Aborto à espera das condições políticas

28-06-2001
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Aborto à Espera das Condições Políticas

Por EUNICE LOURENÇO

Quinta, 28 de Junho de 2001

Referendo foi há três anos

PCP e BE prometem discutir projectos. Para o PSD não se justifica um novo debate. CDS-PP reconhece "défice" e promete medidas

Até o partido mais à direita do Parlamento, o CDS-PP, reconhece que o debate sobre o aborto terá inevitavelmente de voltar ao plenário da Assembleia da República (AR) e à sociedade portuguesa. Só que, defende o deputado e dirigente centrista Luís Nobre Guedes, esse regresso ainda terá de esperar pelo menos mais quatro anos.

Da outra ponta do plenário, Odete Santos, do PCP, e Manuela Tavares, do Bloco de Esquerda, prometem a discussão dos projectos de despenalização da interrupção voluntária da gravidez (IVG) que os respectivos partidos já entregam na AR, mas que nunca foram agendando. Contudo, tanto uma como outra receiam a falta de requisitos políticos para o fazer.

"Não há condições para isso", afirmou Odete Santos ao PÚBLICO, manifestando a sua opinião pessoal. Para esta deputada, essa discussão pode ser complicada sobretudo "pela maneira como o PS está partido" em relação ao assunto. "Não era bom ir para um debate para perder outra vez", assume.

Já Manuela Tavares confia que "esta questão [da despenalização do aborto] vai ter de ser resolvida porque a sociedade vai impor". Repor o problema na agenda política é um compromisso eleitoral do BE, que pretende retomar esta questão no início do próximo ano.

O próximo ano é, contudo, muito cedo para o CDS-PP. "É impensável que esse debate seja trazido [ao Parlamento] nesta legislatura", disse ao PÚBLICO Luís Nobre Guedes, que participou empenhadamente na campanha pelo "não" há três anos. Para este dirigente do CDS-PP, será mesmo "discutível" que o debate possa voltar na próxima legislatura, ou seja a partir de 2003. Isto porque quer ver concretizado um conjunto de medidas que pretende propor e cujas consequências não se vêem em apenas dois anos.

Para Luís Nobre Guedes, é preciso "reequacionar o papel da mulher e da mãe e da mulher trabalhadora e o papel da família", para actuar sobre as causas que levam ao aborto e "deve haver formas de atenuar aquilo que é um flagelo, um drama que muitas vezes se arrasta pela vida inteira". Este dirigente centrista reconhece que há um "défice relativamente a toda a gente que esteve empenhada no ''não''" e que há necessidade de medidas concretas que "devem ir ao encontro dos compromissos de quem esteve contra" a despenalização do aborto.

É isso que conta fazer e que, afirma, o fez regressar à actividade política. "Foi a razão pela qual voltei à política e espero não sair sem contribuir para atenuar esse défice", acrescenta Nobre Guedes.

Três anos de planeamento

Há três anos, quando o "não" ganhou o referendo, toda a gente - dos dois lados de uma questão que dividiu o plenário e a sociedade - prometeu continuar a trabalhar para atenuar o problema do aborto clandestino. E as palavras de ordem passaram a ser planeamento familiar e educação social. Passados três anos, Nobre Guedes reconhece o "défice" do seu próprio lado, mas todos os restantes colocam as culpas na falta de vontade política do Governo ou na falta de meios postos ao dispor daquelas duas vertentes.

O primeiro partido a apresentar uma proposta legislativa foi o PCP (ver caixa). Mas Odete Santos acusa o Executivo socialista de falta de vontade política para executar a lei. "O que quero denunciar é que não existe educação sexual nas escolas. Há uns professores que fazem algumas actividades", afirma a deputada. No entanto, para Odete Santos, "nem a educação sexual nem o planeamento familiar resolvem tudo", pelo que considera ser necessário voltar a colocar a questão da despenalização do aborto, mas sem passar por um novo referendo.

Também Ana Manso, do PSD, rejeita um novo referendo, mas por razões completamente diferentes: para ela este é um assunto arrumado no dia 28 de Junho de 1998. "Não faz qualquer sentido que façamos um novo referendo. Não houve qualquer evolução em termos de comportamento ou mentalidade que justifique um novo debate", afirma esta deputada, para quem o que é necessário fazer é "reforçar as medidas de prevenção e de informação".

Ana Manso propõe a realização de uma "campanha nacional de prevenção e consciencialização" e defende o reforço do papel das famílias, o desenvolvimento de consultas especializadas para adolescentes e um melhor aproveitamento do "espaço privilegiado" que as escolas são. "Portugal tem educação sexual a menos e começa tarde de mais", critica esta deputada.

Aborto à Espera das Condições Políticas

Por EUNICE LOURENÇO

Quinta, 28 de Junho de 2001

Referendo foi há três anos

PCP e BE prometem discutir projectos. Para o PSD não se justifica um novo debate. CDS-PP reconhece "défice" e promete medidas

Até o partido mais à direita do Parlamento, o CDS-PP, reconhece que o debate sobre o aborto terá inevitavelmente de voltar ao plenário da Assembleia da República (AR) e à sociedade portuguesa. Só que, defende o deputado e dirigente centrista Luís Nobre Guedes, esse regresso ainda terá de esperar pelo menos mais quatro anos.

Da outra ponta do plenário, Odete Santos, do PCP, e Manuela Tavares, do Bloco de Esquerda, prometem a discussão dos projectos de despenalização da interrupção voluntária da gravidez (IVG) que os respectivos partidos já entregam na AR, mas que nunca foram agendando. Contudo, tanto uma como outra receiam a falta de requisitos políticos para o fazer.

"Não há condições para isso", afirmou Odete Santos ao PÚBLICO, manifestando a sua opinião pessoal. Para esta deputada, essa discussão pode ser complicada sobretudo "pela maneira como o PS está partido" em relação ao assunto. "Não era bom ir para um debate para perder outra vez", assume.

Já Manuela Tavares confia que "esta questão [da despenalização do aborto] vai ter de ser resolvida porque a sociedade vai impor". Repor o problema na agenda política é um compromisso eleitoral do BE, que pretende retomar esta questão no início do próximo ano.

O próximo ano é, contudo, muito cedo para o CDS-PP. "É impensável que esse debate seja trazido [ao Parlamento] nesta legislatura", disse ao PÚBLICO Luís Nobre Guedes, que participou empenhadamente na campanha pelo "não" há três anos. Para este dirigente do CDS-PP, será mesmo "discutível" que o debate possa voltar na próxima legislatura, ou seja a partir de 2003. Isto porque quer ver concretizado um conjunto de medidas que pretende propor e cujas consequências não se vêem em apenas dois anos.

Para Luís Nobre Guedes, é preciso "reequacionar o papel da mulher e da mãe e da mulher trabalhadora e o papel da família", para actuar sobre as causas que levam ao aborto e "deve haver formas de atenuar aquilo que é um flagelo, um drama que muitas vezes se arrasta pela vida inteira". Este dirigente centrista reconhece que há um "défice relativamente a toda a gente que esteve empenhada no ''não''" e que há necessidade de medidas concretas que "devem ir ao encontro dos compromissos de quem esteve contra" a despenalização do aborto.

É isso que conta fazer e que, afirma, o fez regressar à actividade política. "Foi a razão pela qual voltei à política e espero não sair sem contribuir para atenuar esse défice", acrescenta Nobre Guedes.

Três anos de planeamento

Há três anos, quando o "não" ganhou o referendo, toda a gente - dos dois lados de uma questão que dividiu o plenário e a sociedade - prometeu continuar a trabalhar para atenuar o problema do aborto clandestino. E as palavras de ordem passaram a ser planeamento familiar e educação social. Passados três anos, Nobre Guedes reconhece o "défice" do seu próprio lado, mas todos os restantes colocam as culpas na falta de vontade política do Governo ou na falta de meios postos ao dispor daquelas duas vertentes.

O primeiro partido a apresentar uma proposta legislativa foi o PCP (ver caixa). Mas Odete Santos acusa o Executivo socialista de falta de vontade política para executar a lei. "O que quero denunciar é que não existe educação sexual nas escolas. Há uns professores que fazem algumas actividades", afirma a deputada. No entanto, para Odete Santos, "nem a educação sexual nem o planeamento familiar resolvem tudo", pelo que considera ser necessário voltar a colocar a questão da despenalização do aborto, mas sem passar por um novo referendo.

Também Ana Manso, do PSD, rejeita um novo referendo, mas por razões completamente diferentes: para ela este é um assunto arrumado no dia 28 de Junho de 1998. "Não faz qualquer sentido que façamos um novo referendo. Não houve qualquer evolução em termos de comportamento ou mentalidade que justifique um novo debate", afirma esta deputada, para quem o que é necessário fazer é "reforçar as medidas de prevenção e de informação".

Ana Manso propõe a realização de uma "campanha nacional de prevenção e consciencialização" e defende o reforço do papel das famílias, o desenvolvimento de consultas especializadas para adolescentes e um melhor aproveitamento do "espaço privilegiado" que as escolas são. "Portugal tem educação sexual a menos e começa tarde de mais", critica esta deputada.

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