Portugal à espera de um segundo fôlego

07-04-2001
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Portugal à Espera de Um Segundo Fôlego

Por CRISTINA FERREIRA

Sábado, 7 de Abril de 2001 Nos últimos meses confirmaram-se os piores receios: Portugal está outra vez a afastar-se dos níveis de rendimento da União Europeia. Na encruzilhada em que se encontra o país, combinam-se debilidades estruturais da economia, imobilismo no sistema político e falta de ânimo na sociedade. Para debater estas questões, iniciamos hoje uma longa série de trabalhos que se prolongarão por 11 semanas. Nesta edição, apontamos os pontos fracos do país e lançamos pistas de reflexão sobre a identidade nacional e o interesse nacional. Amanhã publicaremos uma entrevista de André Gonçalves Pereira que abre o ciclo "O País na Encruzilhada" O futuro é cada vez mais imprevisível. Tem faltado aos Governos ambição nas metas de crescimento económico, não se realizaram as grandes reformas de que o país necessita, em especial a da Administração Pública. Portugal ressente-se da ausência de estadistas e da existência de uma classe política acomodada e desqualificada, incapaz de pensar o país segundo uma visão estratégica de médio e longo prazo. Isto porque a democracia banaliza ideias. Com a aproximação a 2006, fim da chegada dos fundos da União Europeia, o país entrou numa encruzilhada. Mais do que falar, os Governos devem começar a agir. E devem fazê-lo segundo uma estratégia de crescimento e desenvolvimento nacional enquadrada no espaço europeu. A Cimeira de Nice constitui um retrocesso no processo de integração europeia, contrariando os interesses dos pequenos países como Portugal. A afirmação de Portugal no mundo faz-se cada vez mais pela língua e pelo reforço da cooperação no espaço lusófono, numa visão a médio e longo prazo. Estas são algumas das ideias mais recorrentes que se encontram na série de entrevistas que amanhã se inicia no PÚBLICO. Quase três décadas depois, o advogado André Gonçalves Pereira, o banqueiro Artur Santos Silva, o advogado e empresário Francisco Balsemão, o advogado Henrique Medina Carreira, o deputado do PS João Cravinho, os banqueiros João Salgueiro e Jorge Jardim Gonçalves, o académico Mário Murteira, o administrador da Gulbenkian e presidente da Galp Rui Vilar e o advogado Vasco Vieira de Almeida aceitaram fazer, nas páginas do PÚBLICO, a sua reflexão sobre Portugal. Dez nomes que desenvolveram, entre 1974 e 1982, uma acção política ou empresarial nas áreas da economia, finanças, integração europeia. Entre outros assuntos, falam das suas esperanças e dos objectivos que se impunham realizar a seguir à Revolução. A evolução do país durante os últimos trinta anos e como vêem hoje Portugal são questões a abordar ao longo das próximas semanas. Dissertam ainda sobre as grandes incertezas que hoje ameaçam o mundo e sobre as tarefas que se colocam aos portugueses, para que o país faça sentido num espaço integrado e globalizado. A consolidação da democracia, o reforço das reformas económicas e das nacionalizações do sector produtivo e financeiro, o combate ao modelo estatizante da economia e a adesão ao modelo europeu constituíram algumas das preocupações dominantes, mas contraditórias, a seguir ao 25 de Abril. Portugal vivia então uma Revolução, onde cada actor tinha em mente levar por diante o seu projecto. Uns apostavam num país mais europeísta, voltado para a integração na CEE, outros visavam uma ideologia mais terceiro-mundista ou procuravam ainda implantar modelos autogestionários ou de co-gestão. E havia também quem desejasse um sistema socializante. É no início da década de 80 que Portugal inicia a sua caminhada em direcção à Europa. A integração veio reforçar a confiança dos portugueses, aproximar os seus padrões de consumo dos níveis europeus, pois os cidadãos começaram a valorizar menos a sua segurança e o seu futuro, passando a dar mais atenção ao bem-estar imediato - antes da Revolução o país tinha das mais altas taxas de poupança do mundo. A entrada no euro constituiu um novo marco positivo na vida nacional. Mas a seguir Portugal entrou em "derrapagem", sem uma política económica consistente e portadora de uma visão estratégica nacional. Os entrevistados consideram inaceitável o ritmo com que se avança nas reformas estruturais, e é sobre a produtividade que se reflecte a falta de qualidade. A reforma da Administração Pública exige do Estado uma dimensão estratégica de médio e longo prazo, e não medidas conjunturais como as adoptadas. No plano económico, há quem lamente o não aproveitamento das privatizações para ajudar a criar grupos nacionais em sectores estratégicos. Com 2006 à porta, Portugal está numa encruzilhada. No entender dos entrevistados não é apenas a qualidade da economia que está em causa, mas também a do sistema político e social, abaixo do expectável, atendendo ao nível da riqueza material. O futuro exige mudanças profundas, mas reclama também rapidez. Há quem lembre: o Governo tem um líder, cabendo-lhe a ele comandar essas mudanças. Às elites portuguesas, políticas, económicas ou culturais, exige-se uma maior intervenção, e de maior qualidade, na vida pública. O momento não é ainda de desespero, mas, para muitos, constitui uma última oportunidade. O aparecimento de homens de Estado na cena política, com vocação de missão, constitui para muitos uma condição "sine qua non" para se dar sentido a Portugal. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Portugal à espera de um segundo fôlego

O interesse das empresas pode não ser o interesse nacional

A defesa da identidade nacional não depende da economia

Frases

Entre Espanha e a globalização

Sete anos a contra-relógio

Governos respondem com "más acções"

EDITORIAL

Olhar para a frente

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Sábado, 7 de Abril de 2001 Nos últimos meses confirmaram-se os piores receios: Portugal está outra vez a afastar-se dos níveis de rendimento da União Europeia. Na encruzilhada em que se encontra o país, combinam-se debilidades estruturais da economia, imobilismo no sistema político e falta de ânimo na sociedade. Para debater estas questões, iniciamos hoje uma longa série de trabalhos que se prolongarão por 11 semanas. Nesta edição, apontamos os pontos fracos do país e lançamos pistas de reflexão sobre a identidade nacional e o interesse nacional. Amanhã publicaremos uma entrevista de André Gonçalves Pereira que abre o ciclo "O País na Encruzilhada" O futuro é cada vez mais imprevisível. Tem faltado aos Governos ambição nas metas de crescimento económico, não se realizaram as grandes reformas de que o país necessita, em especial a da Administração Pública. Portugal ressente-se da ausência de estadistas e da existência de uma classe política acomodada e desqualificada, incapaz de pensar o país segundo uma visão estratégica de médio e longo prazo. Isto porque a democracia banaliza ideias. Com a aproximação a 2006, fim da chegada dos fundos da União Europeia, o país entrou numa encruzilhada. Mais do que falar, os Governos devem começar a agir. E devem fazê-lo segundo uma estratégia de crescimento e desenvolvimento nacional enquadrada no espaço europeu. A Cimeira de Nice constitui um retrocesso no processo de integração europeia, contrariando os interesses dos pequenos países como Portugal. A afirmação de Portugal no mundo faz-se cada vez mais pela língua e pelo reforço da cooperação no espaço lusófono, numa visão a médio e longo prazo. Estas são algumas das ideias mais recorrentes que se encontram na série de entrevistas que amanhã se inicia no PÚBLICO. Quase três décadas depois, o advogado André Gonçalves Pereira, o banqueiro Artur Santos Silva, o advogado e empresário Francisco Balsemão, o advogado Henrique Medina Carreira, o deputado do PS João Cravinho, os banqueiros João Salgueiro e Jorge Jardim Gonçalves, o académico Mário Murteira, o administrador da Gulbenkian e presidente da Galp Rui Vilar e o advogado Vasco Vieira de Almeida aceitaram fazer, nas páginas do PÚBLICO, a sua reflexão sobre Portugal. Dez nomes que desenvolveram, entre 1974 e 1982, uma acção política ou empresarial nas áreas da economia, finanças, integração europeia. Entre outros assuntos, falam das suas esperanças e dos objectivos que se impunham realizar a seguir à Revolução. A evolução do país durante os últimos trinta anos e como vêem hoje Portugal são questões a abordar ao longo das próximas semanas. Dissertam ainda sobre as grandes incertezas que hoje ameaçam o mundo e sobre as tarefas que se colocam aos portugueses, para que o país faça sentido num espaço integrado e globalizado. A consolidação da democracia, o reforço das reformas económicas e das nacionalizações do sector produtivo e financeiro, o combate ao modelo estatizante da economia e a adesão ao modelo europeu constituíram algumas das preocupações dominantes, mas contraditórias, a seguir ao 25 de Abril. Portugal vivia então uma Revolução, onde cada actor tinha em mente levar por diante o seu projecto. Uns apostavam num país mais europeísta, voltado para a integração na CEE, outros visavam uma ideologia mais terceiro-mundista ou procuravam ainda implantar modelos autogestionários ou de co-gestão. E havia também quem desejasse um sistema socializante. É no início da década de 80 que Portugal inicia a sua caminhada em direcção à Europa. A integração veio reforçar a confiança dos portugueses, aproximar os seus padrões de consumo dos níveis europeus, pois os cidadãos começaram a valorizar menos a sua segurança e o seu futuro, passando a dar mais atenção ao bem-estar imediato - antes da Revolução o país tinha das mais altas taxas de poupança do mundo. A entrada no euro constituiu um novo marco positivo na vida nacional. Mas a seguir Portugal entrou em "derrapagem", sem uma política económica consistente e portadora de uma visão estratégica nacional. Os entrevistados consideram inaceitável o ritmo com que se avança nas reformas estruturais, e é sobre a produtividade que se reflecte a falta de qualidade. A reforma da Administração Pública exige do Estado uma dimensão estratégica de médio e longo prazo, e não medidas conjunturais como as adoptadas. No plano económico, há quem lamente o não aproveitamento das privatizações para ajudar a criar grupos nacionais em sectores estratégicos. Com 2006 à porta, Portugal está numa encruzilhada. No entender dos entrevistados não é apenas a qualidade da economia que está em causa, mas também a do sistema político e social, abaixo do expectável, atendendo ao nível da riqueza material. O futuro exige mudanças profundas, mas reclama também rapidez. Há quem lembre: o Governo tem um líder, cabendo-lhe a ele comandar essas mudanças. Às elites portuguesas, políticas, económicas ou culturais, exige-se uma maior intervenção, e de maior qualidade, na vida pública. O momento não é ainda de desespero, mas, para muitos, constitui uma última oportunidade. O aparecimento de homens de Estado na cena política, com vocação de missão, constitui para muitos uma condição "sine qua non" para se dar sentido a Portugal. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Portugal à espera de um segundo fôlego

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