Jovens «salvam» Bloco de Esquerda

17-10-2000
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A esquerda parece revelar-se mais atractiva para a juventude portuguesa, que votou maioritariamente PS

400 mil em estreia

Estima-se em cerca de 400 mil o número de jovens que votou nestas legislativas pela primeira vez. Apesar de os dados não serem oficialmente discriminados, é possível concluir que a preferência da juventude foi para o Partido Socialista, tendo o PSD sido o segundo partido mais votado.

Curiosamente, também o Partido Popular se revelou atractivo para a juventude, que confiou mais no partido de Paulo Portas que os eleitores «adultos».

«Ambas as votações, no BE e no PP, correspondem à insatisfação com o estilo e conteúdo da governação socialista e um forte desejo de mudança» - diz Manuel Villaverde Cabral, o sociólogo que há dois anos foi responsável pela análise das tendências polícias no estudo «Jovens Portugueses de Hoje» realizado pelo Observatório da Juventude. «Há entre os jovens - em sua opinião - uma reacção epidérmica contra os partidos. E a culpa é dos partidos e não deles».

Os dados relativos à abstenção nestas mesas de voto provam a teoria. Os jovens que não votaram ficaram-se por níveis próximos dos 38,1% nacionais - 35% em Carcavelos, em Almada 32%, em Paço d'Arcos 37,7%, na Portela de Sacavém 26,8% e em Massamá 34%.

«A desmobilização partidária não corresponde à política» - assegura o sociólogo. A prová-lo está o testemunho de Pedro Duarte, líder da JSD: «Em 1996, quando se fez o refiliamento no partido, dos 30 mil ficámos apenas com 10 mil».

O líder da JSD confirma este «desinteresse pelo sistema partidário», mas já Sérgio Sousa Pinto, líder da Juventude Socialista , é mais optimista: «As sondagens diziam que a juventude estava com o PS». A verdade, porém, é que em Lisboa, onde o Bloco de Esquerda elegeu os seus dois deputados, o PS perdeu um e o PSD outro.

Burgueses de esquerda

«Ainda não analisei os dados» - defende-se Sousa Pinto. Advertindo que «nenhuma proposta de lei que tenha a ver com os temas que interessam à juventude passará sem os votos do PS», no que pretende venha a ser entendido como um desmentindo às notícias que davam como certa a reapresentação, pela JS, da proposta de lei de despenalização do aborto.

Nem toda a gente se preocupa com estas questões práticas. Na última mesa eleitoral da Portela de Sacavém, bairro que já faz parte do concelho de Loures, mas onde mora a burguesia recente de Lisboa, a votação no Bloco de Esquerda foi de 9,2 pontos percentuais (na totalidade de Loures foi apenas de 4,1%), o que o coloca apenas a um ponto do CDS-PP, com 10,3%. De referir que nesta mesa, o PSD fica com 37,4%, ganhando ao PS por uma décima, 37,3%. A fraca apetência pela esquerda clássica nesta freguesia fica demonstrada pela votação na CDU: 4,2%.

O cenário repete-se em São Domingos de Benfica, em Lisboa, onde o BE tem 15,4%, enquanto o PP tem 13,5%; o PS 29,9% e o PSD 28,1%. E os radicais de esquerda obtiveram 14% em Carnide, 10,9% na Ameixoeira, 7% em Carcavelos; 7,4% no Seixal, 6,8% em Setúbal, 11,7% em Almada e 6,4% em Paço d'Arcos.

A Norte, Miguel Portas foi presenteado pelos jovens com 8,8% no Bonfim, 9% em Ramalde, e 12,5% em Cedofeita. Na Foz, a zona mais «in» da Invicta, o BE atinge os 6,01% (freguesia de Nevogilde) - o que totaliza mais dois por cento do que na totalidade do concelho.

Nota-se nestes números uma clara tendência para o voto no BE nas zonas urbanas e economicamente estáveis. O que não corresponde ao que no inquérito de há dois anos se dizia ser a tendência do voto juvenil, cuja inclinação para a esquerda seria inversamente proporcional à riqueza material dos pais.

«O voto no BE é instruído e de certa forma bem instalado na vida» - observa Villaverde Cabral. É o renascimento da esquerda elitista.

Portas também ganha

As votações da juventude no Partido Popular são também maiores do que a nível nacional, e mesmo distrital. Em São Domingos de Benfica, o PP atinge os 13,5%, numa zona que abrange várias classes sociais. Em Setúbal tem 12,4%, em Massamá 8,5%, em Carnide 11% e em Carcavelos 14%. A votação do PP a nível nacional foi de 8,3%. «O PP provavelmente apanha os votos da juventude por ter um líder mais jovem» - atira Pedro Duarte da JSD.

«O BE não pode transformar-se num partido como os outros, sob risco de perder interesse para os jovens que votaram nele por ser diferente. E para reconquistar a juventude é necessário agora, além de ser diferente, cobrir também as causas da juventude. É o comportamento parlamentar que agora será julgado» - conclui Manuel Villaverde Cabral.

CATARINA CARVALHO

A esquerda parece revelar-se mais atractiva para a juventude portuguesa, que votou maioritariamente PS

400 mil em estreia

Estima-se em cerca de 400 mil o número de jovens que votou nestas legislativas pela primeira vez. Apesar de os dados não serem oficialmente discriminados, é possível concluir que a preferência da juventude foi para o Partido Socialista, tendo o PSD sido o segundo partido mais votado.

Curiosamente, também o Partido Popular se revelou atractivo para a juventude, que confiou mais no partido de Paulo Portas que os eleitores «adultos».

«Ambas as votações, no BE e no PP, correspondem à insatisfação com o estilo e conteúdo da governação socialista e um forte desejo de mudança» - diz Manuel Villaverde Cabral, o sociólogo que há dois anos foi responsável pela análise das tendências polícias no estudo «Jovens Portugueses de Hoje» realizado pelo Observatório da Juventude. «Há entre os jovens - em sua opinião - uma reacção epidérmica contra os partidos. E a culpa é dos partidos e não deles».

Os dados relativos à abstenção nestas mesas de voto provam a teoria. Os jovens que não votaram ficaram-se por níveis próximos dos 38,1% nacionais - 35% em Carcavelos, em Almada 32%, em Paço d'Arcos 37,7%, na Portela de Sacavém 26,8% e em Massamá 34%.

«A desmobilização partidária não corresponde à política» - assegura o sociólogo. A prová-lo está o testemunho de Pedro Duarte, líder da JSD: «Em 1996, quando se fez o refiliamento no partido, dos 30 mil ficámos apenas com 10 mil».

O líder da JSD confirma este «desinteresse pelo sistema partidário», mas já Sérgio Sousa Pinto, líder da Juventude Socialista , é mais optimista: «As sondagens diziam que a juventude estava com o PS». A verdade, porém, é que em Lisboa, onde o Bloco de Esquerda elegeu os seus dois deputados, o PS perdeu um e o PSD outro.

Burgueses de esquerda

«Ainda não analisei os dados» - defende-se Sousa Pinto. Advertindo que «nenhuma proposta de lei que tenha a ver com os temas que interessam à juventude passará sem os votos do PS», no que pretende venha a ser entendido como um desmentindo às notícias que davam como certa a reapresentação, pela JS, da proposta de lei de despenalização do aborto.

Nem toda a gente se preocupa com estas questões práticas. Na última mesa eleitoral da Portela de Sacavém, bairro que já faz parte do concelho de Loures, mas onde mora a burguesia recente de Lisboa, a votação no Bloco de Esquerda foi de 9,2 pontos percentuais (na totalidade de Loures foi apenas de 4,1%), o que o coloca apenas a um ponto do CDS-PP, com 10,3%. De referir que nesta mesa, o PSD fica com 37,4%, ganhando ao PS por uma décima, 37,3%. A fraca apetência pela esquerda clássica nesta freguesia fica demonstrada pela votação na CDU: 4,2%.

O cenário repete-se em São Domingos de Benfica, em Lisboa, onde o BE tem 15,4%, enquanto o PP tem 13,5%; o PS 29,9% e o PSD 28,1%. E os radicais de esquerda obtiveram 14% em Carnide, 10,9% na Ameixoeira, 7% em Carcavelos; 7,4% no Seixal, 6,8% em Setúbal, 11,7% em Almada e 6,4% em Paço d'Arcos.

A Norte, Miguel Portas foi presenteado pelos jovens com 8,8% no Bonfim, 9% em Ramalde, e 12,5% em Cedofeita. Na Foz, a zona mais «in» da Invicta, o BE atinge os 6,01% (freguesia de Nevogilde) - o que totaliza mais dois por cento do que na totalidade do concelho.

Nota-se nestes números uma clara tendência para o voto no BE nas zonas urbanas e economicamente estáveis. O que não corresponde ao que no inquérito de há dois anos se dizia ser a tendência do voto juvenil, cuja inclinação para a esquerda seria inversamente proporcional à riqueza material dos pais.

«O voto no BE é instruído e de certa forma bem instalado na vida» - observa Villaverde Cabral. É o renascimento da esquerda elitista.

Portas também ganha

As votações da juventude no Partido Popular são também maiores do que a nível nacional, e mesmo distrital. Em São Domingos de Benfica, o PP atinge os 13,5%, numa zona que abrange várias classes sociais. Em Setúbal tem 12,4%, em Massamá 8,5%, em Carnide 11% e em Carcavelos 14%. A votação do PP a nível nacional foi de 8,3%. «O PP provavelmente apanha os votos da juventude por ter um líder mais jovem» - atira Pedro Duarte da JSD.

«O BE não pode transformar-se num partido como os outros, sob risco de perder interesse para os jovens que votaram nele por ser diferente. E para reconquistar a juventude é necessário agora, além de ser diferente, cobrir também as causas da juventude. É o comportamento parlamentar que agora será julgado» - conclui Manuel Villaverde Cabral.

CATARINA CARVALHO

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