EXPRESSO: Artigo

07-01-2002
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Álvaro Cunhal O último estalinista

Indisponível para admitir o fracasso ideológico que levou à hecatombe os regimes comunistas do Leste europeu, e acabou de vez com a utopia da sociedade sem classes, Álvaro Cunhal, à beira de completar 88 anos, insiste imperturbável nas mesmas ideias de sempre, como quem profetiza que a História um dia ainda lhe há-de dar razão. Misterioso e solitário, à maneira de Salazar, fez da sua vida um combate sem fim, desafiando tudo e todos — a PIDE e a ditadura, o 25 de Novembro e a «Perestroika», o muro de Berlim e a construção europeia. Avesso aos ventos de mudança, interpretou à sua maneira cada derrota, impondo internamente as suas teses, destruindo vias alternativas, humilhando dissidentes — tudo em nome da causa intemporal dos explorados. Mais do que coerente, é um conservador. Na sua última entrevista ao EXPRESSO, em Maio de 2000, confidenciava ainda, provocador e insubmisso: «Sinto-me bem quando combato».

Texto de Orlando Raimundo

Fotografias de Rui Ochôa (actuais) e Edições Avante (históricas) Filho-família, estudante, político, advogado, mestre-escola, romancista, esteta, desenhador, pintor — há muitas vidas sobrepostas na longa vida de Cunhal. A imensidão de perfis não mostra todavia o trivial, as minudências de que é feita a existência. O muito que dele se sabe é, afinal, bem pouco. Homem obsessivamente misterioso, aureolado de romantismo, faz do privado um segredo, escondendo grandezas e misérias da condição humana. Como se a clandestinidade fosse obsessão para toda a vida. Filho-família, estudante, político, advogado, mestre-escola, romancista, esteta, desenhador, pintor — há muitas vidas sobrepostas na longa vida de Cunhal. A imensidão de perfis não mostra todavia o trivial, as minudências de que é feita a existência. O muito que dele se sabe é, afinal, bem pouco. Homem obsessivamente misterioso, aureolado de romantismo, faz do privado um segredo, escondendo grandezas e misérias da condição humana. Como se a clandestinidade fosse obsessão para toda a vida. Uma das raras vezes em que decidiu revelar escassos pormenores da sua intimidade escolheu como interlocutora uma jornalista absolutamente «sui generis»: Yúlia Petrova, neta de Krutchev, que, em 1963, fez para as Edições Pravda um retrato encomiástico da sua liderança. Mas nem a história que contou, de uma banalíssima ousadia de infância, escapa à regra das lições de propaganda. É a memória do dia em que mostrou ao pai um pardal morto à fisgada. «Às vezes — disse-lhe o ‘velho’ — os homens necessitam de fazer mal, mas quanto menos vezes se fizer isso melhor. Essa tua façanha não é nenhuma vitória». A Maternidade Daniel de Matos, em Coimbra Álvaro Barreirinhas Cunhal nasce na Maternidade Daniel de Matos, junto ao Jardim Botânico, em Coimbra, a 10 de Novembro de 1913, o dia em que Charles Chaplin faz os derradeiros testes para iniciar a sua genial carreira de actor. A milhares de quilómetros de distância, em Cracóvia, onde se encontra exilado, Lenine ultimava o programa ideológico bolchevique, pugnando pela «Revolução Social», que haveria de levar pela primeira vez na História os comunistas ao poder. No ano anterior, Portugal fora abalado por uma greve geral, que paralisara durante semanas Lisboa e a outra banda, colocando em sérias dificuldades o Governo republicano. Centenas de grevistas tinham sido colocados sob prisão em navios de guerra; o administrador do Concelho da Moita fora assassinado pelos operários e a tropa vira-se obrigada a proclamar o estado de sítio em Almada. Álvaro Barreirinhas Cunhal nasce na Maternidade Daniel de Matos, junto ao Jardim Botânico, em Coimbra, a 10 de Novembro de 1913, o dia em que Charles Chaplin faz os derradeiros testes para iniciar a sua genial carreira de actor. A milhares de quilómetros de distância, em Cracóvia, onde se encontra exilado, Lenine ultimava o programa ideológico bolchevique, pugnando pela «Revolução Social», que haveria de levar pela primeira vez na História os comunistas ao poder. No ano anterior, Portugal fora abalado por uma greve geral, que paralisara durante semanas Lisboa e a outra banda, colocando em sérias dificuldades o Governo republicano. Centenas de grevistas tinham sido colocados sob prisão em navios de guerra; o administrador do Concelho da Moita fora assassinado pelos operários e a tropa vira-se obrigada a proclamar o estado de sítio em Almada. Exterior da igreja paroquial da Senhora da Assunção, onde foi baptizado A família Cunhal, típica representante da classe média, habitava uma pequena casa de paredes cor-de-rosa, com rés-do-chão e primeiro andar, na Ladeira das Alpenduradas, em Coimbra, uma rua secundária lá para as bandas do Bairro Norton de Matos, onde mais tarde se instalou um barbeiro, conforme atesta a placa. Ali viveu e brincou durante três anos o pequeno Álvaro, segundo dos quatro filhos do casal, que em 1916 se mudou para Seia, terra de naturalidade do pai. A família Cunhal, típica representante da classe média, habitava uma pequena casa de paredes cor-de-rosa, com rés-do-chão e primeiro andar, na Ladeira das Alpenduradas, em Coimbra, uma rua secundária lá para as bandas do Bairro Norton de Matos, onde mais tarde se instalou um barbeiro, conforme atesta a placa. Ali viveu e brincou durante três anos o pequeno Álvaro, segundo dos quatro filhos do casal, que em 1916 se mudou para Seia, terra de naturalidade do pai. Instalaram-se numa casa de aspecto imponente, ainda que mal conservada, no centro da vila, junto à Igreja Matriz, em cujo adro as crianças brincavam. O rapazinho foi baptizado, já com cinco anos, na igreja paroquial da Senhora da Assunção. Foram padrinhos o irmão mais velho, António José e... a Virgem Nossa Senhora, convocada em preces pela mãe. Interior da mesma igreja A viagem na máquina do tempo pela árvore genealógica identifica um barão de Santa Comba, terra de origem de Salazar, como referência mais antiga do clã pelo lado materno. A estirpe aristocrática passa por uma família de cristãos-novos da época da Restauração. E há notícias de um antepassado visconde de Ervedal e outro conde da Ervideira, que estabeleceram relações de sangue com os marqueses da Praia e de Monforte e com membros influentes da hierarquia da Igreja. Talvez isso explique o porte altivo emblemático, do líder carismático dos comunistas portugueses. A viagem na máquina do tempo pela árvore genealógica identifica um barão de Santa Comba, terra de origem de Salazar, como referência mais antiga do clã pelo lado materno. A estirpe aristocrática passa por uma família de cristãos-novos da época da Restauração. E há notícias de um antepassado visconde de Ervedal e outro conde da Ervideira, que estabeleceram relações de sangue com os marqueses da Praia e de Monforte e com membros influentes da hierarquia da Igreja. Talvez isso explique o porte altivo emblemático, do líder carismático dos comunistas portugueses. Casa de fachada cor-de-rosa onde a família Cunhal vivia na Ladeira da Alpendurada, em Coimbra Beirão de alma e coração, o pai, Avelino da Costa Cunhal, apesar da ascendência modesta, conseguira formar-se em Direito em Coimbra, à custa de muitos sacrifícios e algumas explicações. Pouco depois de ele nascer, no regresso às origens, abriu banca de advogado em Seia. Durante o consulado de Sidónio Pais, foi administrador do Concelho, vindo a ocupar mais tarde o cargo de governador civil da Guarda, que anos antes fora desempenhado por João Soares, pai de Mário Soares. Morreu em 1966, com 78 anos. Nunca foi do PCP, mas fez da sua vida um combate contra a ditadura, chegando a estar preso na fase em que o filho se encontrava já na clandestinidade. É autor de diversas peças de teatro de intervenção, algumas das quais ainda viu encenadas, no Escola Jaime Cortesão, em Coimbra, numa cumplicidade que passava por esconder da censura o nome do autor. Beirão de alma e coração, o pai, Avelino da Costa Cunhal, apesar da ascendência modesta, conseguira formar-se em Direito em Coimbra, à custa de muitos sacrifícios e algumas explicações. Pouco depois de ele nascer, no regresso às origens, abriu banca de advogado em Seia. Durante o consulado de Sidónio Pais, foi administrador do Concelho, vindo a ocupar mais tarde o cargo de governador civil da Guarda, que anos antes fora desempenhado por João Soares, pai de Mário Soares. Morreu em 1966, com 78 anos. Nunca foi do PCP, mas fez da sua vida um combate contra a ditadura, chegando a estar preso na fase em que o filho se encontrava já na clandestinidade. É autor de diversas peças de teatro de intervenção, algumas das quais ainda viu encenadas, no Escola Jaime Cortesão, em Coimbra, numa cumplicidade que passava por esconder da censura o nome do autor. A mãe, Mercedes Ferreira Barreirinhas, provinha de uma família católica e burguesa. Nunca nutriu qualquer admiração pela actividade do filho. Bem pelo contrário: declarava-se até anticomunista, recebendo com hostilidade todos quantos se movimentavam politicamente perto do filho. Dela, que nunca o visitou nos longos anos em que esteve preso — embora tenha chegado a meter «cunhas» em tentativas falhadas de o libertar — herdou Cunhal a dureza de carácter. O rapaz frequentou a Escola Primária em Seia e quando tinha 8 anos sofreu um rude abalo: a morte da irmã, Maria Mansuenta, vítima da tuberculose. Enquanto a mãe o confortava na dor, um grupo de dirigentes da Federação Maximalista fundava clandestinamente, em Lisboa, o Partido Comunista Português, sem estrutura orgânica consistente, nem base proletária de apoio, ainda sob forte influência anarco-sindicalista. A mãe, Mercedes Ferreira Barreirinhas, provinha de uma família católica e burguesa. Nunca nutriu qualquer admiração pela actividade do filho. Bem pelo contrário: declarava-se até anticomunista, recebendo com hostilidade todos quantos se movimentavam politicamente perto do filho. Dela, que nunca o visitou nos longos anos em que esteve preso — embora tenha chegado a meter «cunhas» em tentativas falhadas de o libertar — herdou Cunhal a dureza de carácter. O rapaz frequentou a Escola Primária em Seia e quando tinha 8 anos sofreu um rude abalo: a morte da irmã, Maria Mansuenta, vítima da tuberculose. Enquanto a mãe o confortava na dor, um grupo de dirigentes da Federação Maximalista fundava clandestinamente, em Lisboa, o Partido Comunista Português, sem estrutura orgânica consistente, nem base proletária de apoio, ainda sob forte influência anarco-sindicalista. Escola primária em Seia Três anos depois — já Estaline, com 45 anos, era secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética — Álvaro muda-se com a família para Lisboa, onde faz o Ensino Secundário, primeiro no Pedro Nunes, depois no Liceu Camões. Por influência da mãe, que já o levara a fazer a primeira comunhão, é educado no respeito pela Santa Madre Igreja. Torna-se frequentador assíduo da missa, confessando-se e comungando, num abraço de alma e coração à «verdade revelada». É impossível não estabelecer alguma relação entre essa entrega à religião católica e a fé inquebrantável no comunismo. Três anos depois — já Estaline, com 45 anos, era secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética — Álvaro muda-se com a família para Lisboa, onde faz o Ensino Secundário, primeiro no Pedro Nunes, depois no Liceu Camões. Por influência da mãe, que já o levara a fazer a primeira comunhão, é educado no respeito pela Santa Madre Igreja. Torna-se frequentador assíduo da missa, confessando-se e comungando, num abraço de alma e coração à «verdade revelada». É impossível não estabelecer alguma relação entre essa entrega à religião católica e a fé inquebrantável no comunismo. Liceu Pedro Nunes, em Lisboa A ditadura do Estado Novo irrompe quando Cunhal tem 12 anos. O Partido Comunista não tem praticamente influência nenhuma na sociedade portuguesa. Há-de ser ilegalizado um ano depois, em 1927, por ordem da ditadura militar. A família volta a aumentar, com o nascimento de outra rapariga, Maria Eugénia. Como anota Pacheco Pereira, no primeiro volume da sua magistral «biografia não autorizada», Álvaro era um aluno bastante irregular no liceu — bom a Português e a Filosofia e mediano nas restantes disciplinas, incluindo ironicamente Desenho, para que haveria de revelar mais tarde um imenso talento. A ditadura do Estado Novo irrompe quando Cunhal tem 12 anos. O Partido Comunista não tem praticamente influência nenhuma na sociedade portuguesa. Há-de ser ilegalizado um ano depois, em 1927, por ordem da ditadura militar. A família volta a aumentar, com o nascimento de outra rapariga, Maria Eugénia. Como anota Pacheco Pereira, no primeiro volume da sua magistral «biografia não autorizada», Álvaro era um aluno bastante irregular no liceu — bom a Português e a Filosofia e mediano nas restantes disciplinas, incluindo ironicamente Desenho, para que haveria de revelar mais tarde um imenso talento. Cunhal já estudante universitário. Em 1934 foi eleito representante dos estudantes de Lisboa no Senado Universitário O seu primeiro contacto com as ideias comunistas acontece ainda na adolescência, quando passa férias com os país em S. Pedro de Muel. Aí conhece o operário vidreiro da Marinha Grande Armando Magalhães (que, na década de 30, haveria de tornar-se um dos principais dirigentes do PCP), que lhe dá «volta ao miolo». O seu primeiro contacto com as ideias comunistas acontece ainda na adolescência, quando passa férias com os país em S. Pedro de Muel. Aí conhece o operário vidreiro da Marinha Grande Armando Magalhães (que, na década de 30, haveria de tornar-se um dos principais dirigentes do PCP), que lhe dá «volta ao miolo». Cunhal tinha quase 20 anos quando, vítima também da tuberculose, morre o seu irmão António José, dois anos mais velho — intelectual irreverente atraído pela vida boémia, a pintura e o cinema experimental. A agora única irmã, Maria Eugénia, que mais tarde haveria de se tornar redactora do «Avante!», forjou por isso com ele uma relação afectiva fortíssima, actuando durante muito tempo como retaguarda sentimental. A sua casa em Lisboa, na Rua Sousa Martins, a partir de certa altura permanentemente vigiada pela PIDE, foi durante várias décadas a única residência conhecida de Álvaro Cunhal. Aliciado por Cansado Gonçalves, um dos mais importantes dirigentes juvenis do PCP (alentejano de Cuba, aluno da Faculdade de Letras e dez anos mais velho do que ele), Álvaro Cunhal filiou-se no partido em 1934, com 20 anos de idade, adoptando o pseudónimo de «Daniel». Salazar assumira as rédeas do poder em Julho de 1932, ao ascender à chefia do Governo, dando novo impulso à ditadura, que ensaia a legalização através da «plebiscitada» Constituição de 1933, onde todas as abstenções foram contadas como votos a favor. É o ano em que os operários da Marinha Grande, seduzidos pelas ideias anarco-sindicalistas, ensaiam uma tentativa de tomada de poder, apossando-se da vila, elegendo um soviete e hasteando a bandeira vermelha, até serem esmagados pelo Exército. Aliciado por Cansado Gonçalves, um dos mais importantes dirigentes juvenis do PCP (alentejano de Cuba, aluno da Faculdade de Letras e dez anos mais velho do que ele), Álvaro Cunhal filiou-se no partido em 1934, com 20 anos de idade, adoptando o pseudónimo de «Daniel». Salazar assumira as rédeas do poder em Julho de 1932, ao ascender à chefia do Governo, dando novo impulso à ditadura, que ensaia a legalização através da «plebiscitada» Constituição de 1933, onde todas as abstenções foram contadas como votos a favor. É o ano em que os operários da Marinha Grande, seduzidos pelas ideias anarco-sindicalistas, ensaiam uma tentativa de tomada de poder, apossando-se da vila, elegendo um soviete e hasteando a bandeira vermelha, até serem esmagados pelo Exército. Cumprindo o serviço militar na Companhia Disciplinar de Penamacor, para onde fora enviado por motivos políticos, e quando passou à clandestinidade (em cima). Aquando da sua prisão, em 1949, e após a fuga de Peniche, em 1960 (em baixo) A aproximação ao PCP começara três anos antes, logo a seguir à entrada para a Faculdade de Direito de Lisboa. Para Cunhal, que se considera comunista desde os 17 anos, é essa a data que conta e não a da filiação efectiva. Não disse de imediato que sim ao recrutador. «Tenho primeiro que estudar os diferentes sistemas políticos, antes de me decidir» — sentenciou. Mas Cansado Gonçalves, já à espera da reacção, disparou a proposta inesperada que viria a revelar-se eficaz: «Trago-te um operário para te explicar». A missão foi confiada a um artista colchoeiro, que não teve dificuldades em convencer o jovem intelectual pequeno-burguês. Designado representante do partido na Liga dos Amigos da URSS e no Socorro Vermelho Internacional, antes mesmo de ser militante, rapidamente se viu impelido a estender a acção aos Grupos de Defesa Académica, que tentavam implantar-se no movimento estudantil. O resultado não foi inteiramente brilhante: chumbou no 1º ano da Faculdade, acabando por decidir mudar a matrícula de aluno efectivo para voluntário. A aproximação ao PCP começara três anos antes, logo a seguir à entrada para a Faculdade de Direito de Lisboa. Para Cunhal, que se considera comunista desde os 17 anos, é essa a data que conta e não a da filiação efectiva. Não disse de imediato que sim ao recrutador. «Tenho primeiro que estudar os diferentes sistemas políticos, antes de me decidir» — sentenciou. Mas Cansado Gonçalves, já à espera da reacção, disparou a proposta inesperada que viria a revelar-se eficaz: «Trago-te um operário para te explicar». A missão foi confiada a um artista colchoeiro, que não teve dificuldades em convencer o jovem intelectual pequeno-burguês. Designado representante do partido na Liga dos Amigos da URSS e no Socorro Vermelho Internacional, antes mesmo de ser militante, rapidamente se viu impelido a estender a acção aos Grupos de Defesa Académica, que tentavam implantar-se no movimento estudantil. O resultado não foi inteiramente brilhante: chumbou no 1º ano da Faculdade, acabando por decidir mudar a matrícula de aluno efectivo para voluntário. Fotografia de Vaz Saraiva Casa de Seia (já não existe) para onde a família Cunhal se mudou em 1916 Aos 20 anos é eleito pelos estudantes de Lisboa seu representante no Senado Universitário. E o partido rende-se às suas capacidades, aprovando a sua admissão e encarregando-o de imediato da tarefa de reorganizar — com Pável e Florindo de Oliveira — a Federação das Juventudes Comunistas (FJC) na margem Sul do Tejo. A sua vida de estudante mantém-se na aparência tranquila. Mas os dias são já divididos em duas metades: uma legal e outra semiclandestina. Arranja ainda tempo para um primeiro emprego, como recepcionista do Hotel Vitória, o edifício que, por ironia do destino, haveria de ser comprado a 25 de Abril pelo PCP, que ali pôs a funcionar o Centro de Trabalho que se tornou um dos seus mais importantes quartéis-generais. A «cunha» para o emprego foi metida por Ramos da Costa, amigo da família e militante do PCP, o mesmo homem que em Abril de 1973 haveria de subscrever com Mário Soares, em Bad-Munstereifel, a acta de fundação do Partido Socialista. Aos 20 anos é eleito pelos estudantes de Lisboa seu representante no Senado Universitário. E o partido rende-se às suas capacidades, aprovando a sua admissão e encarregando-o de imediato da tarefa de reorganizar — com Pável e Florindo de Oliveira — a Federação das Juventudes Comunistas (FJC) na margem Sul do Tejo. A sua vida de estudante mantém-se na aparência tranquila. Mas os dias são já divididos em duas metades: uma legal e outra semiclandestina. Arranja ainda tempo para um primeiro emprego, como recepcionista do Hotel Vitória, o edifício que, por ironia do destino, haveria de ser comprado a 25 de Abril pelo PCP, que ali pôs a funcionar o Centro de Trabalho que se tornou um dos seus mais importantes quartéis-generais. A «cunha» para o emprego foi metida por Ramos da Costa, amigo da família e militante do PCP, o mesmo homem que em Abril de 1973 haveria de subscrever com Mário Soares, em Bad-Munstereifel, a acta de fundação do Partido Socialista. Eleito secretário-geral da organização de juventude em Julho de 1935, com 21 anos de idade, desloca-se pela primeira vez a Moscovo, para participar no VII Congresso da Internacional Juvenil Comunista, o qual decorre em paralelo com o congresso propriamente dito, em que intervém o secretário-geral, Bento Gonçalves, que viaja acompanhado de dois dos mais importantes dirigentes do partido no interior de Portugal: José de Sousa e Júlio Fogaça. Eleito secretário-geral da organização de juventude em Julho de 1935, com 21 anos de idade, desloca-se pela primeira vez a Moscovo, para participar no VII Congresso da Internacional Juvenil Comunista, o qual decorre em paralelo com o congresso propriamente dito, em que intervém o secretário-geral, Bento Gonçalves, que viaja acompanhado de dois dos mais importantes dirigentes do partido no interior de Portugal: José de Sousa e Júlio Fogaça. Ideias e Debates Pires Jorge, que organizaria a fuga de Peniche Dirigidos por Estaline (que já iniciara a purga que acabou com a vida a milhares de opositores) e Dimitrov, os trabalhos duram cerca de um mês. Empolgados pelo clima de euforia que rodeou as reuniões, os portugueses decidem ficar até Novembro na capital soviética. Gonçalves, Sousa e Fogaça são os primeiros a regressar a Lisboa. Mas dias depois são presos na rua por um inacreditável descuido, ao serem reconhecidos e denunciados à polícia por um «bufo». Destino: o campo de concentração do Tarrafal, em Cabo Verde. Dirigidos por Estaline (que já iniciara a purga que acabou com a vida a milhares de opositores) e Dimitrov, os trabalhos duram cerca de um mês. Empolgados pelo clima de euforia que rodeou as reuniões, os portugueses decidem ficar até Novembro na capital soviética. Gonçalves, Sousa e Fogaça são os primeiros a regressar a Lisboa. Mas dias depois são presos na rua por um inacreditável descuido, ao serem reconhecidos e denunciados à polícia por um «bufo». Destino: o campo de concentração do Tarrafal, em Cabo Verde. Informados da tragédia que se abateu sobre a organização — o primeiro dos mais duros golpes desferidos contra o partido, que haveria de se ressentir dele até 1941 — Cunhal e os outros jovens decidiram atrasar o regresso, que só veio a acontecer em Março de 1936, rodeado de mil precauções. Quando chegam, fervilhando de ardor bolchevique, o lugar de secretário-geral está a ser desempenhado por Miguel Wagner Russel, um funcionário público que não domina o aparelho. Acusado de malbaratar os dinheiros do partido, Wagner é marginalizado numa operação montada por Pires Jorge, Manuel Rodrigues da Silva e Alberto Araújo, um jovem professor universitário que é escolhido para o substituir no cargo. Ideias e Debates Manuel Guedes Cunhal apoia a mudança e ascende pela primeira vez ao Comité Central. O facto de ter estado em Moscovo dá-lhe uma inesperada autoridade, aos olhos dos camaradas, que ele explora de forma admirável. Em pouco tempo torna-se uma das figuras mais influentes do partido, subindo rapidamente ao Secretariado, com Manuel Guedes (que se evadira do tribunal quando estava a ser julgado) e Pires Jorge. É uma direcção efémera: destroçada por novas prisões, é substituída por outra, que acaba por ser desmantelada também. Os métodos de trabalho clandestino no PCP ainda não tinham conseguido suplantar o aperfeiçoamento crescente do trabalho da polícia. Cunhal apoia a mudança e ascende pela primeira vez ao Comité Central. O facto de ter estado em Moscovo dá-lhe uma inesperada autoridade, aos olhos dos camaradas, que ele explora de forma admirável. Em pouco tempo torna-se uma das figuras mais influentes do partido, subindo rapidamente ao Secretariado, com Manuel Guedes (que se evadira do tribunal quando estava a ser julgado) e Pires Jorge. É uma direcção efémera: destroçada por novas prisões, é substituída por outra, que acaba por ser desmantelada também. Os métodos de trabalho clandestino no PCP ainda não tinham conseguido suplantar o aperfeiçoamento crescente do trabalho da polícia. Forçado pelas circunstâncias a passar à clandestinidade, Cunhal interrompe o curso e dedica-se por inteiro ao partido. Pouco depois, no início de Julho de 1936, é enviado à Espanha republicana, com uma missão algo misteriosa que envolve contactos com a Internacional Comunista, para preparar o regresso a Portugal de Pável, o dirigente exilado há já algum tempo em Moscovo. Cunhal Logo após a sua entrada em Madrid é surpreendido pela eclosão da Guerra Civil, de que haveria de se tornar testemunha directa e privilegiada, acompanhando durante cinco meses os ataques franquistas e a resistência republicana. Uma das suas missões, ao transpor a fronteira, era pedir ajuda ao Partido Comunista Espanhol para a libertação de Pires Jorge e Manuel Guedes, que tinham sido presos em Cáceres. Mas acabou por se alistar nas Milícias Populares e alinhar no combate antifranquista, participando activamente no serviço de macas e no apoio aos hospitais de campanha. Logo após a sua entrada em Madrid é surpreendido pela eclosão da Guerra Civil, de que haveria de se tornar testemunha directa e privilegiada, acompanhando durante cinco meses os ataques franquistas e a resistência republicana. Uma das suas missões, ao transpor a fronteira, era pedir ajuda ao Partido Comunista Espanhol para a libertação de Pires Jorge e Manuel Guedes, que tinham sido presos em Cáceres. Mas acabou por se alistar nas Milícias Populares e alinhar no combate antifranquista, participando activamente no serviço de macas e no apoio aos hospitais de campanha. Em Junho de 1937, ao regressar de Espanha, é preso pela primeira vez, ao cair numa cilada montada pela polícia política, que manda um falso operário marcar com ele um encontro. O agente da PVDE que o prende é José Gonçalves, um ex-padeiro anarco-sindicalista que se passou para a polícia e que, 24 anos mais tarde, em 1961, haveria de chefiar a brigada que assassinou o pintor Dias Coelho. De início vai para o Aljube, mas acaba transferido para Peniche. Submetido a intensa tortura, não só não denuncia ninguém como assume a ousadia de provocar os pides que queriam saber da sua morada, atirando para cima da mesa um molho de chaves, dizendo: «Procurem pelas fechaduras de Lisboa, que talvez encontrem...» Cunhal com Dias Lourenço num barco no Tejo, nos anos 40 Um ano depois é libertado, com a condição de cumprir o serviço militar na Companhia Disciplinar de Penamacor. Partilha o castigo com uma outra figura que haveria de ganhar grande notoriedade na memória colectiva do PCP: Alfredo Dinis (Alex). Debilitado, em Dezembro de 1939 acaba por ser dispensado por uma junta médica militar e regressa à actividade clandestina. É quando cria os desenhos que ilustram a primeira edição de «Esteiros», de Soeiro Pereira Gomes, a «jóia da coroa» do neo-realismo. Um ano depois é libertado, com a condição de cumprir o serviço militar na Companhia Disciplinar de Penamacor. Partilha o castigo com uma outra figura que haveria de ganhar grande notoriedade na memória colectiva do PCP: Alfredo Dinis (Alex). Debilitado, em Dezembro de 1939 acaba por ser dispensado por uma junta médica militar e regressa à actividade clandestina. É quando cria os desenhos que ilustram a primeira edição de «Esteiros», de Soeiro Pereira Gomes, a «jóia da coroa» do neo-realismo. Muitos militantes sofreram longas penas de prisão e torturas. Os órgãos do partido denunciavam-nas e preparam os comunistas para os sofrimentos futuros O partido vive a sua pior crise de sempre. Dois outros importantes dirigentes (Francisco Miguel e Alberto Araújo) tinham sido presos e o Secretariado estava entregue a aventureiros, politicamente inexperientes e muito inábeis. Sucedem-se as infiltrações de provocadores no aparelho clandestino e fervilham as intrigas. E a Internacional Comunista corta relações com o PCP, por a direcção não lhe merecer confiança. O partido vive a sua pior crise de sempre. Dois outros importantes dirigentes (Francisco Miguel e Alberto Araújo) tinham sido presos e o Secretariado estava entregue a aventureiros, politicamente inexperientes e muito inábeis. Sucedem-se as infiltrações de provocadores no aparelho clandestino e fervilham as intrigas. E a Internacional Comunista corta relações com o PCP, por a direcção não lhe merecer confiança. Preso pela segunda vez em Maio de 1940, Cunhal acaba por fazer o exame final da licenciatura em Direito, iniciada nove anos antes, sob escolta policial. O júri escolhido para avaliar a tese — um ensaio de 100 páginas sobre «A Realidade Social do Aborto» —, é composto por Marcello Caetano, Cavaleiro Ferreira e Paulo Cunha, três figuras gradas do salazarismo, que não hesitam em atribuir-lhe 16 valores. Concluído o exame, regressa à prisão por mais um ano. Panfletos e livros reclamando a libertação do líder do PCP e dos presos políticos. De destacar as intervenções de Jorge Amado e Pablo Neruda É uma época penosa para os comunistas em todo o mundo. O Pacto Germano-Soviético, assinado por Estaline e Hitler em 1939, causa forte perturbação no aparelho clandestino, confrontado com a necessidade de explicar o inexplicável. Cunhal entra na liça e escreve para o semanário «O Diabo» — dominado pelos comunistas, sob direcção fictícia de Manuel de Campos Lima e controlo efectivo de Cansado Gonçalves — um artigo intitulado «Nem Maginot, nem Siegfried», subscrevendo a tese estalinista. Salazar manda encerrar o jornal e ordena à PIDE que esteja atenta aos intelectuais que nele colaboravam, rol que inclui Soeiro Pereira Gomes, Alves Redol, Manuel da Fonseca, Piteira Santos, Mário Dionísio, Cândida Ventura e Dias Lourenço. É uma época penosa para os comunistas em todo o mundo. O Pacto Germano-Soviético, assinado por Estaline e Hitler em 1939, causa forte perturbação no aparelho clandestino, confrontado com a necessidade de explicar o inexplicável. Cunhal entra na liça e escreve para o semanário «O Diabo» — dominado pelos comunistas, sob direcção fictícia de Manuel de Campos Lima e controlo efectivo de Cansado Gonçalves — um artigo intitulado «Nem Maginot, nem Siegfried», subscrevendo a tese estalinista. Salazar manda encerrar o jornal e ordena à PIDE que esteja atenta aos intelectuais que nele colaboravam, rol que inclui Soeiro Pereira Gomes, Alves Redol, Manuel da Fonseca, Piteira Santos, Mário Dionísio, Cândida Ventura e Dias Lourenço. Hitler haveria de não respeitar o acordo e em 1941 avança contra a URSS, obrigando Estaline a mudar de atitude e a aproximar-se dos Aliados. Cunhal muda com ele. E chega a reconhecer o carácter nacional do fascismo, ao defender que, em caso de invasão de Portugal, os comunistas deveria lutar ao lado do exército salazarista contra o agressor nazi. No início da década de 40, a desorganização do partido é impressionante. A actividade está paralisada quase por completo, em resultado de traições e denúncias umas atrás das outras. Nos últimos cinco anos, a polícia política fizera tantas detenções que o Comité Central teve de ser refeito oito vezes. É a grande oportunidade de Cunhal — o jovem doutor de olhar penetrante e vontade férrea, prestes a ser libertado — para revelar as suas extraordinárias capacidades. O papel que irá desempenhar na reorganização do partido será de importância decisiva. No início da década de 40, a desorganização do partido é impressionante. A actividade está paralisada quase por completo, em resultado de traições e denúncias umas atrás das outras. Nos últimos cinco anos, a polícia política fizera tantas detenções que o Comité Central teve de ser refeito oito vezes. É a grande oportunidade de Cunhal — o jovem doutor de olhar penetrante e vontade férrea, prestes a ser libertado — para revelar as suas extraordinárias capacidades. O papel que irá desempenhar na reorganização do partido será de importância decisiva. Ao sair da prisão é contratado por João Soares, pai de Mário Soares, que nutre grande admiração pela sua combatividade, como regente de estudos do Colégio Moderno — uma espécie de prefeito. Ia ao fim da tarde complementar as aulas com «salas de estudo», dedicadas essencialmente aos trabalhos de casa. Um dos alunos que mais acompanha na altura é Mário Soares, então a terminar o 7º ano, em quem desperta o interesse pela literatura neo-realista e conduz em visitas guiadas a exposições. Convence-o mesmo a trocar a Faculdade de Direito, «infestada de reaccionários», pela Faculdade de Letras e a matricular-se em Histórico-Filosóficas, numa operação de aliciamento que culmina com a sua filiação nas Juventudes Comunistas. Muitos anos depois, no célebre «Portugal Amordaçado», escrito no exílio de Paris, Mário Soares inscreverá o seu nome na lista dos três homens que mais contribuíram para a sua formação política, ao lado de Agostinho da Silva e Álvaro Salema. Em Dezembro de 1940 regressa de novo à clandestinidade e é encarregado pela direcção do partido de pôr ordem na estrutura partidária do Norte. É o período mais confuso e conturbado da vida do PCP e aquele acerca do qual persistem mais dúvidas, só parcialmente desfeitas pelo esforçado trabalho de investigação de Pacheco Pereira. Em Dezembro de 1940 regressa de novo à clandestinidade e é encarregado pela direcção do partido de pôr ordem na estrutura partidária do Norte. É o período mais confuso e conturbado da vida do PCP e aquele acerca do qual persistem mais dúvidas, só parcialmente desfeitas pelo esforçado trabalho de investigação de Pacheco Pereira. O PCP está dividido entre «organizados» e «reorganizados», com duas direcção partidárias que disputam o controlo da organização e a influência sobre a classe operária. Os «organizados», dirigidos por Cansado Gonçalves, Velez Grilo e Vasco de Carvalho, pugnam por uma actuação mais moderada, tentando segurar a continuidade. Têm por referência Militão Ribeiro, que só sairá do Tarrafal em 1945. Álvaro Cunhal numa fotografia de polícia tirada pela PIDE A reorganização é liderada por Júlio Fogaça, que ao abrigo da «Amnistia dos Centenários» (decretada em 1940 para celebrar a independência de 1143 e sua restauração em 1640), fora libertado do Tarrafal. Quer um PCP mais firme e consequente e conquista para as suas posições outros destacados militantes (Sérgio Vilarigues, Pedro Soares, Américo de Sousa e Pires Jorge), libertados do Tarrafal ou de Angra. Juntam-se a eles José Gregório, Cândida Ventura e Piteira Santos; alguns dos que já tinham cumprido pena, como Cunhal e Manuel Guedes; e novos militantes operários que se tinham destacado nas organizações locais, como Dias Lourenço. A reorganização é liderada por Júlio Fogaça, que ao abrigo da «Amnistia dos Centenários» (decretada em 1940 para celebrar a independência de 1143 e sua restauração em 1640), fora libertado do Tarrafal. Quer um PCP mais firme e consequente e conquista para as suas posições outros destacados militantes (Sérgio Vilarigues, Pedro Soares, Américo de Sousa e Pires Jorge), libertados do Tarrafal ou de Angra. Juntam-se a eles José Gregório, Cândida Ventura e Piteira Santos; alguns dos que já tinham cumprido pena, como Cunhal e Manuel Guedes; e novos militantes operários que se tinham destacado nas organizações locais, como Dias Lourenço. A cisão torna-se violenta e cada uma das direcções publica o seu «Avante!». O grupo do agora «pequeno-burgês» Cansado Gonçalves chega ao ponto de acusar Cunhal e Fogaça, no jornal que controlam, de chefiar uma «quadrilha de gangsters». Mas a força está do outro lado: os opositores desarticulam-se, Cunhal e Fogaça vencem e o partido fica reunificado. A cisão torna-se violenta e cada uma das direcções publica o seu «Avante!». O grupo do agora «pequeno-burgês» Cansado Gonçalves chega ao ponto de acusar Cunhal e Fogaça, no jornal que controlam, de chefiar uma «quadrilha de gangsters». Mas a força está do outro lado: os opositores desarticulam-se, Cunhal e Fogaça vencem e o partido fica reunificado. A linha é agora leninista pura e dura: direcção colectiva, disciplina firme, vigor conspirativo e um corpo de militantes profissionais que se alarga progressivamente. Apesar dos ataques da polícia política continuarem — prendendo Fogaça, Pedro Soares e Pires Jorge — o aparelho clandestino ganha estabilidade. Em Novembro de 1942, após a prisão de Fogaça, devolvido ao Tarrafal (onde Bento Gonçalves, o secretário-geral morrera pouco antes), Cunhal, que partilhava o Secretariado com Manuel Guedes e José Gregório, ganha maior peso no Comité Central. O informe que apresenta ao Congresso de 1944 (III da série, I ilegal) é ainda dedicado à «Actividade do Grupelho Provocatório». No III Congresso, Cunhal ainda se ocupa da «actividade do grupelho provocatório» A polícia política continua a fazer estragos e em 1945 desmantela seis casas clandestinas e prende 16 dirigentes. Mas o partido reage. Explorando habilmente os sentimentos de revolta provocados pela fome e a degradação social originadas pela guerra na Europa, o PCP atinge em 1946 o número recorde de 4 mil militantes. É um das melhores fases da vida na clandestinidade. O artífice da proeza é Cunhal, que sai do IV Congresso, realizado na Lousã em 1946, como líder confiante e mentor ideológico. São dele as orientações sobre a criação das células de empresa, uma iniciativa que irá revelar-se de grande alcance. A polícia política continua a fazer estragos e em 1945 desmantela seis casas clandestinas e prende 16 dirigentes. Mas o partido reage. Explorando habilmente os sentimentos de revolta provocados pela fome e a degradação social originadas pela guerra na Europa, o PCP atinge em 1946 o número recorde de 4 mil militantes. É um das melhores fases da vida na clandestinidade. O artífice da proeza é Cunhal, que sai do IV Congresso, realizado na Lousã em 1946, como líder confiante e mentor ideológico. São dele as orientações sobre a criação das células de empresa, uma iniciativa que irá revelar-se de grande alcance. No IV Congresso, realizado na Lousã em 1946, o líder vai determinar todo o comportamento dos comunistas até ao 25 de Abril de 1974 No seu relatório ao Congresso da Lousã, «O Caminho para o Derrubamento do Fascismo», Cunhal há-de determinar em grande parte todo o comportamento dos comunistas até ao 25 de Abril. Ali se apela a um «levantamento nacional antifascista», que deverá contar com «todos os portugueses honrados», rejeitando as tendências legalistas da burguesia liberal e a plataforma de «transição» proposta pela Organização Comunista dos Presos do Tarrafal, bem como as tendências terroristas surgidas no partido após as greves de 1943. No seu relatório ao Congresso da Lousã, «O Caminho para o Derrubamento do Fascismo», Cunhal há-de determinar em grande parte todo o comportamento dos comunistas até ao 25 de Abril. Ali se apela a um «levantamento nacional antifascista», que deverá contar com «todos os portugueses honrados», rejeitando as tendências legalistas da burguesia liberal e a plataforma de «transição» proposta pela Organização Comunista dos Presos do Tarrafal, bem como as tendências terroristas surgidas no partido após as greves de 1943. Para consolidar a posição de liderança, Cunhal teve de afastar do caminho Júlio Fogaça e Pável, os dois únicos dirigentes do partido com capacidade para teorizar sobre questões políticas importantes e que intelectualmente lhe podiam fazer frente. A forma como se livrou de Pável, liquidado politicamente no exílio, após uma fuga do Aljube, ainda hoje está mal esclarecida. Acabou a leccionar no México, onde foi grande amigo do Prémio Nobel Octávio Paz. E a eliminação de Fogaça é ainda mais sinistra, envolvendo acusações de homossexualidade, expulsão, readmissão e nova expulsão. Não há quem o detenha. Em 1947, já Estaline iniciara a Guerra Fria com o Ocidente, confia a si próprio a missão de estreitar relações com o movimento comunista internacional. E desloca-se à URSS, à Checoslováquia e à Jugoslávia. É durante os longos anos de prisão em Peniche que Cunhal exercita os seus talentos para o desenho e a pintura Na madrugada de 25 de Março de 1949, Cunhal é preso pela terceira vez — juntamente com Militão Ribeiro, Sofia Ferreira, José Martins e António Lopes Bastos — numa casa clandestina do Casal de Santo António, no Luso. Convencida de que o denunciante tinha sido Manuel Domingues, um operário vidreiro da Marinha Grande que era membro do «bureau» político do Comité Central, a direcção do PCP manda assassiná-lo dois anos depois. O episódio ocorreu numa época em que o aparelho clandestino estava instalado em pequenas aldeias da província, o que veio a revelar-se um erro clamoroso. As movimentações dos que iam e vinham constantemente «visitar o primo tuberculoso» eram mais facilmente detectáveis ali do que nas grandes cidades. O partido acabou por reconhecer internamente ter-se tratado de um erro, mas nunca até hoje o assumiu publicamente. Afinal, Cunhal tinha sido denunciado pelo presidente da Câmara de Águeda, José Feio, que residia no Luso e comunicou a presença dos estranhos a Manuel Louzada, que acumulava as funções de presidente da Câmara da Mealhada com as de informador da PIDE. Cercada pela GNR, a residência foi assaltada pela PIDE que apanhou Cunhal a dormir, algemando-o ainda de pijama, e deitou a mão a um importantíssimo arquivo, desferindo um dos mais rudes golpes sofridos pela organização comunista, que não voltaria a ser a mesma. Na madrugada de 25 de Março de 1949, Cunhal é preso pela terceira vez — juntamente com Militão Ribeiro, Sofia Ferreira, José Martins e António Lopes Bastos — numa casa clandestina do Casal de Santo António, no Luso. Convencida de que o denunciante tinha sido Manuel Domingues, um operário vidreiro da Marinha Grande que era membro do «bureau» político do Comité Central, a direcção do PCP manda assassiná-lo dois anos depois. O episódio ocorreu numa época em que o aparelho clandestino estava instalado em pequenas aldeias da província, o que veio a revelar-se um erro clamoroso. As movimentações dos que iam e vinham constantemente «visitar o primo tuberculoso» eram mais facilmente detectáveis ali do que nas grandes cidades. O partido acabou por reconhecer internamente ter-se tratado de um erro, mas nunca até hoje o assumiu publicamente. Afinal, Cunhal tinha sido denunciado pelo presidente da Câmara de Águeda, José Feio, que residia no Luso e comunicou a presença dos estranhos a Manuel Louzada, que acumulava as funções de presidente da Câmara da Mealhada com as de informador da PIDE. Cercada pela GNR, a residência foi assaltada pela PIDE que apanhou Cunhal a dormir, algemando-o ainda de pijama, e deitou a mão a um importantíssimo arquivo, desferindo um dos mais rudes golpes sofridos pela organização comunista, que não voltaria a ser a mesma. «Desenhos da Prisão», Álvaro Cunhal O assassinato de Manuel Domingues, que tinha participado no 18 de Janeiro de 1934 e se tornara uma referência mítica do PCP, é ainda hoje assunto tabu, motivo de embaraços para os comunistas. O operário vidreiro — que estivera em Espanha, nas Brigadas Internacionais, passa pela resistência francesa e controla homens como Mário Soares, Salgado Zenha e Piteira Santos — era, afinal, um homem sério e um comunista puro. A prova só foi tirada na devassava aos arquivos da PIDE, tomados de assalto pelo PCP logo a seguir ao 25 de Abril. Aí se explica a injustiça do crime e se demonstra que a forma como Cunhal fora descoberto se deveu apenas à ingenuidade organizativa. O assassinato de Manuel Domingues, que tinha participado no 18 de Janeiro de 1934 e se tornara uma referência mítica do PCP, é ainda hoje assunto tabu, motivo de embaraços para os comunistas. O operário vidreiro — que estivera em Espanha, nas Brigadas Internacionais, passa pela resistência francesa e controla homens como Mário Soares, Salgado Zenha e Piteira Santos — era, afinal, um homem sério e um comunista puro. A prova só foi tirada na devassava aos arquivos da PIDE, tomados de assalto pelo PCP logo a seguir ao 25 de Abril. Aí se explica a injustiça do crime e se demonstra que a forma como Cunhal fora descoberto se deveu apenas à ingenuidade organizativa. Com o general Humberto Delgado, em Paris Disposta a ajustar contas, a polícia política endurece o tratamento dispensado ao mais perigoso dirigente comunista. Cunhal é mantido em regime de «isolamento absoluto», numa cela entre duas outras vazias, para não poder contactar ninguém, vigiado dia e noite por agentes da PIDE. Apesar de incomunicável durante 14 meses, não denuncia camaradas, recusando-se a falar o que quer que fosse. A pujança dos seus 35 anos e a fibra do seu carácter, endurecidos por nove anos de clandestinidade, determinam o comportamento. Os polícias ficam mais irritados ainda e recusam-se até a cumprir a ordem do director da prisão para que lhe fosse entregue «material de escrita». Disposta a ajustar contas, a polícia política endurece o tratamento dispensado ao mais perigoso dirigente comunista. Cunhal é mantido em regime de «isolamento absoluto», numa cela entre duas outras vazias, para não poder contactar ninguém, vigiado dia e noite por agentes da PIDE. Apesar de incomunicável durante 14 meses, não denuncia camaradas, recusando-se a falar o que quer que fosse. A pujança dos seus 35 anos e a fibra do seu carácter, endurecidos por nove anos de clandestinidade, determinam o comportamento. Os polícias ficam mais irritados ainda e recusam-se até a cumprir a ordem do director da prisão para que lhe fosse entregue «material de escrita». O seu julgamento, que decorre entre os dias 3 e 10 de Maio de 1950 no Tribunal Plenário de Lisboa, ficará como referência para a história da resistência, e contribuirá decisivamente para adensar a lenda: assumindo a condição de comunista e «filho adoptivo do proletariado», Cunhal profere no tribunal plenário um ataque cerrado à ditadura salazarista e à polícia política, exaltando o papel e a orientação política do partido. O advogado de defesa é o pai, Avelino Cunhal. Condenado quando já estava preso há mais de um ano, passa mais dez anos na prisão, em condições de extrema dureza: quase sete anos em total isolamento e mais de um ano incomunicável. O objectivo era fazê-lo ceder, mas a estratégia não resulta. Cunhal não só não denuncia uma vez mais os camaradas, como assume longos períodos de total silêncio. É nesse tormentoso tempo de solidão que exercita o gosto pelo desenho, produzindo obras notáveis, com o povo por herói. Numa operação extremamente bem montada pelo aparelho clandestino, que começa a ganhar fama de «máquina perfeita», irrompe subitamente a nível internacional um movimento de solidariedade, reclamando a sua libertação. É encabeçado por figuras tão prestigiadas quanto Jorge Amado e Pablo Neruda, o futuro Prémio Nobel chileno, que lhe dedica mesmo um poema: «Lámpara Marina». Inicialmente, Cunhal é mantido na Penitenciária de Lisboa, mas ao fim de oito anos, por razões de segurança, é transferido para a prisão de Peniche, considerada fortaleza inexpugnável. Tanto melhor para o partido. Com a ajuda preciosa de um guarda da GNR subornado, a 3 de Janeiro de 1960 protagoniza a mais espectacular fuga de toda a ditadura, escalando os muros do forte na companhia de nove destacados dirigentes do partido. Com Palma Carlos, de quem foi ministro sem pasta, no I Governo Provisório, a seguir ao 25 de Abril A fuga é planeada por Pires Jorge, que se encontrava em liberdade, e preparada ao pormenor. Na tarde da evasão, um carro — que deveria ter sido conduzido pelo actor Rogério Paulo, que à última hora se retraiu — parou num largo de Peniche, visível do interior da cadeia, e o condutor abriu o porta-bagagens, observando durante longos segundos o seu interior. Era o sinal. Transportados em dois carros até ao cruzamento do Baleal, os foragidos dividiram-se em dois grupos. Cunhal tomou lugar no Studbaker conduzido por Rui Perdigão, que, graças às suas origens burguesas, o tinha comprado às próprias custas, e dirigiu-se a Lisboa. Não sem antes Pires Jorge ter posto «ordem na casa» e obrigado Cunhal a respeitar o destino escolhido com um estrondoso: «Quem manda aqui sou eu!». Só uma hora depois soa o alarme no Forte de Peniche e a caça ao homem começa. Sem sucesso. Com a fuga, Álvaro Cunhal ganha o estatuto de líder absoluto, indiscutível, lendário. A fuga é planeada por Pires Jorge, que se encontrava em liberdade, e preparada ao pormenor. Na tarde da evasão, um carro — que deveria ter sido conduzido pelo actor Rogério Paulo, que à última hora se retraiu — parou num largo de Peniche, visível do interior da cadeia, e o condutor abriu o porta-bagagens, observando durante longos segundos o seu interior. Era o sinal. Transportados em dois carros até ao cruzamento do Baleal, os foragidos dividiram-se em dois grupos. Cunhal tomou lugar no Studbaker conduzido por Rui Perdigão, que, graças às suas origens burguesas, o tinha comprado às próprias custas, e dirigiu-se a Lisboa. Não sem antes Pires Jorge ter posto «ordem na casa» e obrigado Cunhal a respeitar o destino escolhido com um estrondoso: «Quem manda aqui sou eu!». Só uma hora depois soa o alarme no Forte de Peniche e a caça ao homem começa. Sem sucesso. Com a fuga, Álvaro Cunhal ganha o estatuto de líder absoluto, indiscutível, lendário. Obrigado a passar à clandestinidade, em resultado da sua participação na fuga, Rui Perdigão é colocado na Rádio Portugal Livre, que emite a partir de Bucareste, na Roménia, sob controlo directo de Cunhal, aí exilado. Dessa redacção fazem parte Carlos Antunes (futuro dirigente do PRP/BR) e Isaura Moreira, companheira de Cunhal. Os relatos do filho de Rui Perdigão, que passa a ir à escola em Bucareste, sobre as condições de vida dos seus colegas, são o «clic» que desperta a consciência do funcionário do PCP para o lado escondido do «socialismo real» e o leva, mais tarde, a abandonar a militância. «Olhe que não, olhe que não!» Uma frase que entrou na história proferida durante o debate televisivo com Mário Soares em 1975 Em Peniche, Cunhal exercitara pela primeira vez os seus talentos no campo da pintura a óleo. José Carlos de Vasconcelos conta na terceira pessoa, na entrada de uma entrevista publicada em 1997, uma confidência de Cunhal a esse propósito: «Uma vez deixaram entrar na cadeia tintas e uma tábua, relativamente grande. Foi a primeira vez que pintou a óleo — e até pintou a tábua... dos dois lados! Quando, com outros camaradas, conseguiu realizar a famosa fuga do velho e (então) sinistro forte, a tábua, claro, ficou lá. Mas após o 25 de Abril foi encontrada numa arrecadação pelos militares que o ocuparam, e um dia, ainda em 1974, era ministro sem pasta, foram a S. Bento entregar-lha». Em Peniche, Cunhal exercitara pela primeira vez os seus talentos no campo da pintura a óleo. José Carlos de Vasconcelos conta na terceira pessoa, na entrada de uma entrevista publicada em 1997, uma confidência de Cunhal a esse propósito: «Uma vez deixaram entrar na cadeia tintas e uma tábua, relativamente grande. Foi a primeira vez que pintou a óleo — e até pintou a tábua... dos dois lados! Quando, com outros camaradas, conseguiu realizar a famosa fuga do velho e (então) sinistro forte, a tábua, claro, ficou lá. Mas após o 25 de Abril foi encontrada numa arrecadação pelos militares que o ocuparam, e um dia, ainda em 1974, era ministro sem pasta, foram a S. Bento entregar-lha». Na primeira grande reunião do Comité Central em que participa depois da fuga, em Fevereiro, é chamado de novo ao Secretariado. Passa os primeiros dois anos em Portugal, na mais prudente clandestinidade, trocando constantemente de casa e de terra: Sintra, Ericeira, Amadora, Coimbra, Porto. Depois de exercer o seu direito de voto nas eleições presidenciais de Janeiro de 2001 Em meados de 1960, radica-se em Paris. No dia de Natal desse ano é pai pela primeira e única vez, apesar de ter permanecido, à semelhança de Salazar, solteiro a vida toda. Tinha 47 anos. Ana, a menina, é filha de Isaura Maria Moreira, a camarada por quem Cunhal se apaixonou a seguir à fuga de Peniche (uma mulher bonita, de origem operária), mas com quem nunca chegou a casar. A circunstância desconcertante de Cunhal se ter apaixonado pela irmã de Isaura, com quem passou a viver, determinou que assim fosse. Os encontros e desencontros amorosos eram, de resto, uma característica do universo concentracionário da clandestinidade. Em meados de 1960, radica-se em Paris. No dia de Natal desse ano é pai pela primeira e única vez, apesar de ter permanecido, à semelhança de Salazar, solteiro a vida toda. Tinha 47 anos. Ana, a menina, é filha de Isaura Maria Moreira, a camarada por quem Cunhal se apaixonou a seguir à fuga de Peniche (uma mulher bonita, de origem operária), mas com quem nunca chegou a casar. A circunstância desconcertante de Cunhal se ter apaixonado pela irmã de Isaura, com quem passou a viver, determinou que assim fosse. Os encontros e desencontros amorosos eram, de resto, uma característica do universo concentracionário da clandestinidade. Em Março de 1961 é eleito secretário-geral do PCP. A decisão tem uma importância absolutamente extraordinária, já que o cargo se encontrava vago há 19 anos, desde a morte de Bento Gonçalves no campo de concentração do Tarrafal. No ano seguinte é enviado para Moscovo, por razões de segurança. De acordo com a biografia oficial, permanece quatro anos seguidos na capital soviética, acolhido como herói, deslocando-se de quando em vez à Roménia, onde Isaura Moreira vive com a filha. A verdade, porém, é outra. A residência permanente de Cunhal é Paris, já que o isolamento e a limitação às liberdades no países de Leste não lhe permitia dirigia a partir daí o partido. A circunstância desse «pormenor» ser difícil de explicar, faz com que se tenha alterado a verdade. Na capital francesa é testemunha directa do Maio de 68. Usa boina basca e diz chamar-se António de Sousa. É em Paris que se encontra ainda a 25 de Abril de 1974. Cumpridos doze anos de exílio, regressa a Portugal a 30 de Abril de 1974 e a 15 de Maio toma posse como ministro sem pasta do I Governo Provisório, presidido pelo advogado Adelino da Palma Carlos, seu antigo professor de Direito, discretamente escolhido pela Maçonaria, representada pelo Grande Oriente Lusitano. Mário Soares, com a intenção de o envolver ainda mais numa situação que se adivinhava difícil e o impedir, dessa forma, de capitalizar politicamente o descontentamento à esquerda, ainda o tenta levar a assumir, com a cumplicidade de Spínola, a pasta de ministro do Trabalho. Mas ele recusa. O PCP está mais forte do que nunca, saído da clandestinidade com mais de dez mil militantes inscritos, um sector intelectual poderosíssimo e influência em múltiplas áreas da sociedade. Os anos de 1972-73 tinham sido a sua época de ouro, crescendo graças à deterioração da situação social e política do país, à abertura e ao descrédito da «primavera Marcelista» e à correlação de forças no plano internacional. O Congresso da Oposição, em Aveiro, tinha fortalecido a sua base social de apoio. E o partido tinha dado um apoio estimável ao Movimento dos Capitães. Embora não tenha aderido oficialmente à preparação do golpe militar, foi o PCP — através do actual presidente da Câmara de Évora, Abílio Fernandes, e de Lino de Carvalho, hoje deputado — que arranjou o local onde a 9 de Setembro de 1973 se realizou a histórica reunião do MFA: o Monte Sobral, em Alcáçovas. Exonerado a 11 de Julho de 1974, na sequência da demissão de Palma Carlos, Cunhal regressa ao Governo seis dias depois, para as mesmas funções, a convite do novo primeiro-ministro Vasco Gonçalves, o general comunista que nunca se chegou a filiar no PCP. Mantém-se como ministro em mais dois governos — o III e o IV provisórios — abandonando definitivamente funções em Agosto de 1975, quando o Verão revolucionário começa a «aquecer». É a época em que sonha, mais intensamente do que nunca, estimulado pelo 11 de Março, com uma nova revolução que aproxime Portugal dos modelos socialistas de Leste. Eleito deputado logo em 1975, quando é formada a Assembleia Constituinte, mantém o lugar até 1991, embora dedique muito pouco tempo e atenção à vida parlamentar. A democracia representativa não lhe interessa. Prefere a democracia directa controlada pelo aparelho partidário, a via sindical, a agitação de rua. Numa célebre entrevista a Oriana Fallacci, concedida no Verão de todos os desassossegos, chega a «garantir» que o parlamentarismo não vingará em Portugal. Mas engana-se. «Olhe que não, sotôr, olhe que não». A resposta nervosa a Mário Soares, que o acusa de querer «transformar o país numa ditadura», demarca com uma nitidez nunca antes percebida a existência de dois campos na esquerda. É o grande frente-a-frente, o primeiro debate televisivo a sério da jovem democracia portuguesa. A emissão faz parar o país, como se da final de um campeonato do Mundo de futebol envolvendo a selecção nacional se tratasse, a 6 de Novembro de 1975. Aproxima-se o momento decisivo da viragem política de Portugal. O homem que já tinha admitido viver bem com o salário mínimo nacional, numa manifestação ingénua de ortodoxia e estalinismo, está prestes a ser derrotado. Perde o debate com Mário Soares e deixa crescer a ideia de que os comunistas são uns indivíduos dispostos a bater-se por causas inexplicáveis, comandadas do exterior, sem ligação concreta à realidade. A piada da «cassette» ganha a dimensão do ridículo. Aproximam-se tempos fatais para as ambições de poder do líder comunista. O fracasso da tentativa de golpe lançado pelo PCP e pela esquerda militar em 25 de Novembro de 1975, muda definitivamente o rumo à História, impondo a Álvaro Cunhal a maior derrota de sempre, da qual o PCP não se recomporá nunca. Empurrado pelo «Grupo dos Nove», o contragolpe sai vitorioso. O líder comunista percebe isso de imediato e ordena, na madrugada de 25 para 26 de Novembro, a retirada de todos os militantes das manifestações de massas. O gesto poderá não ter sido decisivo, como pretendem alguns comunistas, para evitar a guerra civil, mas deu um contributo significativo à inviabilização de uma ameaça que chegou a estar iminente. À medida que a democracia se consolida, as contradições internas agudizam-se no PCP. Mas Cunhal está atento aos desvios. Em Abril de 1987 começa a reunir clandestinamente com Vital Moreira e Veiga de Oliveira, os rostos visíveis do «Grupo dos Seis», que reclamam a abertura do partido, ainda apegado ao programa da clandestinidade. As discussões prolongam-se por mais de meio ano, mas são sacudidas a meio pelas eleições de Julho, em que Cavaco Silva conquista a primeira maioria absoluta. Os contestatários ganham novos argumentos, mas o velho dirigente resiste. No sentido de desmantelar a contestação, transforma as reuniões do Comité Central preparatórias do XII Congresso, agendado para o final do ano, em sessões de clarificação interna, apostadas em identificar os apoiantes dos «renegados». Consegue controlar a situação e afastar os «inimigos internos». Aos 75 anos o coração começa a dar sinais de preocupação. Em Janeiro de 1989, em plena «Perestroika», acaba por ceder à pressão dos médicos e deixa-se internar numa clínica de Moscovo, para ser submetido a uma intervenção cirúrgica cardiovascular. Passa cinco meses em recuperação, regressando a Portugal em Junho. Em 1992, afasta-se formalmente do cargo de secretário-geral do PCP, cedendo o lugar a Carlos Carvalhas, e passa a figurar na estrutura do «bureau» político como Presidente do Conselho Nacional do PCP — organismo e função nunca antes existentes e que tiveram vidas efémeras, por não possuírem funcionalidade interna. Renuncia, na altura, também, ao Conselho de Estado, para onde fora nomeado dez anos antes. Baralhando os observadores mais mal informados, dá para o exterior a ideia de que começa uma nova etapa da sua vida, dedicada sobretudo à escrita, mas tudo não passa de encenação. Descontado o facto de ter aumentado o ordenado aos funcionários, que só na década de 90 deixaram de estar sujeitos ao salário mínimo nacional, Carvalhas não se afirma, nem ganha autoridade. Cunhal continua a ser a figura tutelar e de referência ideológica e política do PCP, como deixou claramente demonstrado no Congresso de Dezembro do ano passado, onde voltou a delimitar o caminho a seguir, usando como mensageiro o actor Morais e Castro, protagonista de uma cena teatral. Vinte cinco anos passados sobre o «Verão Quente» de 75, na sua última entrevista ao EXPRESSO — em que só contou o que já tinha decidido contar antes de ser confrontado com as perguntas, como sempre fez com os jornalistas — a interpretação que faz dos acontecimentos é impressionantemente igual à conclusão que havia tirado a quente: «As forças do capital de todo o mundo, ao verem o curso da revolução em Portugal — uma revolução profundamente popular e militar, com transformações de carácter económico e social, mercê da grande influência dos comunistas — mobilizaram-se no sentido de impedir tal processo, seguindo o que se chamou ‘a linha estratégica da CIA’». A decrepitude dos últimos anos não reduziu minimamente a força da sua intervenção. Omnipresente, passou a fazer-se representar por Domingos Abrantes e Francisco Lopes, os «eleitos» que detêm o privilégio do contacto directo, assumindo-se internamente como porta-vozes oficiais, ecos de «uma mente lúcida numa voz enfraquecida». A influência de Álvaro Cunhal no PCP — onde continua a ser o homem determinante, que dirime com mão de ferro as divergências (as que vêm e as que não vêm a público) — dificilmente desaparecerá, mesmo depois da sua morte. Precavendo já futuras tentativas de mudança de rumo, os seus seguidores mais fiéis preparam-se há já algum tempo para assumir a condição de herdeiros ideológicos. Como diz um antigo membro do Comité Central, que conhece bem a realidade por dentro, «vai ser muito difícil libertar o partido da sua imagem tutelar». A influência de Álvaro Cunhal no PCP — onde continua a ser o homem determinante, que dirime com mão de ferro as divergências (as que vêm e as que não vêm a público) — dificilmente desaparecerá, mesmo depois da sua morte. Precavendo já futuras tentativas de mudança de rumo, os seus seguidores mais fiéis preparam-se há já algum tempo para assumir a condição de herdeiros ideológicos. Como diz um antigo membro do Comité Central, que conhece bem a realidade por dentro, «vai ser muito difícil libertar o partido da sua imagem tutelar». Os símbolos, quando se tornam etéreos, diluídos na memória colectiva com o propósito explícito de gerar efeitos polifónicos, tornam o debate de ideias mais difícil ainda. Quando deixar de ser possível confrontar o ideólogo com as suas ideias, não faltará quem apelide de traidores os que apelam à mudança. Num país economicamente deficitário, onde subsistem dois milhões e meio de pobres, a mudança dependerá mais da qualidade da democracia, das condições de repartição da riqueza, do que da mobilização e força da frente anticunhalista. O mito é já mais forte do que o homem. 60

Um bom garfo É um apreciador excelentíssimo da cozinha tradicional portuguesa A voracidade é uma das características menos conhecidas da personalidade de Álvaro Cunhal. Quem o conheceu de perto, e partilhou com ele raros momentos de intimidade, guarda desse privilégio a memória de situações de exagero. Era um verdadeiro glutão a comer e um apreciador excelentíssimo da cozinha tradicional portuguesa. A voracidade é uma das características menos conhecidas da personalidade de Álvaro Cunhal. Quem o conheceu de perto, e partilhou com ele raros momentos de intimidade, guarda desse privilégio a memória de situações de exagero. Era um verdadeiro glutão a comer e um apreciador excelentíssimo da cozinha tradicional portuguesa. O seu apetite insaciável manteve-se ao longo dos anos. Talvez fosse uma forma - admitem os dirigentes mais condescendentes com o pecado da gula - de compensar as privações sofridas na prisão e na longa clandestinidade. Cunhal não resistia a um bom petisco, sobretudo tratando-se de pratos regionais, mas sempre a recato de olhares curiosos. As raras ocasiões em que abriu as defesas e deixou perceber o prazer que sentia pela boa mesa verificaram-se na festa do «Avante!». Frequentador assíduo do «stand» das Beiras, nunca perdia a bela chanfana trazida pelos camaradas da Lousã. Como não prescindia de saborear a caldeirada que os pescadores comunistas preparavam a preceito em sua honra.

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COMENTÁRIOS AO ARTIGO

14 comentários 1 a 10

14 de Setembro de 2001 às 14:10

Raquel

Tenho pena que as pessoas não se consigam desligar da sua côr politica, nem os próprios jornais, nem os partidos politicos, que democracia é esta em que vivemos que vive de informações e contra-informações,acreditem que nem toda a gente é estupida ainda há algumas pessoas que pensam, apesar de todas estas informações !

Acho que pelo menos este senhor A.C. deu provas que sonhou um dia e que tentou tornar esse sonho realidade. Se era um sonho bom ou não não sei mas gostaria que ele se deixa-se entrevistar por alguem que não seja nem jornalista nem politico e sem arrogância para podermos saber algo sobre este homem que no minimo se pode dizer que seja interessante como muitos outros em Portugal.

12 de Setembro de 2001 às 23:53

Ocunhal é um troca-tintas

O Sr.Cunhal contrariamente ao que os seus colegas políticos, que como ele nunca fizeram nada na vida nunca souberam o que é ser operário esses senhores dizemque oCunhal é Estalinista. Isso é uma provocação ao homem que parou o Hitler quando os outros se borravam de medo.

1- Quando Estaline morreu o Cunhal e todos os membros do PC passaram a atacar Estaline.

2- Apoio a repressão em Praga

3- Alterou os Estatutos do PC no que concerne à ditadura do proletariado eàluta armada para a conquista do poder que segundo reza Marx e estaline são fundamentos do Comunismo.

Este homem só teve algo em que foi sempre coerente: a sua obediência "canina" ao "Sol" de Moscovo que alimentava o seu oportunismo e carreirismo político e alimentava também o seu PC com Rublos. Um vendido a uma superpotência estrangeira, que é neste momento um urso ferido que ainda vai fazer sofrer muita gente.

Quem o safa é o "maoista" Pereira

12 de Setembro de 2001 às 23:53

Ocunhal é um troca-tintas

O Sr.Cunhal contrariamente ao que os seus colegas políticos, que como ele nunca fizeram nada na vida nunca souberam o que é ser operário esses senhores dizemque oCunhal é Estalinista. Isso é uma provocação ao homem que parou o Hitler quando os outros se borravam de medo.

1- Quando Estaline morreu o Cunhal e todos os membros do PC passaram a atacar Estaline.

2- Apoio a repressão em Praga

3- Alterou os Estatutos do PC no que concerne à ditadura do proletariado eàluta armada para a conquista do poder que segundo reza Marx e estaline são fundamentos do Comunismo.

Este homem só teve algo em que foi sempre coerente: a sua obediência "canina" ao "Sol" de Moscovo que alimentava o seu oportunismo e carreirismo político e alimentava também o seu PC com Rublos. Um vendido a uma superpotência estrangeira, que é neste momento um urso ferido que ainda vai fazer sofrer muita gente.

Quem o safa é o "maoista" Pereira

12 de Setembro de 2001 às 10:42

Anonymous

o belíssimo poema "La Lâmmpara Marina, de Pablo Neruda, que todos os Portugueses deveriam conhecer, recora não só Cunhal, mas Militão, Bento Gonçalves....

La Lámpara Marina

Pablo Neruda

El Puerto

Color de cielo

Cuando tú desembarcas

en Lisboa,

cielo celeste y rosa rosa,

estuco blanco y oro,

pétalos de ladrillo,

las casas,

las puertas,

los techos,

las ventanas,

salpicadas del oro limonero,

del azul ultramar de los navíos.

Cuando tú desembarcas

no conoces,

no sabes que detrás de las ventanas

escuchan,

rondan

carceleros de luto,

retóricos, correctos,

arreando presos a las islas,

condenando al silencio,

pululando

como escuadras de sombras

bajo ventanas verdes,

entre montes azules,

la policía

bajo las otoñales cornucopias

buscando portugueses,

rascando el suelo,

destinando los hombres a la sombra.

II

La Cítara

Olvidada

Oh Portugal hermoso

cesta de fruta y flores,

emerges

en la orilla plateada del océano,

en la espuma de Europa,

con la cítara de oro

que te dejó Camoens,

cantando con dulzura,

esparciendo en las bocas del Atlántico

tu tempestuoso olor de vinerías,

de azahares marinos,

tu luminosa luna entrecortada

por nubes y tormentas.

III

Los presidios

Pero,

portugués de la calle,

entre nosotros,

nadie nos escucha,

sabes

dónde

está Álvaro Cunhal?

Reconoces la ausencia

del valiente

Militão?

Muchacha portuguesa,

pasas como bailando

por las calles

rosadas de Lisboa,

pero,

sabes dónde cayó Bento Gonçalves,

el portugués más puro,

el honor de tu mar e de tu arena?

Sabes

que existe

una isla,

la isla de la Sal,

y Tarrafal en ella

vierte sombra?

Sí, lo sabes, muchacha,

muchacho, sí, lo sabes.

En silencio

la palabra

anda con lentitud pero recorre

no sólo el Portugal, sino la tierra.

Sí, sabemos,

en remotos países,

que hace treinta años

una lápida

espesa como tumba o como túnica

de clerical murciélago,

ahoga, Portugal, tu triste trino,

salpica tu dulzura

con gotas de martirio

y mantiene sus cúpulas de sombra.

IV

El Mar

Y Los Jazmines

De tu mano pequeña en otra hora

salieron criaturas

desgranadas

en el asombro de la geografia.

Así volvió Camoens

a dejarte una rama de jazmines

que siguió floreciendo.

La inteligencia ardió como una viña

de transparentes uvas

en tu raza.

Guerra Junqueiro entre las olas

dejó caer su trueno

de libertad bravía

que transportó el océano en su canto,

y otros multiplicaron

tu esplendor de rosales y racimos

como si de tu territorio estrecho

salieran grandes manos

derramando semillas

para toda la tierra.

Sin embargo,

el tiempo te ha enterrado.

El polvo clerical

acumulado en Coimbra

cayó en tu rostro

de naranja oceánica

y cubrió el esplendor de tu cintura.

V

La Lámpara

Marina

Portugal,

vuelve al mar, a tus navíos,

Portugal, vuelve al hombre, al marinero,

vuelve a la tierra tuya, a tu fragancia,

a tu razón libre en el viento,

de nuevo

a la luz matutina

del clavel y la espuma.

Muéstranos tu tesoro,

tus hombres, tus mujeres.

No escondas más tu rostro

de embarcación valiente

puesta en las avanzadas de Océano.

Portugal, navegante,

descubridor de islas,

inventor de pimientas,

descubre el nuevo hombre,

las islas asombradas,

descubre el archipélago en el tiempo.

La súbita

aparición

del pan

sobre la mesa,

la aurora,

tú, descúbrela,

descubridor de auroras.

Cómo es esto?

Cómo puedes negarte

al ciclo de la luz tú que mostraste

caminos a los ciegos?

Tú, dulce y férreo y viejo,

angosto y ancho padre

del horizonte, cómo

puedes cerrar la puerta

a los nuevos racimos

y al viento con estrellas del Oriente?

Proa de Europa, busca

en la corriente

las olas ancestrales,

la marítima barba

de Camoens.

Rompe

las telaranãs

que cubren tu fragrante arboladura,

y entonces

a nosotros los hijos de tus hijos,

aquellos para quienes

descubriste la arena

hasta entonces oscura

de la geografía deslumbrante,

muéstranos que tú puedes

atravesar de nuevo

el nuevo mar oscuro

y descubrir al hombre que ha nacido

en las islas más grandes de la tierra.

Navega, Portugal, la hora

llégó, levanta

tu estatura de proa

y entre las islas y los hombres vuelve

a ser camino.

En esta edad agrega

tu luz, vuelve a ser lámpara:

aprenderás de nuevo a ser estrella.

Poema extraído de Obras Completas, 3ª ed. aumentada, Buenos Aires, Editorial Losada, Col. Cumbre, 1967

11 de Setembro de 2001 às 23:38

Anonymous

Sr. Rui Ochoa, afirma factos no seu artigo, muito graves.Vou relembrá-lo :

-...minudências de que é feita a existência

- Homem obsessivamente misterioso

- compará-lo a Salazar ????por favor...

-ele explora os seus camaradas de forma admirável...????

Realmente uma vergonha

11 de Setembro de 2001 às 23:31

Anonymous

Só tenho pena, que haja quem chame os comunistas de fanáticos, mas, pelos comentários aqui feitos, pergunto-me??? Quem são so fanáticos ??? Independentemente, da pessoa em questão, o Dr. àlvaro Cunhal, que a todos neste país, só deu exemplos de honestidade, trabalho e integridade, este artigo, está mal construído de vários pontos de vista,. Tem factos errados, completamente distorcidos... Tenha dó Sr. Rui Ochoa, prepare-se melhor, não está a lidar com o público da revista Maria.

11 de Setembro de 2001 às 08:29

Anonymous

Pois claro que a História o absolverá. A "História" escrita pelos Fernando Rosas, pelos Mattosos e todos os outros comunas que controlam o ensino da História em Portugal. É como a conversa do "Ouro Nazi".

10 de Setembro de 2001 às 11:11

JOTA

Cometeste erros,mas não te vendeste!!! A história te absolverá, ao mesmo tempo que condenará esses que "venderam" amigos com o único fim de serem presidentes da República!!!

9 de Setembro de 2001 às 07:13

André Brito

Muitos comunistas lutaram e sacrificaram-se por um mundo melhor. Mas se não fossem tão ingénuos, cegos e fanáticos teriam percebido que o que estavam a fazer era a ajudar uma máfia internacional a tomar o poder em todos os países do mundo para escravizar e arruinar todos os povos. Muitos só perceberam isso quando chegaram ao gulag, ou por cá eram levados para uma praia para levarem um tiro na cabeça, que seria atribuído à PIDE. Outros ainda não perceberam, e nunca irão perceber o conto do vigário em que acreditam e em que querem fazer outros acreditar.

8 de Setembro de 2001 às 17:00

azul

eu só digo que bem vistas as coisas os comunistas foram os unicos que sofreram e lutaram por um ideal bom ou mau era la com eles mas foram os unicos e depois do sofrimento deles é que apareceram com a democracia os abutres e os tachistas ,desculpem mas é verdade.

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Álvaro Cunhal O último estalinista

Indisponível para admitir o fracasso ideológico que levou à hecatombe os regimes comunistas do Leste europeu, e acabou de vez com a utopia da sociedade sem classes, Álvaro Cunhal, à beira de completar 88 anos, insiste imperturbável nas mesmas ideias de sempre, como quem profetiza que a História um dia ainda lhe há-de dar razão. Misterioso e solitário, à maneira de Salazar, fez da sua vida um combate sem fim, desafiando tudo e todos — a PIDE e a ditadura, o 25 de Novembro e a «Perestroika», o muro de Berlim e a construção europeia. Avesso aos ventos de mudança, interpretou à sua maneira cada derrota, impondo internamente as suas teses, destruindo vias alternativas, humilhando dissidentes — tudo em nome da causa intemporal dos explorados. Mais do que coerente, é um conservador. Na sua última entrevista ao EXPRESSO, em Maio de 2000, confidenciava ainda, provocador e insubmisso: «Sinto-me bem quando combato».

Texto de Orlando Raimundo

Fotografias de Rui Ochôa (actuais) e Edições Avante (históricas) Filho-família, estudante, político, advogado, mestre-escola, romancista, esteta, desenhador, pintor — há muitas vidas sobrepostas na longa vida de Cunhal. A imensidão de perfis não mostra todavia o trivial, as minudências de que é feita a existência. O muito que dele se sabe é, afinal, bem pouco. Homem obsessivamente misterioso, aureolado de romantismo, faz do privado um segredo, escondendo grandezas e misérias da condição humana. Como se a clandestinidade fosse obsessão para toda a vida. Filho-família, estudante, político, advogado, mestre-escola, romancista, esteta, desenhador, pintor — há muitas vidas sobrepostas na longa vida de Cunhal. A imensidão de perfis não mostra todavia o trivial, as minudências de que é feita a existência. O muito que dele se sabe é, afinal, bem pouco. Homem obsessivamente misterioso, aureolado de romantismo, faz do privado um segredo, escondendo grandezas e misérias da condição humana. Como se a clandestinidade fosse obsessão para toda a vida. Uma das raras vezes em que decidiu revelar escassos pormenores da sua intimidade escolheu como interlocutora uma jornalista absolutamente «sui generis»: Yúlia Petrova, neta de Krutchev, que, em 1963, fez para as Edições Pravda um retrato encomiástico da sua liderança. Mas nem a história que contou, de uma banalíssima ousadia de infância, escapa à regra das lições de propaganda. É a memória do dia em que mostrou ao pai um pardal morto à fisgada. «Às vezes — disse-lhe o ‘velho’ — os homens necessitam de fazer mal, mas quanto menos vezes se fizer isso melhor. Essa tua façanha não é nenhuma vitória». A Maternidade Daniel de Matos, em Coimbra Álvaro Barreirinhas Cunhal nasce na Maternidade Daniel de Matos, junto ao Jardim Botânico, em Coimbra, a 10 de Novembro de 1913, o dia em que Charles Chaplin faz os derradeiros testes para iniciar a sua genial carreira de actor. A milhares de quilómetros de distância, em Cracóvia, onde se encontra exilado, Lenine ultimava o programa ideológico bolchevique, pugnando pela «Revolução Social», que haveria de levar pela primeira vez na História os comunistas ao poder. No ano anterior, Portugal fora abalado por uma greve geral, que paralisara durante semanas Lisboa e a outra banda, colocando em sérias dificuldades o Governo republicano. Centenas de grevistas tinham sido colocados sob prisão em navios de guerra; o administrador do Concelho da Moita fora assassinado pelos operários e a tropa vira-se obrigada a proclamar o estado de sítio em Almada. Álvaro Barreirinhas Cunhal nasce na Maternidade Daniel de Matos, junto ao Jardim Botânico, em Coimbra, a 10 de Novembro de 1913, o dia em que Charles Chaplin faz os derradeiros testes para iniciar a sua genial carreira de actor. A milhares de quilómetros de distância, em Cracóvia, onde se encontra exilado, Lenine ultimava o programa ideológico bolchevique, pugnando pela «Revolução Social», que haveria de levar pela primeira vez na História os comunistas ao poder. No ano anterior, Portugal fora abalado por uma greve geral, que paralisara durante semanas Lisboa e a outra banda, colocando em sérias dificuldades o Governo republicano. Centenas de grevistas tinham sido colocados sob prisão em navios de guerra; o administrador do Concelho da Moita fora assassinado pelos operários e a tropa vira-se obrigada a proclamar o estado de sítio em Almada. Exterior da igreja paroquial da Senhora da Assunção, onde foi baptizado A família Cunhal, típica representante da classe média, habitava uma pequena casa de paredes cor-de-rosa, com rés-do-chão e primeiro andar, na Ladeira das Alpenduradas, em Coimbra, uma rua secundária lá para as bandas do Bairro Norton de Matos, onde mais tarde se instalou um barbeiro, conforme atesta a placa. Ali viveu e brincou durante três anos o pequeno Álvaro, segundo dos quatro filhos do casal, que em 1916 se mudou para Seia, terra de naturalidade do pai. A família Cunhal, típica representante da classe média, habitava uma pequena casa de paredes cor-de-rosa, com rés-do-chão e primeiro andar, na Ladeira das Alpenduradas, em Coimbra, uma rua secundária lá para as bandas do Bairro Norton de Matos, onde mais tarde se instalou um barbeiro, conforme atesta a placa. Ali viveu e brincou durante três anos o pequeno Álvaro, segundo dos quatro filhos do casal, que em 1916 se mudou para Seia, terra de naturalidade do pai. Instalaram-se numa casa de aspecto imponente, ainda que mal conservada, no centro da vila, junto à Igreja Matriz, em cujo adro as crianças brincavam. O rapazinho foi baptizado, já com cinco anos, na igreja paroquial da Senhora da Assunção. Foram padrinhos o irmão mais velho, António José e... a Virgem Nossa Senhora, convocada em preces pela mãe. Interior da mesma igreja A viagem na máquina do tempo pela árvore genealógica identifica um barão de Santa Comba, terra de origem de Salazar, como referência mais antiga do clã pelo lado materno. A estirpe aristocrática passa por uma família de cristãos-novos da época da Restauração. E há notícias de um antepassado visconde de Ervedal e outro conde da Ervideira, que estabeleceram relações de sangue com os marqueses da Praia e de Monforte e com membros influentes da hierarquia da Igreja. Talvez isso explique o porte altivo emblemático, do líder carismático dos comunistas portugueses. A viagem na máquina do tempo pela árvore genealógica identifica um barão de Santa Comba, terra de origem de Salazar, como referência mais antiga do clã pelo lado materno. A estirpe aristocrática passa por uma família de cristãos-novos da época da Restauração. E há notícias de um antepassado visconde de Ervedal e outro conde da Ervideira, que estabeleceram relações de sangue com os marqueses da Praia e de Monforte e com membros influentes da hierarquia da Igreja. Talvez isso explique o porte altivo emblemático, do líder carismático dos comunistas portugueses. Casa de fachada cor-de-rosa onde a família Cunhal vivia na Ladeira da Alpendurada, em Coimbra Beirão de alma e coração, o pai, Avelino da Costa Cunhal, apesar da ascendência modesta, conseguira formar-se em Direito em Coimbra, à custa de muitos sacrifícios e algumas explicações. Pouco depois de ele nascer, no regresso às origens, abriu banca de advogado em Seia. Durante o consulado de Sidónio Pais, foi administrador do Concelho, vindo a ocupar mais tarde o cargo de governador civil da Guarda, que anos antes fora desempenhado por João Soares, pai de Mário Soares. Morreu em 1966, com 78 anos. Nunca foi do PCP, mas fez da sua vida um combate contra a ditadura, chegando a estar preso na fase em que o filho se encontrava já na clandestinidade. É autor de diversas peças de teatro de intervenção, algumas das quais ainda viu encenadas, no Escola Jaime Cortesão, em Coimbra, numa cumplicidade que passava por esconder da censura o nome do autor. Beirão de alma e coração, o pai, Avelino da Costa Cunhal, apesar da ascendência modesta, conseguira formar-se em Direito em Coimbra, à custa de muitos sacrifícios e algumas explicações. Pouco depois de ele nascer, no regresso às origens, abriu banca de advogado em Seia. Durante o consulado de Sidónio Pais, foi administrador do Concelho, vindo a ocupar mais tarde o cargo de governador civil da Guarda, que anos antes fora desempenhado por João Soares, pai de Mário Soares. Morreu em 1966, com 78 anos. Nunca foi do PCP, mas fez da sua vida um combate contra a ditadura, chegando a estar preso na fase em que o filho se encontrava já na clandestinidade. É autor de diversas peças de teatro de intervenção, algumas das quais ainda viu encenadas, no Escola Jaime Cortesão, em Coimbra, numa cumplicidade que passava por esconder da censura o nome do autor. A mãe, Mercedes Ferreira Barreirinhas, provinha de uma família católica e burguesa. Nunca nutriu qualquer admiração pela actividade do filho. Bem pelo contrário: declarava-se até anticomunista, recebendo com hostilidade todos quantos se movimentavam politicamente perto do filho. Dela, que nunca o visitou nos longos anos em que esteve preso — embora tenha chegado a meter «cunhas» em tentativas falhadas de o libertar — herdou Cunhal a dureza de carácter. O rapaz frequentou a Escola Primária em Seia e quando tinha 8 anos sofreu um rude abalo: a morte da irmã, Maria Mansuenta, vítima da tuberculose. Enquanto a mãe o confortava na dor, um grupo de dirigentes da Federação Maximalista fundava clandestinamente, em Lisboa, o Partido Comunista Português, sem estrutura orgânica consistente, nem base proletária de apoio, ainda sob forte influência anarco-sindicalista. A mãe, Mercedes Ferreira Barreirinhas, provinha de uma família católica e burguesa. Nunca nutriu qualquer admiração pela actividade do filho. Bem pelo contrário: declarava-se até anticomunista, recebendo com hostilidade todos quantos se movimentavam politicamente perto do filho. Dela, que nunca o visitou nos longos anos em que esteve preso — embora tenha chegado a meter «cunhas» em tentativas falhadas de o libertar — herdou Cunhal a dureza de carácter. O rapaz frequentou a Escola Primária em Seia e quando tinha 8 anos sofreu um rude abalo: a morte da irmã, Maria Mansuenta, vítima da tuberculose. Enquanto a mãe o confortava na dor, um grupo de dirigentes da Federação Maximalista fundava clandestinamente, em Lisboa, o Partido Comunista Português, sem estrutura orgânica consistente, nem base proletária de apoio, ainda sob forte influência anarco-sindicalista. Escola primária em Seia Três anos depois — já Estaline, com 45 anos, era secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética — Álvaro muda-se com a família para Lisboa, onde faz o Ensino Secundário, primeiro no Pedro Nunes, depois no Liceu Camões. Por influência da mãe, que já o levara a fazer a primeira comunhão, é educado no respeito pela Santa Madre Igreja. Torna-se frequentador assíduo da missa, confessando-se e comungando, num abraço de alma e coração à «verdade revelada». É impossível não estabelecer alguma relação entre essa entrega à religião católica e a fé inquebrantável no comunismo. Três anos depois — já Estaline, com 45 anos, era secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética — Álvaro muda-se com a família para Lisboa, onde faz o Ensino Secundário, primeiro no Pedro Nunes, depois no Liceu Camões. Por influência da mãe, que já o levara a fazer a primeira comunhão, é educado no respeito pela Santa Madre Igreja. Torna-se frequentador assíduo da missa, confessando-se e comungando, num abraço de alma e coração à «verdade revelada». É impossível não estabelecer alguma relação entre essa entrega à religião católica e a fé inquebrantável no comunismo. Liceu Pedro Nunes, em Lisboa A ditadura do Estado Novo irrompe quando Cunhal tem 12 anos. O Partido Comunista não tem praticamente influência nenhuma na sociedade portuguesa. Há-de ser ilegalizado um ano depois, em 1927, por ordem da ditadura militar. A família volta a aumentar, com o nascimento de outra rapariga, Maria Eugénia. Como anota Pacheco Pereira, no primeiro volume da sua magistral «biografia não autorizada», Álvaro era um aluno bastante irregular no liceu — bom a Português e a Filosofia e mediano nas restantes disciplinas, incluindo ironicamente Desenho, para que haveria de revelar mais tarde um imenso talento. A ditadura do Estado Novo irrompe quando Cunhal tem 12 anos. O Partido Comunista não tem praticamente influência nenhuma na sociedade portuguesa. Há-de ser ilegalizado um ano depois, em 1927, por ordem da ditadura militar. A família volta a aumentar, com o nascimento de outra rapariga, Maria Eugénia. Como anota Pacheco Pereira, no primeiro volume da sua magistral «biografia não autorizada», Álvaro era um aluno bastante irregular no liceu — bom a Português e a Filosofia e mediano nas restantes disciplinas, incluindo ironicamente Desenho, para que haveria de revelar mais tarde um imenso talento. Cunhal já estudante universitário. Em 1934 foi eleito representante dos estudantes de Lisboa no Senado Universitário O seu primeiro contacto com as ideias comunistas acontece ainda na adolescência, quando passa férias com os país em S. Pedro de Muel. Aí conhece o operário vidreiro da Marinha Grande Armando Magalhães (que, na década de 30, haveria de tornar-se um dos principais dirigentes do PCP), que lhe dá «volta ao miolo». O seu primeiro contacto com as ideias comunistas acontece ainda na adolescência, quando passa férias com os país em S. Pedro de Muel. Aí conhece o operário vidreiro da Marinha Grande Armando Magalhães (que, na década de 30, haveria de tornar-se um dos principais dirigentes do PCP), que lhe dá «volta ao miolo». Cunhal tinha quase 20 anos quando, vítima também da tuberculose, morre o seu irmão António José, dois anos mais velho — intelectual irreverente atraído pela vida boémia, a pintura e o cinema experimental. A agora única irmã, Maria Eugénia, que mais tarde haveria de se tornar redactora do «Avante!», forjou por isso com ele uma relação afectiva fortíssima, actuando durante muito tempo como retaguarda sentimental. A sua casa em Lisboa, na Rua Sousa Martins, a partir de certa altura permanentemente vigiada pela PIDE, foi durante várias décadas a única residência conhecida de Álvaro Cunhal. Aliciado por Cansado Gonçalves, um dos mais importantes dirigentes juvenis do PCP (alentejano de Cuba, aluno da Faculdade de Letras e dez anos mais velho do que ele), Álvaro Cunhal filiou-se no partido em 1934, com 20 anos de idade, adoptando o pseudónimo de «Daniel». Salazar assumira as rédeas do poder em Julho de 1932, ao ascender à chefia do Governo, dando novo impulso à ditadura, que ensaia a legalização através da «plebiscitada» Constituição de 1933, onde todas as abstenções foram contadas como votos a favor. É o ano em que os operários da Marinha Grande, seduzidos pelas ideias anarco-sindicalistas, ensaiam uma tentativa de tomada de poder, apossando-se da vila, elegendo um soviete e hasteando a bandeira vermelha, até serem esmagados pelo Exército. Aliciado por Cansado Gonçalves, um dos mais importantes dirigentes juvenis do PCP (alentejano de Cuba, aluno da Faculdade de Letras e dez anos mais velho do que ele), Álvaro Cunhal filiou-se no partido em 1934, com 20 anos de idade, adoptando o pseudónimo de «Daniel». Salazar assumira as rédeas do poder em Julho de 1932, ao ascender à chefia do Governo, dando novo impulso à ditadura, que ensaia a legalização através da «plebiscitada» Constituição de 1933, onde todas as abstenções foram contadas como votos a favor. É o ano em que os operários da Marinha Grande, seduzidos pelas ideias anarco-sindicalistas, ensaiam uma tentativa de tomada de poder, apossando-se da vila, elegendo um soviete e hasteando a bandeira vermelha, até serem esmagados pelo Exército. Cumprindo o serviço militar na Companhia Disciplinar de Penamacor, para onde fora enviado por motivos políticos, e quando passou à clandestinidade (em cima). Aquando da sua prisão, em 1949, e após a fuga de Peniche, em 1960 (em baixo) A aproximação ao PCP começara três anos antes, logo a seguir à entrada para a Faculdade de Direito de Lisboa. Para Cunhal, que se considera comunista desde os 17 anos, é essa a data que conta e não a da filiação efectiva. Não disse de imediato que sim ao recrutador. «Tenho primeiro que estudar os diferentes sistemas políticos, antes de me decidir» — sentenciou. Mas Cansado Gonçalves, já à espera da reacção, disparou a proposta inesperada que viria a revelar-se eficaz: «Trago-te um operário para te explicar». A missão foi confiada a um artista colchoeiro, que não teve dificuldades em convencer o jovem intelectual pequeno-burguês. Designado representante do partido na Liga dos Amigos da URSS e no Socorro Vermelho Internacional, antes mesmo de ser militante, rapidamente se viu impelido a estender a acção aos Grupos de Defesa Académica, que tentavam implantar-se no movimento estudantil. O resultado não foi inteiramente brilhante: chumbou no 1º ano da Faculdade, acabando por decidir mudar a matrícula de aluno efectivo para voluntário. A aproximação ao PCP começara três anos antes, logo a seguir à entrada para a Faculdade de Direito de Lisboa. Para Cunhal, que se considera comunista desde os 17 anos, é essa a data que conta e não a da filiação efectiva. Não disse de imediato que sim ao recrutador. «Tenho primeiro que estudar os diferentes sistemas políticos, antes de me decidir» — sentenciou. Mas Cansado Gonçalves, já à espera da reacção, disparou a proposta inesperada que viria a revelar-se eficaz: «Trago-te um operário para te explicar». A missão foi confiada a um artista colchoeiro, que não teve dificuldades em convencer o jovem intelectual pequeno-burguês. Designado representante do partido na Liga dos Amigos da URSS e no Socorro Vermelho Internacional, antes mesmo de ser militante, rapidamente se viu impelido a estender a acção aos Grupos de Defesa Académica, que tentavam implantar-se no movimento estudantil. O resultado não foi inteiramente brilhante: chumbou no 1º ano da Faculdade, acabando por decidir mudar a matrícula de aluno efectivo para voluntário. Fotografia de Vaz Saraiva Casa de Seia (já não existe) para onde a família Cunhal se mudou em 1916 Aos 20 anos é eleito pelos estudantes de Lisboa seu representante no Senado Universitário. E o partido rende-se às suas capacidades, aprovando a sua admissão e encarregando-o de imediato da tarefa de reorganizar — com Pável e Florindo de Oliveira — a Federação das Juventudes Comunistas (FJC) na margem Sul do Tejo. A sua vida de estudante mantém-se na aparência tranquila. Mas os dias são já divididos em duas metades: uma legal e outra semiclandestina. Arranja ainda tempo para um primeiro emprego, como recepcionista do Hotel Vitória, o edifício que, por ironia do destino, haveria de ser comprado a 25 de Abril pelo PCP, que ali pôs a funcionar o Centro de Trabalho que se tornou um dos seus mais importantes quartéis-generais. A «cunha» para o emprego foi metida por Ramos da Costa, amigo da família e militante do PCP, o mesmo homem que em Abril de 1973 haveria de subscrever com Mário Soares, em Bad-Munstereifel, a acta de fundação do Partido Socialista. Aos 20 anos é eleito pelos estudantes de Lisboa seu representante no Senado Universitário. E o partido rende-se às suas capacidades, aprovando a sua admissão e encarregando-o de imediato da tarefa de reorganizar — com Pável e Florindo de Oliveira — a Federação das Juventudes Comunistas (FJC) na margem Sul do Tejo. A sua vida de estudante mantém-se na aparência tranquila. Mas os dias são já divididos em duas metades: uma legal e outra semiclandestina. Arranja ainda tempo para um primeiro emprego, como recepcionista do Hotel Vitória, o edifício que, por ironia do destino, haveria de ser comprado a 25 de Abril pelo PCP, que ali pôs a funcionar o Centro de Trabalho que se tornou um dos seus mais importantes quartéis-generais. A «cunha» para o emprego foi metida por Ramos da Costa, amigo da família e militante do PCP, o mesmo homem que em Abril de 1973 haveria de subscrever com Mário Soares, em Bad-Munstereifel, a acta de fundação do Partido Socialista. Eleito secretário-geral da organização de juventude em Julho de 1935, com 21 anos de idade, desloca-se pela primeira vez a Moscovo, para participar no VII Congresso da Internacional Juvenil Comunista, o qual decorre em paralelo com o congresso propriamente dito, em que intervém o secretário-geral, Bento Gonçalves, que viaja acompanhado de dois dos mais importantes dirigentes do partido no interior de Portugal: José de Sousa e Júlio Fogaça. Eleito secretário-geral da organização de juventude em Julho de 1935, com 21 anos de idade, desloca-se pela primeira vez a Moscovo, para participar no VII Congresso da Internacional Juvenil Comunista, o qual decorre em paralelo com o congresso propriamente dito, em que intervém o secretário-geral, Bento Gonçalves, que viaja acompanhado de dois dos mais importantes dirigentes do partido no interior de Portugal: José de Sousa e Júlio Fogaça. Ideias e Debates Pires Jorge, que organizaria a fuga de Peniche Dirigidos por Estaline (que já iniciara a purga que acabou com a vida a milhares de opositores) e Dimitrov, os trabalhos duram cerca de um mês. Empolgados pelo clima de euforia que rodeou as reuniões, os portugueses decidem ficar até Novembro na capital soviética. Gonçalves, Sousa e Fogaça são os primeiros a regressar a Lisboa. Mas dias depois são presos na rua por um inacreditável descuido, ao serem reconhecidos e denunciados à polícia por um «bufo». Destino: o campo de concentração do Tarrafal, em Cabo Verde. Dirigidos por Estaline (que já iniciara a purga que acabou com a vida a milhares de opositores) e Dimitrov, os trabalhos duram cerca de um mês. Empolgados pelo clima de euforia que rodeou as reuniões, os portugueses decidem ficar até Novembro na capital soviética. Gonçalves, Sousa e Fogaça são os primeiros a regressar a Lisboa. Mas dias depois são presos na rua por um inacreditável descuido, ao serem reconhecidos e denunciados à polícia por um «bufo». Destino: o campo de concentração do Tarrafal, em Cabo Verde. Informados da tragédia que se abateu sobre a organização — o primeiro dos mais duros golpes desferidos contra o partido, que haveria de se ressentir dele até 1941 — Cunhal e os outros jovens decidiram atrasar o regresso, que só veio a acontecer em Março de 1936, rodeado de mil precauções. Quando chegam, fervilhando de ardor bolchevique, o lugar de secretário-geral está a ser desempenhado por Miguel Wagner Russel, um funcionário público que não domina o aparelho. Acusado de malbaratar os dinheiros do partido, Wagner é marginalizado numa operação montada por Pires Jorge, Manuel Rodrigues da Silva e Alberto Araújo, um jovem professor universitário que é escolhido para o substituir no cargo. Ideias e Debates Manuel Guedes Cunhal apoia a mudança e ascende pela primeira vez ao Comité Central. O facto de ter estado em Moscovo dá-lhe uma inesperada autoridade, aos olhos dos camaradas, que ele explora de forma admirável. Em pouco tempo torna-se uma das figuras mais influentes do partido, subindo rapidamente ao Secretariado, com Manuel Guedes (que se evadira do tribunal quando estava a ser julgado) e Pires Jorge. É uma direcção efémera: destroçada por novas prisões, é substituída por outra, que acaba por ser desmantelada também. Os métodos de trabalho clandestino no PCP ainda não tinham conseguido suplantar o aperfeiçoamento crescente do trabalho da polícia. Cunhal apoia a mudança e ascende pela primeira vez ao Comité Central. O facto de ter estado em Moscovo dá-lhe uma inesperada autoridade, aos olhos dos camaradas, que ele explora de forma admirável. Em pouco tempo torna-se uma das figuras mais influentes do partido, subindo rapidamente ao Secretariado, com Manuel Guedes (que se evadira do tribunal quando estava a ser julgado) e Pires Jorge. É uma direcção efémera: destroçada por novas prisões, é substituída por outra, que acaba por ser desmantelada também. Os métodos de trabalho clandestino no PCP ainda não tinham conseguido suplantar o aperfeiçoamento crescente do trabalho da polícia. Forçado pelas circunstâncias a passar à clandestinidade, Cunhal interrompe o curso e dedica-se por inteiro ao partido. Pouco depois, no início de Julho de 1936, é enviado à Espanha republicana, com uma missão algo misteriosa que envolve contactos com a Internacional Comunista, para preparar o regresso a Portugal de Pável, o dirigente exilado há já algum tempo em Moscovo. Cunhal Logo após a sua entrada em Madrid é surpreendido pela eclosão da Guerra Civil, de que haveria de se tornar testemunha directa e privilegiada, acompanhando durante cinco meses os ataques franquistas e a resistência republicana. Uma das suas missões, ao transpor a fronteira, era pedir ajuda ao Partido Comunista Espanhol para a libertação de Pires Jorge e Manuel Guedes, que tinham sido presos em Cáceres. Mas acabou por se alistar nas Milícias Populares e alinhar no combate antifranquista, participando activamente no serviço de macas e no apoio aos hospitais de campanha. Logo após a sua entrada em Madrid é surpreendido pela eclosão da Guerra Civil, de que haveria de se tornar testemunha directa e privilegiada, acompanhando durante cinco meses os ataques franquistas e a resistência republicana. Uma das suas missões, ao transpor a fronteira, era pedir ajuda ao Partido Comunista Espanhol para a libertação de Pires Jorge e Manuel Guedes, que tinham sido presos em Cáceres. Mas acabou por se alistar nas Milícias Populares e alinhar no combate antifranquista, participando activamente no serviço de macas e no apoio aos hospitais de campanha. Em Junho de 1937, ao regressar de Espanha, é preso pela primeira vez, ao cair numa cilada montada pela polícia política, que manda um falso operário marcar com ele um encontro. O agente da PVDE que o prende é José Gonçalves, um ex-padeiro anarco-sindicalista que se passou para a polícia e que, 24 anos mais tarde, em 1961, haveria de chefiar a brigada que assassinou o pintor Dias Coelho. De início vai para o Aljube, mas acaba transferido para Peniche. Submetido a intensa tortura, não só não denuncia ninguém como assume a ousadia de provocar os pides que queriam saber da sua morada, atirando para cima da mesa um molho de chaves, dizendo: «Procurem pelas fechaduras de Lisboa, que talvez encontrem...» Cunhal com Dias Lourenço num barco no Tejo, nos anos 40 Um ano depois é libertado, com a condição de cumprir o serviço militar na Companhia Disciplinar de Penamacor. Partilha o castigo com uma outra figura que haveria de ganhar grande notoriedade na memória colectiva do PCP: Alfredo Dinis (Alex). Debilitado, em Dezembro de 1939 acaba por ser dispensado por uma junta médica militar e regressa à actividade clandestina. É quando cria os desenhos que ilustram a primeira edição de «Esteiros», de Soeiro Pereira Gomes, a «jóia da coroa» do neo-realismo. Um ano depois é libertado, com a condição de cumprir o serviço militar na Companhia Disciplinar de Penamacor. Partilha o castigo com uma outra figura que haveria de ganhar grande notoriedade na memória colectiva do PCP: Alfredo Dinis (Alex). Debilitado, em Dezembro de 1939 acaba por ser dispensado por uma junta médica militar e regressa à actividade clandestina. É quando cria os desenhos que ilustram a primeira edição de «Esteiros», de Soeiro Pereira Gomes, a «jóia da coroa» do neo-realismo. Muitos militantes sofreram longas penas de prisão e torturas. Os órgãos do partido denunciavam-nas e preparam os comunistas para os sofrimentos futuros O partido vive a sua pior crise de sempre. Dois outros importantes dirigentes (Francisco Miguel e Alberto Araújo) tinham sido presos e o Secretariado estava entregue a aventureiros, politicamente inexperientes e muito inábeis. Sucedem-se as infiltrações de provocadores no aparelho clandestino e fervilham as intrigas. E a Internacional Comunista corta relações com o PCP, por a direcção não lhe merecer confiança. O partido vive a sua pior crise de sempre. Dois outros importantes dirigentes (Francisco Miguel e Alberto Araújo) tinham sido presos e o Secretariado estava entregue a aventureiros, politicamente inexperientes e muito inábeis. Sucedem-se as infiltrações de provocadores no aparelho clandestino e fervilham as intrigas. E a Internacional Comunista corta relações com o PCP, por a direcção não lhe merecer confiança. Preso pela segunda vez em Maio de 1940, Cunhal acaba por fazer o exame final da licenciatura em Direito, iniciada nove anos antes, sob escolta policial. O júri escolhido para avaliar a tese — um ensaio de 100 páginas sobre «A Realidade Social do Aborto» —, é composto por Marcello Caetano, Cavaleiro Ferreira e Paulo Cunha, três figuras gradas do salazarismo, que não hesitam em atribuir-lhe 16 valores. Concluído o exame, regressa à prisão por mais um ano. Panfletos e livros reclamando a libertação do líder do PCP e dos presos políticos. De destacar as intervenções de Jorge Amado e Pablo Neruda É uma época penosa para os comunistas em todo o mundo. O Pacto Germano-Soviético, assinado por Estaline e Hitler em 1939, causa forte perturbação no aparelho clandestino, confrontado com a necessidade de explicar o inexplicável. Cunhal entra na liça e escreve para o semanário «O Diabo» — dominado pelos comunistas, sob direcção fictícia de Manuel de Campos Lima e controlo efectivo de Cansado Gonçalves — um artigo intitulado «Nem Maginot, nem Siegfried», subscrevendo a tese estalinista. Salazar manda encerrar o jornal e ordena à PIDE que esteja atenta aos intelectuais que nele colaboravam, rol que inclui Soeiro Pereira Gomes, Alves Redol, Manuel da Fonseca, Piteira Santos, Mário Dionísio, Cândida Ventura e Dias Lourenço. É uma época penosa para os comunistas em todo o mundo. O Pacto Germano-Soviético, assinado por Estaline e Hitler em 1939, causa forte perturbação no aparelho clandestino, confrontado com a necessidade de explicar o inexplicável. Cunhal entra na liça e escreve para o semanário «O Diabo» — dominado pelos comunistas, sob direcção fictícia de Manuel de Campos Lima e controlo efectivo de Cansado Gonçalves — um artigo intitulado «Nem Maginot, nem Siegfried», subscrevendo a tese estalinista. Salazar manda encerrar o jornal e ordena à PIDE que esteja atenta aos intelectuais que nele colaboravam, rol que inclui Soeiro Pereira Gomes, Alves Redol, Manuel da Fonseca, Piteira Santos, Mário Dionísio, Cândida Ventura e Dias Lourenço. Hitler haveria de não respeitar o acordo e em 1941 avança contra a URSS, obrigando Estaline a mudar de atitude e a aproximar-se dos Aliados. Cunhal muda com ele. E chega a reconhecer o carácter nacional do fascismo, ao defender que, em caso de invasão de Portugal, os comunistas deveria lutar ao lado do exército salazarista contra o agressor nazi. No início da década de 40, a desorganização do partido é impressionante. A actividade está paralisada quase por completo, em resultado de traições e denúncias umas atrás das outras. Nos últimos cinco anos, a polícia política fizera tantas detenções que o Comité Central teve de ser refeito oito vezes. É a grande oportunidade de Cunhal — o jovem doutor de olhar penetrante e vontade férrea, prestes a ser libertado — para revelar as suas extraordinárias capacidades. O papel que irá desempenhar na reorganização do partido será de importância decisiva. No início da década de 40, a desorganização do partido é impressionante. A actividade está paralisada quase por completo, em resultado de traições e denúncias umas atrás das outras. Nos últimos cinco anos, a polícia política fizera tantas detenções que o Comité Central teve de ser refeito oito vezes. É a grande oportunidade de Cunhal — o jovem doutor de olhar penetrante e vontade férrea, prestes a ser libertado — para revelar as suas extraordinárias capacidades. O papel que irá desempenhar na reorganização do partido será de importância decisiva. Ao sair da prisão é contratado por João Soares, pai de Mário Soares, que nutre grande admiração pela sua combatividade, como regente de estudos do Colégio Moderno — uma espécie de prefeito. Ia ao fim da tarde complementar as aulas com «salas de estudo», dedicadas essencialmente aos trabalhos de casa. Um dos alunos que mais acompanha na altura é Mário Soares, então a terminar o 7º ano, em quem desperta o interesse pela literatura neo-realista e conduz em visitas guiadas a exposições. Convence-o mesmo a trocar a Faculdade de Direito, «infestada de reaccionários», pela Faculdade de Letras e a matricular-se em Histórico-Filosóficas, numa operação de aliciamento que culmina com a sua filiação nas Juventudes Comunistas. Muitos anos depois, no célebre «Portugal Amordaçado», escrito no exílio de Paris, Mário Soares inscreverá o seu nome na lista dos três homens que mais contribuíram para a sua formação política, ao lado de Agostinho da Silva e Álvaro Salema. Em Dezembro de 1940 regressa de novo à clandestinidade e é encarregado pela direcção do partido de pôr ordem na estrutura partidária do Norte. É o período mais confuso e conturbado da vida do PCP e aquele acerca do qual persistem mais dúvidas, só parcialmente desfeitas pelo esforçado trabalho de investigação de Pacheco Pereira. Em Dezembro de 1940 regressa de novo à clandestinidade e é encarregado pela direcção do partido de pôr ordem na estrutura partidária do Norte. É o período mais confuso e conturbado da vida do PCP e aquele acerca do qual persistem mais dúvidas, só parcialmente desfeitas pelo esforçado trabalho de investigação de Pacheco Pereira. O PCP está dividido entre «organizados» e «reorganizados», com duas direcção partidárias que disputam o controlo da organização e a influência sobre a classe operária. Os «organizados», dirigidos por Cansado Gonçalves, Velez Grilo e Vasco de Carvalho, pugnam por uma actuação mais moderada, tentando segurar a continuidade. Têm por referência Militão Ribeiro, que só sairá do Tarrafal em 1945. Álvaro Cunhal numa fotografia de polícia tirada pela PIDE A reorganização é liderada por Júlio Fogaça, que ao abrigo da «Amnistia dos Centenários» (decretada em 1940 para celebrar a independência de 1143 e sua restauração em 1640), fora libertado do Tarrafal. Quer um PCP mais firme e consequente e conquista para as suas posições outros destacados militantes (Sérgio Vilarigues, Pedro Soares, Américo de Sousa e Pires Jorge), libertados do Tarrafal ou de Angra. Juntam-se a eles José Gregório, Cândida Ventura e Piteira Santos; alguns dos que já tinham cumprido pena, como Cunhal e Manuel Guedes; e novos militantes operários que se tinham destacado nas organizações locais, como Dias Lourenço. A reorganização é liderada por Júlio Fogaça, que ao abrigo da «Amnistia dos Centenários» (decretada em 1940 para celebrar a independência de 1143 e sua restauração em 1640), fora libertado do Tarrafal. Quer um PCP mais firme e consequente e conquista para as suas posições outros destacados militantes (Sérgio Vilarigues, Pedro Soares, Américo de Sousa e Pires Jorge), libertados do Tarrafal ou de Angra. Juntam-se a eles José Gregório, Cândida Ventura e Piteira Santos; alguns dos que já tinham cumprido pena, como Cunhal e Manuel Guedes; e novos militantes operários que se tinham destacado nas organizações locais, como Dias Lourenço. A cisão torna-se violenta e cada uma das direcções publica o seu «Avante!». O grupo do agora «pequeno-burgês» Cansado Gonçalves chega ao ponto de acusar Cunhal e Fogaça, no jornal que controlam, de chefiar uma «quadrilha de gangsters». Mas a força está do outro lado: os opositores desarticulam-se, Cunhal e Fogaça vencem e o partido fica reunificado. A cisão torna-se violenta e cada uma das direcções publica o seu «Avante!». O grupo do agora «pequeno-burgês» Cansado Gonçalves chega ao ponto de acusar Cunhal e Fogaça, no jornal que controlam, de chefiar uma «quadrilha de gangsters». Mas a força está do outro lado: os opositores desarticulam-se, Cunhal e Fogaça vencem e o partido fica reunificado. A linha é agora leninista pura e dura: direcção colectiva, disciplina firme, vigor conspirativo e um corpo de militantes profissionais que se alarga progressivamente. Apesar dos ataques da polícia política continuarem — prendendo Fogaça, Pedro Soares e Pires Jorge — o aparelho clandestino ganha estabilidade. Em Novembro de 1942, após a prisão de Fogaça, devolvido ao Tarrafal (onde Bento Gonçalves, o secretário-geral morrera pouco antes), Cunhal, que partilhava o Secretariado com Manuel Guedes e José Gregório, ganha maior peso no Comité Central. O informe que apresenta ao Congresso de 1944 (III da série, I ilegal) é ainda dedicado à «Actividade do Grupelho Provocatório». No III Congresso, Cunhal ainda se ocupa da «actividade do grupelho provocatório» A polícia política continua a fazer estragos e em 1945 desmantela seis casas clandestinas e prende 16 dirigentes. Mas o partido reage. Explorando habilmente os sentimentos de revolta provocados pela fome e a degradação social originadas pela guerra na Europa, o PCP atinge em 1946 o número recorde de 4 mil militantes. É um das melhores fases da vida na clandestinidade. O artífice da proeza é Cunhal, que sai do IV Congresso, realizado na Lousã em 1946, como líder confiante e mentor ideológico. São dele as orientações sobre a criação das células de empresa, uma iniciativa que irá revelar-se de grande alcance. A polícia política continua a fazer estragos e em 1945 desmantela seis casas clandestinas e prende 16 dirigentes. Mas o partido reage. Explorando habilmente os sentimentos de revolta provocados pela fome e a degradação social originadas pela guerra na Europa, o PCP atinge em 1946 o número recorde de 4 mil militantes. É um das melhores fases da vida na clandestinidade. O artífice da proeza é Cunhal, que sai do IV Congresso, realizado na Lousã em 1946, como líder confiante e mentor ideológico. São dele as orientações sobre a criação das células de empresa, uma iniciativa que irá revelar-se de grande alcance. No IV Congresso, realizado na Lousã em 1946, o líder vai determinar todo o comportamento dos comunistas até ao 25 de Abril de 1974 No seu relatório ao Congresso da Lousã, «O Caminho para o Derrubamento do Fascismo», Cunhal há-de determinar em grande parte todo o comportamento dos comunistas até ao 25 de Abril. Ali se apela a um «levantamento nacional antifascista», que deverá contar com «todos os portugueses honrados», rejeitando as tendências legalistas da burguesia liberal e a plataforma de «transição» proposta pela Organização Comunista dos Presos do Tarrafal, bem como as tendências terroristas surgidas no partido após as greves de 1943. No seu relatório ao Congresso da Lousã, «O Caminho para o Derrubamento do Fascismo», Cunhal há-de determinar em grande parte todo o comportamento dos comunistas até ao 25 de Abril. Ali se apela a um «levantamento nacional antifascista», que deverá contar com «todos os portugueses honrados», rejeitando as tendências legalistas da burguesia liberal e a plataforma de «transição» proposta pela Organização Comunista dos Presos do Tarrafal, bem como as tendências terroristas surgidas no partido após as greves de 1943. Para consolidar a posição de liderança, Cunhal teve de afastar do caminho Júlio Fogaça e Pável, os dois únicos dirigentes do partido com capacidade para teorizar sobre questões políticas importantes e que intelectualmente lhe podiam fazer frente. A forma como se livrou de Pável, liquidado politicamente no exílio, após uma fuga do Aljube, ainda hoje está mal esclarecida. Acabou a leccionar no México, onde foi grande amigo do Prémio Nobel Octávio Paz. E a eliminação de Fogaça é ainda mais sinistra, envolvendo acusações de homossexualidade, expulsão, readmissão e nova expulsão. Não há quem o detenha. Em 1947, já Estaline iniciara a Guerra Fria com o Ocidente, confia a si próprio a missão de estreitar relações com o movimento comunista internacional. E desloca-se à URSS, à Checoslováquia e à Jugoslávia. É durante os longos anos de prisão em Peniche que Cunhal exercita os seus talentos para o desenho e a pintura Na madrugada de 25 de Março de 1949, Cunhal é preso pela terceira vez — juntamente com Militão Ribeiro, Sofia Ferreira, José Martins e António Lopes Bastos — numa casa clandestina do Casal de Santo António, no Luso. Convencida de que o denunciante tinha sido Manuel Domingues, um operário vidreiro da Marinha Grande que era membro do «bureau» político do Comité Central, a direcção do PCP manda assassiná-lo dois anos depois. O episódio ocorreu numa época em que o aparelho clandestino estava instalado em pequenas aldeias da província, o que veio a revelar-se um erro clamoroso. As movimentações dos que iam e vinham constantemente «visitar o primo tuberculoso» eram mais facilmente detectáveis ali do que nas grandes cidades. O partido acabou por reconhecer internamente ter-se tratado de um erro, mas nunca até hoje o assumiu publicamente. Afinal, Cunhal tinha sido denunciado pelo presidente da Câmara de Águeda, José Feio, que residia no Luso e comunicou a presença dos estranhos a Manuel Louzada, que acumulava as funções de presidente da Câmara da Mealhada com as de informador da PIDE. Cercada pela GNR, a residência foi assaltada pela PIDE que apanhou Cunhal a dormir, algemando-o ainda de pijama, e deitou a mão a um importantíssimo arquivo, desferindo um dos mais rudes golpes sofridos pela organização comunista, que não voltaria a ser a mesma. Na madrugada de 25 de Março de 1949, Cunhal é preso pela terceira vez — juntamente com Militão Ribeiro, Sofia Ferreira, José Martins e António Lopes Bastos — numa casa clandestina do Casal de Santo António, no Luso. Convencida de que o denunciante tinha sido Manuel Domingues, um operário vidreiro da Marinha Grande que era membro do «bureau» político do Comité Central, a direcção do PCP manda assassiná-lo dois anos depois. O episódio ocorreu numa época em que o aparelho clandestino estava instalado em pequenas aldeias da província, o que veio a revelar-se um erro clamoroso. As movimentações dos que iam e vinham constantemente «visitar o primo tuberculoso» eram mais facilmente detectáveis ali do que nas grandes cidades. O partido acabou por reconhecer internamente ter-se tratado de um erro, mas nunca até hoje o assumiu publicamente. Afinal, Cunhal tinha sido denunciado pelo presidente da Câmara de Águeda, José Feio, que residia no Luso e comunicou a presença dos estranhos a Manuel Louzada, que acumulava as funções de presidente da Câmara da Mealhada com as de informador da PIDE. Cercada pela GNR, a residência foi assaltada pela PIDE que apanhou Cunhal a dormir, algemando-o ainda de pijama, e deitou a mão a um importantíssimo arquivo, desferindo um dos mais rudes golpes sofridos pela organização comunista, que não voltaria a ser a mesma. «Desenhos da Prisão», Álvaro Cunhal O assassinato de Manuel Domingues, que tinha participado no 18 de Janeiro de 1934 e se tornara uma referência mítica do PCP, é ainda hoje assunto tabu, motivo de embaraços para os comunistas. O operário vidreiro — que estivera em Espanha, nas Brigadas Internacionais, passa pela resistência francesa e controla homens como Mário Soares, Salgado Zenha e Piteira Santos — era, afinal, um homem sério e um comunista puro. A prova só foi tirada na devassava aos arquivos da PIDE, tomados de assalto pelo PCP logo a seguir ao 25 de Abril. Aí se explica a injustiça do crime e se demonstra que a forma como Cunhal fora descoberto se deveu apenas à ingenuidade organizativa. O assassinato de Manuel Domingues, que tinha participado no 18 de Janeiro de 1934 e se tornara uma referência mítica do PCP, é ainda hoje assunto tabu, motivo de embaraços para os comunistas. O operário vidreiro — que estivera em Espanha, nas Brigadas Internacionais, passa pela resistência francesa e controla homens como Mário Soares, Salgado Zenha e Piteira Santos — era, afinal, um homem sério e um comunista puro. A prova só foi tirada na devassava aos arquivos da PIDE, tomados de assalto pelo PCP logo a seguir ao 25 de Abril. Aí se explica a injustiça do crime e se demonstra que a forma como Cunhal fora descoberto se deveu apenas à ingenuidade organizativa. Com o general Humberto Delgado, em Paris Disposta a ajustar contas, a polícia política endurece o tratamento dispensado ao mais perigoso dirigente comunista. Cunhal é mantido em regime de «isolamento absoluto», numa cela entre duas outras vazias, para não poder contactar ninguém, vigiado dia e noite por agentes da PIDE. Apesar de incomunicável durante 14 meses, não denuncia camaradas, recusando-se a falar o que quer que fosse. A pujança dos seus 35 anos e a fibra do seu carácter, endurecidos por nove anos de clandestinidade, determinam o comportamento. Os polícias ficam mais irritados ainda e recusam-se até a cumprir a ordem do director da prisão para que lhe fosse entregue «material de escrita». Disposta a ajustar contas, a polícia política endurece o tratamento dispensado ao mais perigoso dirigente comunista. Cunhal é mantido em regime de «isolamento absoluto», numa cela entre duas outras vazias, para não poder contactar ninguém, vigiado dia e noite por agentes da PIDE. Apesar de incomunicável durante 14 meses, não denuncia camaradas, recusando-se a falar o que quer que fosse. A pujança dos seus 35 anos e a fibra do seu carácter, endurecidos por nove anos de clandestinidade, determinam o comportamento. Os polícias ficam mais irritados ainda e recusam-se até a cumprir a ordem do director da prisão para que lhe fosse entregue «material de escrita». O seu julgamento, que decorre entre os dias 3 e 10 de Maio de 1950 no Tribunal Plenário de Lisboa, ficará como referência para a história da resistência, e contribuirá decisivamente para adensar a lenda: assumindo a condição de comunista e «filho adoptivo do proletariado», Cunhal profere no tribunal plenário um ataque cerrado à ditadura salazarista e à polícia política, exaltando o papel e a orientação política do partido. O advogado de defesa é o pai, Avelino Cunhal. Condenado quando já estava preso há mais de um ano, passa mais dez anos na prisão, em condições de extrema dureza: quase sete anos em total isolamento e mais de um ano incomunicável. O objectivo era fazê-lo ceder, mas a estratégia não resulta. Cunhal não só não denuncia uma vez mais os camaradas, como assume longos períodos de total silêncio. É nesse tormentoso tempo de solidão que exercita o gosto pelo desenho, produzindo obras notáveis, com o povo por herói. Numa operação extremamente bem montada pelo aparelho clandestino, que começa a ganhar fama de «máquina perfeita», irrompe subitamente a nível internacional um movimento de solidariedade, reclamando a sua libertação. É encabeçado por figuras tão prestigiadas quanto Jorge Amado e Pablo Neruda, o futuro Prémio Nobel chileno, que lhe dedica mesmo um poema: «Lámpara Marina». Inicialmente, Cunhal é mantido na Penitenciária de Lisboa, mas ao fim de oito anos, por razões de segurança, é transferido para a prisão de Peniche, considerada fortaleza inexpugnável. Tanto melhor para o partido. Com a ajuda preciosa de um guarda da GNR subornado, a 3 de Janeiro de 1960 protagoniza a mais espectacular fuga de toda a ditadura, escalando os muros do forte na companhia de nove destacados dirigentes do partido. Com Palma Carlos, de quem foi ministro sem pasta, no I Governo Provisório, a seguir ao 25 de Abril A fuga é planeada por Pires Jorge, que se encontrava em liberdade, e preparada ao pormenor. Na tarde da evasão, um carro — que deveria ter sido conduzido pelo actor Rogério Paulo, que à última hora se retraiu — parou num largo de Peniche, visível do interior da cadeia, e o condutor abriu o porta-bagagens, observando durante longos segundos o seu interior. Era o sinal. Transportados em dois carros até ao cruzamento do Baleal, os foragidos dividiram-se em dois grupos. Cunhal tomou lugar no Studbaker conduzido por Rui Perdigão, que, graças às suas origens burguesas, o tinha comprado às próprias custas, e dirigiu-se a Lisboa. Não sem antes Pires Jorge ter posto «ordem na casa» e obrigado Cunhal a respeitar o destino escolhido com um estrondoso: «Quem manda aqui sou eu!». Só uma hora depois soa o alarme no Forte de Peniche e a caça ao homem começa. Sem sucesso. Com a fuga, Álvaro Cunhal ganha o estatuto de líder absoluto, indiscutível, lendário. A fuga é planeada por Pires Jorge, que se encontrava em liberdade, e preparada ao pormenor. Na tarde da evasão, um carro — que deveria ter sido conduzido pelo actor Rogério Paulo, que à última hora se retraiu — parou num largo de Peniche, visível do interior da cadeia, e o condutor abriu o porta-bagagens, observando durante longos segundos o seu interior. Era o sinal. Transportados em dois carros até ao cruzamento do Baleal, os foragidos dividiram-se em dois grupos. Cunhal tomou lugar no Studbaker conduzido por Rui Perdigão, que, graças às suas origens burguesas, o tinha comprado às próprias custas, e dirigiu-se a Lisboa. Não sem antes Pires Jorge ter posto «ordem na casa» e obrigado Cunhal a respeitar o destino escolhido com um estrondoso: «Quem manda aqui sou eu!». Só uma hora depois soa o alarme no Forte de Peniche e a caça ao homem começa. Sem sucesso. Com a fuga, Álvaro Cunhal ganha o estatuto de líder absoluto, indiscutível, lendário. Obrigado a passar à clandestinidade, em resultado da sua participação na fuga, Rui Perdigão é colocado na Rádio Portugal Livre, que emite a partir de Bucareste, na Roménia, sob controlo directo de Cunhal, aí exilado. Dessa redacção fazem parte Carlos Antunes (futuro dirigente do PRP/BR) e Isaura Moreira, companheira de Cunhal. Os relatos do filho de Rui Perdigão, que passa a ir à escola em Bucareste, sobre as condições de vida dos seus colegas, são o «clic» que desperta a consciência do funcionário do PCP para o lado escondido do «socialismo real» e o leva, mais tarde, a abandonar a militância. «Olhe que não, olhe que não!» Uma frase que entrou na história proferida durante o debate televisivo com Mário Soares em 1975 Em Peniche, Cunhal exercitara pela primeira vez os seus talentos no campo da pintura a óleo. José Carlos de Vasconcelos conta na terceira pessoa, na entrada de uma entrevista publicada em 1997, uma confidência de Cunhal a esse propósito: «Uma vez deixaram entrar na cadeia tintas e uma tábua, relativamente grande. Foi a primeira vez que pintou a óleo — e até pintou a tábua... dos dois lados! Quando, com outros camaradas, conseguiu realizar a famosa fuga do velho e (então) sinistro forte, a tábua, claro, ficou lá. Mas após o 25 de Abril foi encontrada numa arrecadação pelos militares que o ocuparam, e um dia, ainda em 1974, era ministro sem pasta, foram a S. Bento entregar-lha». Em Peniche, Cunhal exercitara pela primeira vez os seus talentos no campo da pintura a óleo. José Carlos de Vasconcelos conta na terceira pessoa, na entrada de uma entrevista publicada em 1997, uma confidência de Cunhal a esse propósito: «Uma vez deixaram entrar na cadeia tintas e uma tábua, relativamente grande. Foi a primeira vez que pintou a óleo — e até pintou a tábua... dos dois lados! Quando, com outros camaradas, conseguiu realizar a famosa fuga do velho e (então) sinistro forte, a tábua, claro, ficou lá. Mas após o 25 de Abril foi encontrada numa arrecadação pelos militares que o ocuparam, e um dia, ainda em 1974, era ministro sem pasta, foram a S. Bento entregar-lha». Na primeira grande reunião do Comité Central em que participa depois da fuga, em Fevereiro, é chamado de novo ao Secretariado. Passa os primeiros dois anos em Portugal, na mais prudente clandestinidade, trocando constantemente de casa e de terra: Sintra, Ericeira, Amadora, Coimbra, Porto. Depois de exercer o seu direito de voto nas eleições presidenciais de Janeiro de 2001 Em meados de 1960, radica-se em Paris. No dia de Natal desse ano é pai pela primeira e única vez, apesar de ter permanecido, à semelhança de Salazar, solteiro a vida toda. Tinha 47 anos. Ana, a menina, é filha de Isaura Maria Moreira, a camarada por quem Cunhal se apaixonou a seguir à fuga de Peniche (uma mulher bonita, de origem operária), mas com quem nunca chegou a casar. A circunstância desconcertante de Cunhal se ter apaixonado pela irmã de Isaura, com quem passou a viver, determinou que assim fosse. Os encontros e desencontros amorosos eram, de resto, uma característica do universo concentracionário da clandestinidade. Em meados de 1960, radica-se em Paris. No dia de Natal desse ano é pai pela primeira e única vez, apesar de ter permanecido, à semelhança de Salazar, solteiro a vida toda. Tinha 47 anos. Ana, a menina, é filha de Isaura Maria Moreira, a camarada por quem Cunhal se apaixonou a seguir à fuga de Peniche (uma mulher bonita, de origem operária), mas com quem nunca chegou a casar. A circunstância desconcertante de Cunhal se ter apaixonado pela irmã de Isaura, com quem passou a viver, determinou que assim fosse. Os encontros e desencontros amorosos eram, de resto, uma característica do universo concentracionário da clandestinidade. Em Março de 1961 é eleito secretário-geral do PCP. A decisão tem uma importância absolutamente extraordinária, já que o cargo se encontrava vago há 19 anos, desde a morte de Bento Gonçalves no campo de concentração do Tarrafal. No ano seguinte é enviado para Moscovo, por razões de segurança. De acordo com a biografia oficial, permanece quatro anos seguidos na capital soviética, acolhido como herói, deslocando-se de quando em vez à Roménia, onde Isaura Moreira vive com a filha. A verdade, porém, é outra. A residência permanente de Cunhal é Paris, já que o isolamento e a limitação às liberdades no países de Leste não lhe permitia dirigia a partir daí o partido. A circunstância desse «pormenor» ser difícil de explicar, faz com que se tenha alterado a verdade. Na capital francesa é testemunha directa do Maio de 68. Usa boina basca e diz chamar-se António de Sousa. É em Paris que se encontra ainda a 25 de Abril de 1974. Cumpridos doze anos de exílio, regressa a Portugal a 30 de Abril de 1974 e a 15 de Maio toma posse como ministro sem pasta do I Governo Provisório, presidido pelo advogado Adelino da Palma Carlos, seu antigo professor de Direito, discretamente escolhido pela Maçonaria, representada pelo Grande Oriente Lusitano. Mário Soares, com a intenção de o envolver ainda mais numa situação que se adivinhava difícil e o impedir, dessa forma, de capitalizar politicamente o descontentamento à esquerda, ainda o tenta levar a assumir, com a cumplicidade de Spínola, a pasta de ministro do Trabalho. Mas ele recusa. O PCP está mais forte do que nunca, saído da clandestinidade com mais de dez mil militantes inscritos, um sector intelectual poderosíssimo e influência em múltiplas áreas da sociedade. Os anos de 1972-73 tinham sido a sua época de ouro, crescendo graças à deterioração da situação social e política do país, à abertura e ao descrédito da «primavera Marcelista» e à correlação de forças no plano internacional. O Congresso da Oposição, em Aveiro, tinha fortalecido a sua base social de apoio. E o partido tinha dado um apoio estimável ao Movimento dos Capitães. Embora não tenha aderido oficialmente à preparação do golpe militar, foi o PCP — através do actual presidente da Câmara de Évora, Abílio Fernandes, e de Lino de Carvalho, hoje deputado — que arranjou o local onde a 9 de Setembro de 1973 se realizou a histórica reunião do MFA: o Monte Sobral, em Alcáçovas. Exonerado a 11 de Julho de 1974, na sequência da demissão de Palma Carlos, Cunhal regressa ao Governo seis dias depois, para as mesmas funções, a convite do novo primeiro-ministro Vasco Gonçalves, o general comunista que nunca se chegou a filiar no PCP. Mantém-se como ministro em mais dois governos — o III e o IV provisórios — abandonando definitivamente funções em Agosto de 1975, quando o Verão revolucionário começa a «aquecer». É a época em que sonha, mais intensamente do que nunca, estimulado pelo 11 de Março, com uma nova revolução que aproxime Portugal dos modelos socialistas de Leste. Eleito deputado logo em 1975, quando é formada a Assembleia Constituinte, mantém o lugar até 1991, embora dedique muito pouco tempo e atenção à vida parlamentar. A democracia representativa não lhe interessa. Prefere a democracia directa controlada pelo aparelho partidário, a via sindical, a agitação de rua. Numa célebre entrevista a Oriana Fallacci, concedida no Verão de todos os desassossegos, chega a «garantir» que o parlamentarismo não vingará em Portugal. Mas engana-se. «Olhe que não, sotôr, olhe que não». A resposta nervosa a Mário Soares, que o acusa de querer «transformar o país numa ditadura», demarca com uma nitidez nunca antes percebida a existência de dois campos na esquerda. É o grande frente-a-frente, o primeiro debate televisivo a sério da jovem democracia portuguesa. A emissão faz parar o país, como se da final de um campeonato do Mundo de futebol envolvendo a selecção nacional se tratasse, a 6 de Novembro de 1975. Aproxima-se o momento decisivo da viragem política de Portugal. O homem que já tinha admitido viver bem com o salário mínimo nacional, numa manifestação ingénua de ortodoxia e estalinismo, está prestes a ser derrotado. Perde o debate com Mário Soares e deixa crescer a ideia de que os comunistas são uns indivíduos dispostos a bater-se por causas inexplicáveis, comandadas do exterior, sem ligação concreta à realidade. A piada da «cassette» ganha a dimensão do ridículo. Aproximam-se tempos fatais para as ambições de poder do líder comunista. O fracasso da tentativa de golpe lançado pelo PCP e pela esquerda militar em 25 de Novembro de 1975, muda definitivamente o rumo à História, impondo a Álvaro Cunhal a maior derrota de sempre, da qual o PCP não se recomporá nunca. Empurrado pelo «Grupo dos Nove», o contragolpe sai vitorioso. O líder comunista percebe isso de imediato e ordena, na madrugada de 25 para 26 de Novembro, a retirada de todos os militantes das manifestações de massas. O gesto poderá não ter sido decisivo, como pretendem alguns comunistas, para evitar a guerra civil, mas deu um contributo significativo à inviabilização de uma ameaça que chegou a estar iminente. À medida que a democracia se consolida, as contradições internas agudizam-se no PCP. Mas Cunhal está atento aos desvios. Em Abril de 1987 começa a reunir clandestinamente com Vital Moreira e Veiga de Oliveira, os rostos visíveis do «Grupo dos Seis», que reclamam a abertura do partido, ainda apegado ao programa da clandestinidade. As discussões prolongam-se por mais de meio ano, mas são sacudidas a meio pelas eleições de Julho, em que Cavaco Silva conquista a primeira maioria absoluta. Os contestatários ganham novos argumentos, mas o velho dirigente resiste. No sentido de desmantelar a contestação, transforma as reuniões do Comité Central preparatórias do XII Congresso, agendado para o final do ano, em sessões de clarificação interna, apostadas em identificar os apoiantes dos «renegados». Consegue controlar a situação e afastar os «inimigos internos». Aos 75 anos o coração começa a dar sinais de preocupação. Em Janeiro de 1989, em plena «Perestroika», acaba por ceder à pressão dos médicos e deixa-se internar numa clínica de Moscovo, para ser submetido a uma intervenção cirúrgica cardiovascular. Passa cinco meses em recuperação, regressando a Portugal em Junho. Em 1992, afasta-se formalmente do cargo de secretário-geral do PCP, cedendo o lugar a Carlos Carvalhas, e passa a figurar na estrutura do «bureau» político como Presidente do Conselho Nacional do PCP — organismo e função nunca antes existentes e que tiveram vidas efémeras, por não possuírem funcionalidade interna. Renuncia, na altura, também, ao Conselho de Estado, para onde fora nomeado dez anos antes. Baralhando os observadores mais mal informados, dá para o exterior a ideia de que começa uma nova etapa da sua vida, dedicada sobretudo à escrita, mas tudo não passa de encenação. Descontado o facto de ter aumentado o ordenado aos funcionários, que só na década de 90 deixaram de estar sujeitos ao salário mínimo nacional, Carvalhas não se afirma, nem ganha autoridade. Cunhal continua a ser a figura tutelar e de referência ideológica e política do PCP, como deixou claramente demonstrado no Congresso de Dezembro do ano passado, onde voltou a delimitar o caminho a seguir, usando como mensageiro o actor Morais e Castro, protagonista de uma cena teatral. Vinte cinco anos passados sobre o «Verão Quente» de 75, na sua última entrevista ao EXPRESSO — em que só contou o que já tinha decidido contar antes de ser confrontado com as perguntas, como sempre fez com os jornalistas — a interpretação que faz dos acontecimentos é impressionantemente igual à conclusão que havia tirado a quente: «As forças do capital de todo o mundo, ao verem o curso da revolução em Portugal — uma revolução profundamente popular e militar, com transformações de carácter económico e social, mercê da grande influência dos comunistas — mobilizaram-se no sentido de impedir tal processo, seguindo o que se chamou ‘a linha estratégica da CIA’». A decrepitude dos últimos anos não reduziu minimamente a força da sua intervenção. Omnipresente, passou a fazer-se representar por Domingos Abrantes e Francisco Lopes, os «eleitos» que detêm o privilégio do contacto directo, assumindo-se internamente como porta-vozes oficiais, ecos de «uma mente lúcida numa voz enfraquecida». A influência de Álvaro Cunhal no PCP — onde continua a ser o homem determinante, que dirime com mão de ferro as divergências (as que vêm e as que não vêm a público) — dificilmente desaparecerá, mesmo depois da sua morte. Precavendo já futuras tentativas de mudança de rumo, os seus seguidores mais fiéis preparam-se há já algum tempo para assumir a condição de herdeiros ideológicos. Como diz um antigo membro do Comité Central, que conhece bem a realidade por dentro, «vai ser muito difícil libertar o partido da sua imagem tutelar». A influência de Álvaro Cunhal no PCP — onde continua a ser o homem determinante, que dirime com mão de ferro as divergências (as que vêm e as que não vêm a público) — dificilmente desaparecerá, mesmo depois da sua morte. Precavendo já futuras tentativas de mudança de rumo, os seus seguidores mais fiéis preparam-se há já algum tempo para assumir a condição de herdeiros ideológicos. Como diz um antigo membro do Comité Central, que conhece bem a realidade por dentro, «vai ser muito difícil libertar o partido da sua imagem tutelar». Os símbolos, quando se tornam etéreos, diluídos na memória colectiva com o propósito explícito de gerar efeitos polifónicos, tornam o debate de ideias mais difícil ainda. Quando deixar de ser possível confrontar o ideólogo com as suas ideias, não faltará quem apelide de traidores os que apelam à mudança. Num país economicamente deficitário, onde subsistem dois milhões e meio de pobres, a mudança dependerá mais da qualidade da democracia, das condições de repartição da riqueza, do que da mobilização e força da frente anticunhalista. O mito é já mais forte do que o homem. 60

Um bom garfo É um apreciador excelentíssimo da cozinha tradicional portuguesa A voracidade é uma das características menos conhecidas da personalidade de Álvaro Cunhal. Quem o conheceu de perto, e partilhou com ele raros momentos de intimidade, guarda desse privilégio a memória de situações de exagero. Era um verdadeiro glutão a comer e um apreciador excelentíssimo da cozinha tradicional portuguesa. A voracidade é uma das características menos conhecidas da personalidade de Álvaro Cunhal. Quem o conheceu de perto, e partilhou com ele raros momentos de intimidade, guarda desse privilégio a memória de situações de exagero. Era um verdadeiro glutão a comer e um apreciador excelentíssimo da cozinha tradicional portuguesa. O seu apetite insaciável manteve-se ao longo dos anos. Talvez fosse uma forma - admitem os dirigentes mais condescendentes com o pecado da gula - de compensar as privações sofridas na prisão e na longa clandestinidade. Cunhal não resistia a um bom petisco, sobretudo tratando-se de pratos regionais, mas sempre a recato de olhares curiosos. As raras ocasiões em que abriu as defesas e deixou perceber o prazer que sentia pela boa mesa verificaram-se na festa do «Avante!». Frequentador assíduo do «stand» das Beiras, nunca perdia a bela chanfana trazida pelos camaradas da Lousã. Como não prescindia de saborear a caldeirada que os pescadores comunistas preparavam a preceito em sua honra.

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COMENTÁRIOS AO ARTIGO

14 comentários 1 a 10

14 de Setembro de 2001 às 14:10

Raquel

Tenho pena que as pessoas não se consigam desligar da sua côr politica, nem os próprios jornais, nem os partidos politicos, que democracia é esta em que vivemos que vive de informações e contra-informações,acreditem que nem toda a gente é estupida ainda há algumas pessoas que pensam, apesar de todas estas informações !

Acho que pelo menos este senhor A.C. deu provas que sonhou um dia e que tentou tornar esse sonho realidade. Se era um sonho bom ou não não sei mas gostaria que ele se deixa-se entrevistar por alguem que não seja nem jornalista nem politico e sem arrogância para podermos saber algo sobre este homem que no minimo se pode dizer que seja interessante como muitos outros em Portugal.

12 de Setembro de 2001 às 23:53

Ocunhal é um troca-tintas

O Sr.Cunhal contrariamente ao que os seus colegas políticos, que como ele nunca fizeram nada na vida nunca souberam o que é ser operário esses senhores dizemque oCunhal é Estalinista. Isso é uma provocação ao homem que parou o Hitler quando os outros se borravam de medo.

1- Quando Estaline morreu o Cunhal e todos os membros do PC passaram a atacar Estaline.

2- Apoio a repressão em Praga

3- Alterou os Estatutos do PC no que concerne à ditadura do proletariado eàluta armada para a conquista do poder que segundo reza Marx e estaline são fundamentos do Comunismo.

Este homem só teve algo em que foi sempre coerente: a sua obediência "canina" ao "Sol" de Moscovo que alimentava o seu oportunismo e carreirismo político e alimentava também o seu PC com Rublos. Um vendido a uma superpotência estrangeira, que é neste momento um urso ferido que ainda vai fazer sofrer muita gente.

Quem o safa é o "maoista" Pereira

12 de Setembro de 2001 às 23:53

Ocunhal é um troca-tintas

O Sr.Cunhal contrariamente ao que os seus colegas políticos, que como ele nunca fizeram nada na vida nunca souberam o que é ser operário esses senhores dizemque oCunhal é Estalinista. Isso é uma provocação ao homem que parou o Hitler quando os outros se borravam de medo.

1- Quando Estaline morreu o Cunhal e todos os membros do PC passaram a atacar Estaline.

2- Apoio a repressão em Praga

3- Alterou os Estatutos do PC no que concerne à ditadura do proletariado eàluta armada para a conquista do poder que segundo reza Marx e estaline são fundamentos do Comunismo.

Este homem só teve algo em que foi sempre coerente: a sua obediência "canina" ao "Sol" de Moscovo que alimentava o seu oportunismo e carreirismo político e alimentava também o seu PC com Rublos. Um vendido a uma superpotência estrangeira, que é neste momento um urso ferido que ainda vai fazer sofrer muita gente.

Quem o safa é o "maoista" Pereira

12 de Setembro de 2001 às 10:42

Anonymous

o belíssimo poema "La Lâmmpara Marina, de Pablo Neruda, que todos os Portugueses deveriam conhecer, recora não só Cunhal, mas Militão, Bento Gonçalves....

La Lámpara Marina

Pablo Neruda

El Puerto

Color de cielo

Cuando tú desembarcas

en Lisboa,

cielo celeste y rosa rosa,

estuco blanco y oro,

pétalos de ladrillo,

las casas,

las puertas,

los techos,

las ventanas,

salpicadas del oro limonero,

del azul ultramar de los navíos.

Cuando tú desembarcas

no conoces,

no sabes que detrás de las ventanas

escuchan,

rondan

carceleros de luto,

retóricos, correctos,

arreando presos a las islas,

condenando al silencio,

pululando

como escuadras de sombras

bajo ventanas verdes,

entre montes azules,

la policía

bajo las otoñales cornucopias

buscando portugueses,

rascando el suelo,

destinando los hombres a la sombra.

II

La Cítara

Olvidada

Oh Portugal hermoso

cesta de fruta y flores,

emerges

en la orilla plateada del océano,

en la espuma de Europa,

con la cítara de oro

que te dejó Camoens,

cantando con dulzura,

esparciendo en las bocas del Atlántico

tu tempestuoso olor de vinerías,

de azahares marinos,

tu luminosa luna entrecortada

por nubes y tormentas.

III

Los presidios

Pero,

portugués de la calle,

entre nosotros,

nadie nos escucha,

sabes

dónde

está Álvaro Cunhal?

Reconoces la ausencia

del valiente

Militão?

Muchacha portuguesa,

pasas como bailando

por las calles

rosadas de Lisboa,

pero,

sabes dónde cayó Bento Gonçalves,

el portugués más puro,

el honor de tu mar e de tu arena?

Sabes

que existe

una isla,

la isla de la Sal,

y Tarrafal en ella

vierte sombra?

Sí, lo sabes, muchacha,

muchacho, sí, lo sabes.

En silencio

la palabra

anda con lentitud pero recorre

no sólo el Portugal, sino la tierra.

Sí, sabemos,

en remotos países,

que hace treinta años

una lápida

espesa como tumba o como túnica

de clerical murciélago,

ahoga, Portugal, tu triste trino,

salpica tu dulzura

con gotas de martirio

y mantiene sus cúpulas de sombra.

IV

El Mar

Y Los Jazmines

De tu mano pequeña en otra hora

salieron criaturas

desgranadas

en el asombro de la geografia.

Así volvió Camoens

a dejarte una rama de jazmines

que siguió floreciendo.

La inteligencia ardió como una viña

de transparentes uvas

en tu raza.

Guerra Junqueiro entre las olas

dejó caer su trueno

de libertad bravía

que transportó el océano en su canto,

y otros multiplicaron

tu esplendor de rosales y racimos

como si de tu territorio estrecho

salieran grandes manos

derramando semillas

para toda la tierra.

Sin embargo,

el tiempo te ha enterrado.

El polvo clerical

acumulado en Coimbra

cayó en tu rostro

de naranja oceánica

y cubrió el esplendor de tu cintura.

V

La Lámpara

Marina

Portugal,

vuelve al mar, a tus navíos,

Portugal, vuelve al hombre, al marinero,

vuelve a la tierra tuya, a tu fragancia,

a tu razón libre en el viento,

de nuevo

a la luz matutina

del clavel y la espuma.

Muéstranos tu tesoro,

tus hombres, tus mujeres.

No escondas más tu rostro

de embarcación valiente

puesta en las avanzadas de Océano.

Portugal, navegante,

descubridor de islas,

inventor de pimientas,

descubre el nuevo hombre,

las islas asombradas,

descubre el archipélago en el tiempo.

La súbita

aparición

del pan

sobre la mesa,

la aurora,

tú, descúbrela,

descubridor de auroras.

Cómo es esto?

Cómo puedes negarte

al ciclo de la luz tú que mostraste

caminos a los ciegos?

Tú, dulce y férreo y viejo,

angosto y ancho padre

del horizonte, cómo

puedes cerrar la puerta

a los nuevos racimos

y al viento con estrellas del Oriente?

Proa de Europa, busca

en la corriente

las olas ancestrales,

la marítima barba

de Camoens.

Rompe

las telaranãs

que cubren tu fragrante arboladura,

y entonces

a nosotros los hijos de tus hijos,

aquellos para quienes

descubriste la arena

hasta entonces oscura

de la geografía deslumbrante,

muéstranos que tú puedes

atravesar de nuevo

el nuevo mar oscuro

y descubrir al hombre que ha nacido

en las islas más grandes de la tierra.

Navega, Portugal, la hora

llégó, levanta

tu estatura de proa

y entre las islas y los hombres vuelve

a ser camino.

En esta edad agrega

tu luz, vuelve a ser lámpara:

aprenderás de nuevo a ser estrella.

Poema extraído de Obras Completas, 3ª ed. aumentada, Buenos Aires, Editorial Losada, Col. Cumbre, 1967

11 de Setembro de 2001 às 23:38

Anonymous

Sr. Rui Ochoa, afirma factos no seu artigo, muito graves.Vou relembrá-lo :

-...minudências de que é feita a existência

- Homem obsessivamente misterioso

- compará-lo a Salazar ????por favor...

-ele explora os seus camaradas de forma admirável...????

Realmente uma vergonha

11 de Setembro de 2001 às 23:31

Anonymous

Só tenho pena, que haja quem chame os comunistas de fanáticos, mas, pelos comentários aqui feitos, pergunto-me??? Quem são so fanáticos ??? Independentemente, da pessoa em questão, o Dr. àlvaro Cunhal, que a todos neste país, só deu exemplos de honestidade, trabalho e integridade, este artigo, está mal construído de vários pontos de vista,. Tem factos errados, completamente distorcidos... Tenha dó Sr. Rui Ochoa, prepare-se melhor, não está a lidar com o público da revista Maria.

11 de Setembro de 2001 às 08:29

Anonymous

Pois claro que a História o absolverá. A "História" escrita pelos Fernando Rosas, pelos Mattosos e todos os outros comunas que controlam o ensino da História em Portugal. É como a conversa do "Ouro Nazi".

10 de Setembro de 2001 às 11:11

JOTA

Cometeste erros,mas não te vendeste!!! A história te absolverá, ao mesmo tempo que condenará esses que "venderam" amigos com o único fim de serem presidentes da República!!!

9 de Setembro de 2001 às 07:13

André Brito

Muitos comunistas lutaram e sacrificaram-se por um mundo melhor. Mas se não fossem tão ingénuos, cegos e fanáticos teriam percebido que o que estavam a fazer era a ajudar uma máfia internacional a tomar o poder em todos os países do mundo para escravizar e arruinar todos os povos. Muitos só perceberam isso quando chegaram ao gulag, ou por cá eram levados para uma praia para levarem um tiro na cabeça, que seria atribuído à PIDE. Outros ainda não perceberam, e nunca irão perceber o conto do vigário em que acreditam e em que querem fazer outros acreditar.

8 de Setembro de 2001 às 17:00

azul

eu só digo que bem vistas as coisas os comunistas foram os unicos que sofreram e lutaram por um ideal bom ou mau era la com eles mas foram os unicos e depois do sofrimento deles é que apareceram com a democracia os abutres e os tachistas ,desculpem mas é verdade.

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