Aventura autárquica começou há 25 anos

03-02-2002
marcar artigo

Aventura Autárquica Começou Há 25 Anos

Por NUNO CORVACHO

Domingo, 16 de Dezembro de 2001 As primeiras eleições autárquicas realizadas em Portugal colocaram há 25 anos a última pedra no edifício constitucional do país. Nesse ano crucial de 1976, marcado pela aprovação da nova Constituição a 2 de Abril, já tinham acontecido dois actos eleitorais pioneiros que determinaram a composição dos órgãos de soberania recém-criados pela Lei Fundamental: as eleições legislativas de Abril, que o PS ganhou; e as presidenciais de Junho, que consagraram a vitória por larga margem a Ramalho Eanes, apoiado pelos três partidos (PS, PSD e CDS). Num país ainda estremunhado pelas rotinas da democracia, a operação eleitoral de 12 de Dezembro trouxe problemas acrescidos, ao tratar-se de um objectivo "três-em-um", estando em causa a escolha simultânea de câmaras municipais, assembleias municipais e assembleias de freguesia. Devido à enorme quantidade de boletins envolvidos num universo de 304 concelhos e 4035 freguesias, apenas dois dias depois do acto eleitoral é que foram divulgados os resultados definitivos. Isto, apesar de, já na altura, a contagem ter sido feita através do recurso a meios informáticos. A curva apertada e perigosa da revolução Na linha de partida para as eleições, as onze forças políticas concorrentes levavam naturalmente na bagagem expectativas distintas. Os partidos encaravam as autárquicas como um grande teste à sua implantação a nível local e, ao mesmo tempo, preparavam já as trincheiras futuras do combate político. Apesar de ter assumido a chefia do Governo poucos meses antes, Mário Soares começava já a ser alvo de uma forte contestação. O líder do CDS, Freitas do Amaral, apelava num comício: "O povo tem de pedir ao presidente que mande o Governo embora". Sá Carneiro, por seu turno, chamava a atenção para as "quinze vezes" em que o primeiro-ministro faltara ao prometido no seu programa. Álvaro Cunhal fazia um aviso à navegação, dizendo que a revolução entrara numa "curva apertada e perigosa", e multiplicava-se nos habituais apelos à criação de uma "maioria de esquerda". Para as autárquicas, o PCP apresentava-se pela primeira vez ao eleitorado sem a sua sigla, no que viria a inaugurar uma tradição ainda hoje vigente, constituindo a sua primeira coligação eleitoral, a FEPU - Frente Eleitoral Povo Unido; os comunistas contavam com o fiel aliado MDP/CDE e então também com a FSP, formada por um núcleo de dissidentes do PS que se tinham afastado do partido em finais de 1974, grupo esse que se dissolveria pouco tempo depois. Na ponta esquerda do espectro político, surgiam os GDUP (Grupos Dinamizadores da Unidade Popular), que pretendiam transpor para o nível autárquico a dinâmica criada pela candidatura presidencial de Otelo Saraiva de Carvalho. A vitória de Soares Perante as críticas que choviam de todos os lados, Soares reagia: "Os que disseram que o Governo vai cair ou não é capaz de resolver os grandes problemas nacionais, vão ter uma grande desilusão com estas eleições, porque mais uma vez sairemos vencedores". E os números acabaram por lhe dar razão. Apesar de ter ficado empatado com o PSD em número de câmaras, o PS superou-o largamente em votação (33,2 por cento contra 24,2); a FEPU ganhou em 37 concelhos, demonstrando mais uma vez a enorme influência comunista na região alentejana, onde aconteceram 25 dessas vitórias; o CDS mordeu-lhe os calcanhares, com 36 municípios; e os GDUP acabaram por ser a grande desilusão das eleições, ao não ultrapassarem 2,51 por cento, bem longe dos 16 por cento com que Otelo fora brindado nas presidenciais (nem uma presidência de câmara e apenas cinco vereadores foi tudo quanto conseguiram). A surpresa PPM A grande surpresa das autárquicas veio do PPM que, tendo apenas concorrido em nove câmaras, conseguiu sair vencedor no concelho de Ribeira de Pena, uma localidade pouco conhecida de Trás-os-Montes. João José Alves Pereira, um funcionário dos CTT com o quinto ano do liceu que reunia algum prestígio na terra, encabeçou a lista monárquica. Questionado pelos jornalistas depois da sua inesperada vitória, apressou-se a garantir, não fosse o diabo tecê-las: "Não sou conde nem tenho sangue azul; sou trabalhador como outro qualquer". E admitiu, sem rebuço: "O PPM apenas serviu de veículo para legalizar a candidatura". Nas duas maiores cidades do país, ganharam socialistas: Aquilino Ribeiro Machado, em Lisboa e Aureliano Veloso, no Porto. E noutras duas capitais de distrito, entravam em cena dois autarcas que não mais abandonariam as cadeiras: Mesquita Machado (PS), em Braga, e Abílio Fernandes (FEPU), em Évora. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE O que é uma vitória?

Autárquicas 2001 em números

Jorge Sampaio apela à participação dos eleitores

Televisões apostam na receita habitual

A primeira vez dos independentes

Aventura autárquica começou há 25 anos

Presidência da ANMP: o que faz correr os partidos?

Uma questão de estilos

O "partido autárquico"

Aventura Autárquica Começou Há 25 Anos

Por NUNO CORVACHO

Domingo, 16 de Dezembro de 2001 As primeiras eleições autárquicas realizadas em Portugal colocaram há 25 anos a última pedra no edifício constitucional do país. Nesse ano crucial de 1976, marcado pela aprovação da nova Constituição a 2 de Abril, já tinham acontecido dois actos eleitorais pioneiros que determinaram a composição dos órgãos de soberania recém-criados pela Lei Fundamental: as eleições legislativas de Abril, que o PS ganhou; e as presidenciais de Junho, que consagraram a vitória por larga margem a Ramalho Eanes, apoiado pelos três partidos (PS, PSD e CDS). Num país ainda estremunhado pelas rotinas da democracia, a operação eleitoral de 12 de Dezembro trouxe problemas acrescidos, ao tratar-se de um objectivo "três-em-um", estando em causa a escolha simultânea de câmaras municipais, assembleias municipais e assembleias de freguesia. Devido à enorme quantidade de boletins envolvidos num universo de 304 concelhos e 4035 freguesias, apenas dois dias depois do acto eleitoral é que foram divulgados os resultados definitivos. Isto, apesar de, já na altura, a contagem ter sido feita através do recurso a meios informáticos. A curva apertada e perigosa da revolução Na linha de partida para as eleições, as onze forças políticas concorrentes levavam naturalmente na bagagem expectativas distintas. Os partidos encaravam as autárquicas como um grande teste à sua implantação a nível local e, ao mesmo tempo, preparavam já as trincheiras futuras do combate político. Apesar de ter assumido a chefia do Governo poucos meses antes, Mário Soares começava já a ser alvo de uma forte contestação. O líder do CDS, Freitas do Amaral, apelava num comício: "O povo tem de pedir ao presidente que mande o Governo embora". Sá Carneiro, por seu turno, chamava a atenção para as "quinze vezes" em que o primeiro-ministro faltara ao prometido no seu programa. Álvaro Cunhal fazia um aviso à navegação, dizendo que a revolução entrara numa "curva apertada e perigosa", e multiplicava-se nos habituais apelos à criação de uma "maioria de esquerda". Para as autárquicas, o PCP apresentava-se pela primeira vez ao eleitorado sem a sua sigla, no que viria a inaugurar uma tradição ainda hoje vigente, constituindo a sua primeira coligação eleitoral, a FEPU - Frente Eleitoral Povo Unido; os comunistas contavam com o fiel aliado MDP/CDE e então também com a FSP, formada por um núcleo de dissidentes do PS que se tinham afastado do partido em finais de 1974, grupo esse que se dissolveria pouco tempo depois. Na ponta esquerda do espectro político, surgiam os GDUP (Grupos Dinamizadores da Unidade Popular), que pretendiam transpor para o nível autárquico a dinâmica criada pela candidatura presidencial de Otelo Saraiva de Carvalho. A vitória de Soares Perante as críticas que choviam de todos os lados, Soares reagia: "Os que disseram que o Governo vai cair ou não é capaz de resolver os grandes problemas nacionais, vão ter uma grande desilusão com estas eleições, porque mais uma vez sairemos vencedores". E os números acabaram por lhe dar razão. Apesar de ter ficado empatado com o PSD em número de câmaras, o PS superou-o largamente em votação (33,2 por cento contra 24,2); a FEPU ganhou em 37 concelhos, demonstrando mais uma vez a enorme influência comunista na região alentejana, onde aconteceram 25 dessas vitórias; o CDS mordeu-lhe os calcanhares, com 36 municípios; e os GDUP acabaram por ser a grande desilusão das eleições, ao não ultrapassarem 2,51 por cento, bem longe dos 16 por cento com que Otelo fora brindado nas presidenciais (nem uma presidência de câmara e apenas cinco vereadores foi tudo quanto conseguiram). A surpresa PPM A grande surpresa das autárquicas veio do PPM que, tendo apenas concorrido em nove câmaras, conseguiu sair vencedor no concelho de Ribeira de Pena, uma localidade pouco conhecida de Trás-os-Montes. João José Alves Pereira, um funcionário dos CTT com o quinto ano do liceu que reunia algum prestígio na terra, encabeçou a lista monárquica. Questionado pelos jornalistas depois da sua inesperada vitória, apressou-se a garantir, não fosse o diabo tecê-las: "Não sou conde nem tenho sangue azul; sou trabalhador como outro qualquer". E admitiu, sem rebuço: "O PPM apenas serviu de veículo para legalizar a candidatura". Nas duas maiores cidades do país, ganharam socialistas: Aquilino Ribeiro Machado, em Lisboa e Aureliano Veloso, no Porto. E noutras duas capitais de distrito, entravam em cena dois autarcas que não mais abandonariam as cadeiras: Mesquita Machado (PS), em Braga, e Abílio Fernandes (FEPU), em Évora. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE O que é uma vitória?

Autárquicas 2001 em números

Jorge Sampaio apela à participação dos eleitores

Televisões apostam na receita habitual

A primeira vez dos independentes

Aventura autárquica começou há 25 anos

Presidência da ANMP: o que faz correr os partidos?

Uma questão de estilos

O "partido autárquico"

marcar artigo