em sessões de cinema mudo organizadas pela Cinemateca. Assim nasceu a ideia de musicar "Os Crimes de Diogo Alves", um filme de 1911 de João Correia e João Tavares. Depois da recente experiência de Zé Eduardo com as imagens de Charlot, chegou a vez de Sassetti mergulhar na memória do cinema português. A dúvida já era e continua clássica: deverão as notas sobreviver sem o corpo das imagens que as criaram? Ou, pelo contrário, será essa sobrevivência, precisamente, um sintoma de falhanço? Com Laurent Filipe, a fonte inspiradora é a pintura de Amadeo Souza Cardoso, que originou um filme, igualmente assinado pelo trompetista, concebido como "uma viagem microscópica pelas linhas, texturas e pormenores" da sua obra "TSF Brut 300", raiz de "cinco pequenas peças musicais que ilustram quatro partes e um todo do quadro". Dos versos de Al Berto partiu Carlos Martins para "Jardins Subterrâneos", título do terceiro "quadro sonoro", entendido como "uma viagem errante sobre esta passagem do nosso corpo pela vida, pelo mundo". Jornada também ela visionada por imagens de Edgar Pêra e pela necessidade de afirmação das tecnologias do mundo contemporâneo e, acima de tudo, do "esbatimento das fronteiras entre todas as artes" como marca do nosso século. Dos gestos da música e do seu silêncio falarão, por fim, Carlos Barretto e os bailarinos e coreógrafos Ana Rita Barata e Peter Michael Dietz, seus convidados, em os "Os Seis Sentidos", uma peça concebida como "seis formas de perceber e sentir o mundo contemporâneo". O percussionista José Salgueiro (ao longo de todo o tempo da "Quadrofonia"), o guitarrista Mário Delgado (em "Os Crimes de Diogo Alves" e "Brut 300 TSF") e o rapper Pac (em "Jardins Subterrâneos") completam a lista de protagonistas deste "balanço do século". A ambição do projecto parece evidente e os riscos assumidos também. O cruzamento das artes e a abolição de fronteiras são um terreno tentador mas traiçoeiro. A transgressão das regras é, muitas vezes, mais criativa do que a sua abolição. Mas em matéria de arte(s), a ideia é sempre um por fazer, uma obra adiada. Só em cima do palco "Quadrofonia do Tempo" poderá encontrar, ou não, o modo de vencer a distância que separa o sonhar a vida do viver o sonho. "QUADROFONIA DO TEMPO" Lisboa, Pequeno Auditório do Centro Cultural de Belém, 11 e 12, às 22h António Curvelo (c) Copyright PÚBLICO Comunicação Social, SA Email: publico@publico.pt

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