Suplemento Mil Folhas

13-02-2002
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Continuam

Sábado, 9 de Fevereiro de 2002

Adriana Molder

No Museu de Arte Moderna de Sintra, há uma "última sala do museu [que] está assombrada", escreve Adriana Molder a propósito da instalação de desenhos que aí apresenta. É, de facto, uma instalação: pendurados em torno da luz verde que emana do chão, estes desenhos a preto e branco podem ver-se de um lado e de outro do papel, o que reforça a sua fragilidade. Sobre um finíssimo papel de esquisso A. Molder dá vida a personagens às quais a fragilidade do papel confere um carácter diáfano. São figuras hieráticas de uma extrema dignidade dentro da sua evanescência. A capacidade de erguer um pequeno teatro silencioso está comprovada. Temos, no entanto, dificuldade em acompanhar a artista nesta sua associação de universos. Joana Neves

Adriana Molder SINTRA, Museu de Arte Moderna, Avenida Heliodoro Salgado, tel. 219 248 170, de terça a dom., das 10h às 18h, até dia 17 de Fevereiro.

Fernando Calhau

A exposição que Fernando Calhau nos propõe na pequena sala da Promontório Arquitectos corresponde à simplicidade a que o artista nos habituou. De um lado temos uma obra em néon, de outro sete quadros pretos com mancha branca a aerógrafo. O néon ostenta a seguinte frase em inglês: "Isto não é uma paisagem." As obras interpelam-se uma à outra, requalificando-se e reinterpretando-se. Será que os quadros ameaçam ser uma paisagem, que o néon desmente, e, ao desmentir, afirma a verdadeira tensão da obra entre uma imagem que se refere apenas a si mesma, ao preto, à tela, à superfície e outra que simbolicamente refere um referente perdido? Cabe ao espectador colocar-se no seio desta luta, que dinamiza, pela sua observação e posicionamento em relação aos dois pólos da exposição. J.N.

Fernando Calhau LISBOA, Promontório Arquitectos, Rua Fábrica Material de Guerra nº 10 (ao Poço do Bispo), tel. 218 620 970, de segunda a sexta, das 10h às 20h30, até dia 22 de Fevereiro.

Tacita Dean

O trabalho de Tacita Dean (Canterbury, 1965) situa-se na proximidade do de um detective. É no decurso das suas investigações que nascem muitas das suas obras, seja a tentativa de localizar a "Spiral Jetty", de Robert Smithson, seja a procura de elementos acerca de Donald Crowhurst, um navegador que desapareceu misteriosamente no oceano enquanto tentava falsear uma viagem de circum-navegação - e, neste caso, são muitos os paralelismos com outras situações ligadas à história da arte e da literatura do século XX: Arthur Cravan e Bas Jan Ader, por exemplo. Em Serralves, a artista britânica procurou estabelecer algumas afinidades com a mostra "Trabalhos de Campo", que reúne trabalhos de Robert Smithson e Bernd e Hilla Becher. Em "From Columbus, Ohio to the Partially Buried Woodshed" (1999), Dean faz referência a uma criação do norte-americano, enquanto na série fotográfica "Baobab" (o embondeiro do "Principezinho") realiza um comentário irónico às imagens da dupla alemã. Destaque para os filmes "Bubble House" (1999) - que parte das imagens das ruínas de uma arquitectura de aparência futurista, captadas em dia de temporal, para pôr em evidência a fragilidade do humano perante a natureza - e "The Green Ray" (2001), uma película em que a artista dá continuidade a uma série de narrativas (Júlio Verne, Duchamp, Rohmer e Fischli & Weiss) acerca de um fenómeno raro - o raio verde que se observa, em condições climáticas excepcionais, no exacto momento em que o sol desaparece no mar. Óscar Faria

Tacita Dean. PORTO. Museu de Arte Contemporânea de Serralves, Rua D. João de Castro, 210, tel. 226 151 000, terça, quarta, sexta, sáb., dom. e fer. das 10h às 19h, quinta das 10h às 22h, até 3 de Março.

Pedro Proença

O virtuosismo continua a ser a característica dominante dos trabalhos de Pedro Proença (Lubango, Angola, 1962). Nesse encadeado de situações e citações habilmente construídas exalta-se o ilusionismo, como refere o artista em texto que acompanha a exposição. O título da mostra "Portrait of the Artist as An Old Rabi" lembra James Joyce e Dylan Thomas. Na primeira sala da galeria são apresentadas as séries "Rabis" e "Ideias Feitas", no espaço central destaca-se "Fantasia Musical All'Antiqua (Para o Prof. Astro, Aliás pgf)", enquanto no último momento surgem uma série de pinturas que ostentam títulos humorados: "Prosac Prosas", "Nobilitas & Pivete (Dante e Eckhart)" ou "O Libretista Libertino". Sente-se, porém, um certo esgotamento neste caminho trilhado por Proença desde finais dos anos 80; não basta ser criativo nem erudito para causar aquilo que Appollinaire considerava ser a mola real do espírito moderno: a surpresa. E esse é um dos equívocos do pós-modernismo: pensar que as piruetas mais ou menos inspiradas constituem a solução para a crise em que a pintura se encontra desde, pelo menos, a década de 80. De resto, saliente-se a qualidade da escrita de Proença: "Estas (minhas) obras não são assim tão nocturnas: antes pelo contrário. Mesmo os retratos enquanto rabi nas versões mono, duo e com jesuíta ao fundo são obras musicais, são o tilintar dos talheres na refeição, são a antevisão de uma idade em que o promissor jovem artista passou ao cobiçado exílio de 'old master', com os estranhos prestígios dessa categoria." Uma exposição a meio caminho de um percurso artístico que continua a ser pródigo em inventividade, mas ao qual tem faltado um novo sobressalto. O.F.

"Portrait of the Artist as An Old Rabi", de Pedro Proença

PORTO. Galeria Pedro Oliveira, Calçada de Monchique, 3, tel. 222 002 334, de terça a sáb., das 15h às 20h, até 23 de Fevereiro.

Glam-trash

Não por acaso, a propósito do trabalho do suíço Olaf Breuning, é recorrentemente invocada a ideia de que somos todos viciados em imagens - ele tem vindo a assumir-se como uma espécie de "pós-mad-maxiana" máquina processadora por onde passam (e através da qual são justapostas e regurgitadas) as simbologias, códigos e estilos que enformam a mass-mediática indústria do entretenimento contemporâneo.

Particularmente fascinado pelas bizarrias da série B, os extremos "heavy metal" ou "new age", os imaginários desviantes de "serial killers" ou as imagens construídas e fantasistas da memória histórica colectiva servem de matéria-prima à maioria dos seus trabalhos - em fotografia, vídeo, instalação ou performance.

A Galeria João Graça mostra apenas fotografia - cinco imagens em que imperam os grandes formatos e a que se juntam duas "light-box". Trabalhos em que a transparência das construções simulatórias e o ambíguo trabalho plástico de ambientes e figuras também podem ser interpretados à luz da superficialidade tortuosamente adolescente de um universo "select-copy-paste". Vanessa Rato

Olaf Breuning LISBOA Galeria João Graça, Rua de Santiago, 15 A, tel. 218 874 323, de segunda a sáb., das 14h30 às 19h30, até 2 de Março.

Continuam

Sábado, 9 de Fevereiro de 2002

Adriana Molder

No Museu de Arte Moderna de Sintra, há uma "última sala do museu [que] está assombrada", escreve Adriana Molder a propósito da instalação de desenhos que aí apresenta. É, de facto, uma instalação: pendurados em torno da luz verde que emana do chão, estes desenhos a preto e branco podem ver-se de um lado e de outro do papel, o que reforça a sua fragilidade. Sobre um finíssimo papel de esquisso A. Molder dá vida a personagens às quais a fragilidade do papel confere um carácter diáfano. São figuras hieráticas de uma extrema dignidade dentro da sua evanescência. A capacidade de erguer um pequeno teatro silencioso está comprovada. Temos, no entanto, dificuldade em acompanhar a artista nesta sua associação de universos. Joana Neves

Adriana Molder SINTRA, Museu de Arte Moderna, Avenida Heliodoro Salgado, tel. 219 248 170, de terça a dom., das 10h às 18h, até dia 17 de Fevereiro.

Fernando Calhau

A exposição que Fernando Calhau nos propõe na pequena sala da Promontório Arquitectos corresponde à simplicidade a que o artista nos habituou. De um lado temos uma obra em néon, de outro sete quadros pretos com mancha branca a aerógrafo. O néon ostenta a seguinte frase em inglês: "Isto não é uma paisagem." As obras interpelam-se uma à outra, requalificando-se e reinterpretando-se. Será que os quadros ameaçam ser uma paisagem, que o néon desmente, e, ao desmentir, afirma a verdadeira tensão da obra entre uma imagem que se refere apenas a si mesma, ao preto, à tela, à superfície e outra que simbolicamente refere um referente perdido? Cabe ao espectador colocar-se no seio desta luta, que dinamiza, pela sua observação e posicionamento em relação aos dois pólos da exposição. J.N.

Fernando Calhau LISBOA, Promontório Arquitectos, Rua Fábrica Material de Guerra nº 10 (ao Poço do Bispo), tel. 218 620 970, de segunda a sexta, das 10h às 20h30, até dia 22 de Fevereiro.

Tacita Dean

O trabalho de Tacita Dean (Canterbury, 1965) situa-se na proximidade do de um detective. É no decurso das suas investigações que nascem muitas das suas obras, seja a tentativa de localizar a "Spiral Jetty", de Robert Smithson, seja a procura de elementos acerca de Donald Crowhurst, um navegador que desapareceu misteriosamente no oceano enquanto tentava falsear uma viagem de circum-navegação - e, neste caso, são muitos os paralelismos com outras situações ligadas à história da arte e da literatura do século XX: Arthur Cravan e Bas Jan Ader, por exemplo. Em Serralves, a artista britânica procurou estabelecer algumas afinidades com a mostra "Trabalhos de Campo", que reúne trabalhos de Robert Smithson e Bernd e Hilla Becher. Em "From Columbus, Ohio to the Partially Buried Woodshed" (1999), Dean faz referência a uma criação do norte-americano, enquanto na série fotográfica "Baobab" (o embondeiro do "Principezinho") realiza um comentário irónico às imagens da dupla alemã. Destaque para os filmes "Bubble House" (1999) - que parte das imagens das ruínas de uma arquitectura de aparência futurista, captadas em dia de temporal, para pôr em evidência a fragilidade do humano perante a natureza - e "The Green Ray" (2001), uma película em que a artista dá continuidade a uma série de narrativas (Júlio Verne, Duchamp, Rohmer e Fischli & Weiss) acerca de um fenómeno raro - o raio verde que se observa, em condições climáticas excepcionais, no exacto momento em que o sol desaparece no mar. Óscar Faria

Tacita Dean. PORTO. Museu de Arte Contemporânea de Serralves, Rua D. João de Castro, 210, tel. 226 151 000, terça, quarta, sexta, sáb., dom. e fer. das 10h às 19h, quinta das 10h às 22h, até 3 de Março.

Pedro Proença

O virtuosismo continua a ser a característica dominante dos trabalhos de Pedro Proença (Lubango, Angola, 1962). Nesse encadeado de situações e citações habilmente construídas exalta-se o ilusionismo, como refere o artista em texto que acompanha a exposição. O título da mostra "Portrait of the Artist as An Old Rabi" lembra James Joyce e Dylan Thomas. Na primeira sala da galeria são apresentadas as séries "Rabis" e "Ideias Feitas", no espaço central destaca-se "Fantasia Musical All'Antiqua (Para o Prof. Astro, Aliás pgf)", enquanto no último momento surgem uma série de pinturas que ostentam títulos humorados: "Prosac Prosas", "Nobilitas & Pivete (Dante e Eckhart)" ou "O Libretista Libertino". Sente-se, porém, um certo esgotamento neste caminho trilhado por Proença desde finais dos anos 80; não basta ser criativo nem erudito para causar aquilo que Appollinaire considerava ser a mola real do espírito moderno: a surpresa. E esse é um dos equívocos do pós-modernismo: pensar que as piruetas mais ou menos inspiradas constituem a solução para a crise em que a pintura se encontra desde, pelo menos, a década de 80. De resto, saliente-se a qualidade da escrita de Proença: "Estas (minhas) obras não são assim tão nocturnas: antes pelo contrário. Mesmo os retratos enquanto rabi nas versões mono, duo e com jesuíta ao fundo são obras musicais, são o tilintar dos talheres na refeição, são a antevisão de uma idade em que o promissor jovem artista passou ao cobiçado exílio de 'old master', com os estranhos prestígios dessa categoria." Uma exposição a meio caminho de um percurso artístico que continua a ser pródigo em inventividade, mas ao qual tem faltado um novo sobressalto. O.F.

"Portrait of the Artist as An Old Rabi", de Pedro Proença

PORTO. Galeria Pedro Oliveira, Calçada de Monchique, 3, tel. 222 002 334, de terça a sáb., das 15h às 20h, até 23 de Fevereiro.

Glam-trash

Não por acaso, a propósito do trabalho do suíço Olaf Breuning, é recorrentemente invocada a ideia de que somos todos viciados em imagens - ele tem vindo a assumir-se como uma espécie de "pós-mad-maxiana" máquina processadora por onde passam (e através da qual são justapostas e regurgitadas) as simbologias, códigos e estilos que enformam a mass-mediática indústria do entretenimento contemporâneo.

Particularmente fascinado pelas bizarrias da série B, os extremos "heavy metal" ou "new age", os imaginários desviantes de "serial killers" ou as imagens construídas e fantasistas da memória histórica colectiva servem de matéria-prima à maioria dos seus trabalhos - em fotografia, vídeo, instalação ou performance.

A Galeria João Graça mostra apenas fotografia - cinco imagens em que imperam os grandes formatos e a que se juntam duas "light-box". Trabalhos em que a transparência das construções simulatórias e o ambíguo trabalho plástico de ambientes e figuras também podem ser interpretados à luz da superficialidade tortuosamente adolescente de um universo "select-copy-paste". Vanessa Rato

Olaf Breuning LISBOA Galeria João Graça, Rua de Santiago, 15 A, tel. 218 874 323, de segunda a sáb., das 14h30 às 19h30, até 2 de Março.

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