A realidade não é a preto e branco

15-03-2002
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A Realidade Não É a Preto e Branco

Por DAVID PONTES

Sábado, 2 de Março de 2002 Comecemos por considerar que o presidente da Câmara do Porto tem toda a legitimidade para tentar impor os seus pontos de vista: defender um modelo de cidade, proteger os pequenos comerciantes, estar contra o complexo previsto para as Antas. Mas, a partir do momento em que soube que não era capaz de impor a sua vontade pelo diálogo, restava-lhe assumir uma atitude de humildade democrática e reconhecer a validade dos contratos celebrados com o seu antecessor, eleito pelo povo, como ele. Não foi isso que ontem Rio fez e, ao impor a sua vontade, o presidente da Câmara do Porto gerou um problema de insondáveis dimensões. Pinto da Costa fez o que se adivinhava - mandou parar as obras -, e resta agora saber as consequências do seu acto na vida de uma cidade que da forma mais inesperada deixou, pelo menos para já, de poder contar com uma importantíssima operação de requalificação urbana de uma zona sensível e sem um estádio para a abertura do Euro 2004. Ainda é cedo para se avaliar todas as consequências, mas, para o bem ou para o mal, Rui Rio terá de arrastar, até ao fim do seu mandato, as consequências de um acto que fere o orgulho da cidade que o elegeu. Sem nunca ter proferido declarações de substância sobre o Plano das Antas durante a campanha autárquica, Rui Rio fez do problema uma obsessão. Começou por denunciar - com boas doses de razão -, as negociações de Nuno Cardoso, prosseguiu com a incapacidade financeira do município para pagar as acessibilidades do plano e acabou por verter o grosso das suas queixas para o "drama" dos pequenos comerciantes da cidade. Ao longo da ofensiva, mostrou ter estudado mal o processo, nunca quis saber de respostas por parte dos organismos da administração central que lhe poderiam aliviar a factura (só ontem pediu um encontro ao secretário de Estado das Obras Públicas), manipulou custos e prováveis proveitos a favor dos seus argumentos e encontrou, finalmente, nos comerciantes o único aliado capaz de lhe dar lastro à sua vontade. Se era essa a sua vontade, o plano e o novo Estádio das Antas estão finalmente parados. Que Rio herdou uma câmara em situação financeira difícil, ninguém duvida, que o plano de Manuel Salgado (o autor da Expo 98) é susceptível de críticas, é natural. O problema é que, sem a sensibilidade política de Santana Lopes ou de Carlos Encarnação, Rio investiu-se de uma enorme dose de demagogia e de populismo para descobrir no processo uma luta do bem contra o mal, da pobreza dos bairros sociais contra o luxo da nova urbanização, dos remediados das lojas decrépitas da Baixa contra a luminosidade ostentatória dos centros comerciais. E agiu como se em causa estivesse a sorte do mundo. Mas, como ele aprenderá, a realidade não é a preto e branco. Há quem possa ver no seu acto um gesto de coragem contra os "interesses" instalados, mas a sua decisão não encerra apenas um conflito com o maior clube da cidade: em causa fica também o bom nome do Estado e do país que se comprometeu a ter as Antas prontas para receber a estreia de um grande acontecimento internacional. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Obras nas Antas param hoje

Frases

Rio: "Alarido" de Pinto da Costa é "reacção a quente"

Uma polémica em crescendo

Abertura, meias-finais e final serão em Lisboa

Uma bola de neve chamada direito de regresso

Reacções

EDITORIAL

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