EXPRESSO: País

19-09-2001
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Adiamento de Alqueva divide especialistas

Ana Baião Com a barragem quase concluída, o enchimento da albufeira fará terminar o estudo das gravuras

O DIRECTOR do Centro Nacional de Arte Rupestre (Cnart), António Martinho Baptista, manifesta-se contrário ao adiamento do fecho das comportas de Alqueva.. As fotos têm de ser feitas à noite para permitir o uso de luz rasante, única forma de realçar o traçado muito suave de algumas das inscrições.

Na semana passada, Christian Züchner, secretário-geral do comité de arte rupestre do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (ICOMOS) - organismo consultivo da Unesco - adiantou ao EXPRESSO a intenção de recomendar o adiamento do fecho das comportas da barragem. «Se a água (da barragem) vier neste Inverno não há tempo para documentar, estudar e publicar com todo o rigoro último santuário ligado a um rio não afectado por barragens - como aconteceu com as gravuras do Tejo».

No lado português, segundo Martinho Baptista, um dos dois coordenadores nacionais do trabalho de Alqueva, encontraram-se «cerca de 200 rochas com vestígios e mil a 1300 gravuras, após uma prospecção intensa».

Já na zona de Cheles, em Espanha, há, pelo menos, 450 rochas com milhares de gravuras. O trabalho inclui a remoção de sedimentos de todas as rochas, mesmo que não haja evidências de elas terem gravuras. E a verdade é que este método tem permitido a descoberta de mais arte pré-histórica.

Visões opostas

Manuel Calado, que coordena a prospecção na margem portuguesa, defende que «o adiamento por um ano permite mais rigor, inclusivamente na compatibilização entre Espanha e Portugal de aspectos do registo, que não é neutro e depende do que se quer analisar».

Sobre a visita de uma comissão da União Internacional das Ciências pré-históricas e proto-históricas (UISPP), a maior organização mundial de pré-historiadores, Manuel Calado diz que «é útil, porque traz outras perspectivas». Martinho Baptista considera a sua vinda «inútil».

A comissão chega a Lisboa na próxima quarta-feira, visitando as gravuras espanholas na sexta-feira e as portuguesas no dia seguinte, esperando ser recebida pelas autoridades dos dois países. Ulf Bertilsson, presidente do comité de arte rupestre do ICOMOS, poderá acompanhar a visita, uma vez que a sua deslocação a Alqueva, prevista para esta semana, não se concretizou. Martinho Baptista declara, ainda, que «sempre houve coordenação entre Espanha e Portugal», respondendo a críticas de Luiz Oosterbeek, coordenador do Europreart (projecto de base de dados da arte pré-histórica europeia).

Querelas internas em Portugal e desinformação prejudicaram o processo de apreciação da arte rupestre. Ulf Bertilsson lembra que a sua primeira vinda a Alqueva, em Julho, se seguiu à recepção de «e-mails» que denunciavam «a ameaça sobre a arte rupestre e que acusavam os portugueses de nada fazer para a registar».

Sem apoio público

O perito sueco começou, então, a recolher informação, tendo «visto, sem surpresa, que o trabalho de salvaguarda em Portugal era abrangente e de boa qualidade». Mas o recurso a instâncias internacionais aparece, também, como uma via para chamar a atenção para o património, perante a desvalorização interna que ele sofre mal é descoberto. De facto, no início, dos responsáveis directamente envolvidos, apenas Manuel Calado alertou para o «valor» das gravuras. Martinho Baptista vem secundá-lo quando visita a margem espanhola, onde descobre figuras do paleolítico.

Ulf Bertilsson diz que «uma ambição comum no sentido de proteger a arte rupestre poderia ter servido para criar uma forte opinião pública a favor das gravuras». O director do Instituto Português de Arqueologia, João Zilhão, prefere não comentar a vinda da comissão mas relembra um depoimento de outro membro do ICOMOS, que esteve em Alqueva no Outono de 2000. Tom Wheaton, presidente do comité americano de arqueologia do ICOMOS, diz que ficou «muito impressionado pelo cuidado da Empresa de Desenvolvimento e infra-estruturas de Alqueva na prospecção e minimização dos impactos sobre o património. É um projecto superior a muitos que vi nos últimos 30 anos no meu país».

Adiamento de Alqueva divide especialistas

Ana Baião Com a barragem quase concluída, o enchimento da albufeira fará terminar o estudo das gravuras

O DIRECTOR do Centro Nacional de Arte Rupestre (Cnart), António Martinho Baptista, manifesta-se contrário ao adiamento do fecho das comportas de Alqueva.. As fotos têm de ser feitas à noite para permitir o uso de luz rasante, única forma de realçar o traçado muito suave de algumas das inscrições.

Na semana passada, Christian Züchner, secretário-geral do comité de arte rupestre do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (ICOMOS) - organismo consultivo da Unesco - adiantou ao EXPRESSO a intenção de recomendar o adiamento do fecho das comportas da barragem. «Se a água (da barragem) vier neste Inverno não há tempo para documentar, estudar e publicar com todo o rigoro último santuário ligado a um rio não afectado por barragens - como aconteceu com as gravuras do Tejo».

No lado português, segundo Martinho Baptista, um dos dois coordenadores nacionais do trabalho de Alqueva, encontraram-se «cerca de 200 rochas com vestígios e mil a 1300 gravuras, após uma prospecção intensa».

Já na zona de Cheles, em Espanha, há, pelo menos, 450 rochas com milhares de gravuras. O trabalho inclui a remoção de sedimentos de todas as rochas, mesmo que não haja evidências de elas terem gravuras. E a verdade é que este método tem permitido a descoberta de mais arte pré-histórica.

Visões opostas

Manuel Calado, que coordena a prospecção na margem portuguesa, defende que «o adiamento por um ano permite mais rigor, inclusivamente na compatibilização entre Espanha e Portugal de aspectos do registo, que não é neutro e depende do que se quer analisar».

Sobre a visita de uma comissão da União Internacional das Ciências pré-históricas e proto-históricas (UISPP), a maior organização mundial de pré-historiadores, Manuel Calado diz que «é útil, porque traz outras perspectivas». Martinho Baptista considera a sua vinda «inútil».

A comissão chega a Lisboa na próxima quarta-feira, visitando as gravuras espanholas na sexta-feira e as portuguesas no dia seguinte, esperando ser recebida pelas autoridades dos dois países. Ulf Bertilsson, presidente do comité de arte rupestre do ICOMOS, poderá acompanhar a visita, uma vez que a sua deslocação a Alqueva, prevista para esta semana, não se concretizou. Martinho Baptista declara, ainda, que «sempre houve coordenação entre Espanha e Portugal», respondendo a críticas de Luiz Oosterbeek, coordenador do Europreart (projecto de base de dados da arte pré-histórica europeia).

Querelas internas em Portugal e desinformação prejudicaram o processo de apreciação da arte rupestre. Ulf Bertilsson lembra que a sua primeira vinda a Alqueva, em Julho, se seguiu à recepção de «e-mails» que denunciavam «a ameaça sobre a arte rupestre e que acusavam os portugueses de nada fazer para a registar».

Sem apoio público

O perito sueco começou, então, a recolher informação, tendo «visto, sem surpresa, que o trabalho de salvaguarda em Portugal era abrangente e de boa qualidade». Mas o recurso a instâncias internacionais aparece, também, como uma via para chamar a atenção para o património, perante a desvalorização interna que ele sofre mal é descoberto. De facto, no início, dos responsáveis directamente envolvidos, apenas Manuel Calado alertou para o «valor» das gravuras. Martinho Baptista vem secundá-lo quando visita a margem espanhola, onde descobre figuras do paleolítico.

Ulf Bertilsson diz que «uma ambição comum no sentido de proteger a arte rupestre poderia ter servido para criar uma forte opinião pública a favor das gravuras». O director do Instituto Português de Arqueologia, João Zilhão, prefere não comentar a vinda da comissão mas relembra um depoimento de outro membro do ICOMOS, que esteve em Alqueva no Outono de 2000. Tom Wheaton, presidente do comité americano de arqueologia do ICOMOS, diz que ficou «muito impressionado pelo cuidado da Empresa de Desenvolvimento e infra-estruturas de Alqueva na prospecção e minimização dos impactos sobre o património. É um projecto superior a muitos que vi nos últimos 30 anos no meu país».

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