Familiares entre o medo e o silêncio

26-01-2001
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Familiares Entre o Medo e o Silêncio

Por LEONETE BOTELHO E LUÍSA PINTO

Sexta-feira, 26 de Janeiro de 2001 MILITARES PARTEM HOJE PARA A BÓSNIA. Soldados tiveram uma mentalização especial para enfrentar a pressão social relativa ao urânio empobrecido Os soldados portugueses do agrupamento Echo, que partem entre hoje e amanhã para a Bósnia para cumprirem mais seis meses de missão humanitária, parecem estar com excelente moral. Ao contrário dos familiares, que escondem os seus medos por detrás do anonimato ou de muros de silêncio impostos pelos seus rapazes. Quase todas as pessoas contactadas pelo PÚBLICO têm reacções idênticas: ou se recusam a falar, ou pedem total confidencialidade. Por recearem as reacções dos filhos, maridos, namorados. Os que agora vão partir fazem-no com muito orgulho e mostram-se irredutíveis nas suas convicções. "São maioritariamente jovens, não pensam em consequências e têm um desmesurado espírito de aventura. E como não está fácil arranjar emprego, o dinheiro que lá vão ganhar, em apenas seis meses, é demasiado aliciante para eles." Assim se justifica a mãe de um soldado, após frustradas as tentativas de convencer o filho a não partir. As remunerações acabam por ter um peso considerável na tomada da decisão: para além do contrato-base de soldado, que ronda os 70 contos, recebem uma compensação pela deslocação, na ordem de, pelo menos, 500 contos mensais. Parece também ter havido também uma mentalização especial para ajudar estes jovens a enfrentar as circunstâncias. "Ele está muito diferente, ele e os amigos estão completamente obcecados, só falam na tropa e dos seus superiores, referindo-se a eles como se fosse uns ''deusezinhos''. Ninguém consegue interferir nesse estado de espírito", conta uma amiga. "Eles reagem muito mal à pressão social criada em torno do assunto [da síndrome das Balcãs]", diz uma mãe de um dos militares. E outra pessoa refere mesmo os comentários de um oficial às imagens de uma reunião promovida pela Associação dos Familiares e Amigos dos Militares Destacados para os Balcãs: "Se pusessem mas é uma bomba nesta gente, se se metessem na sua vida..." A adesão a estes encontros foi sempre muito reduzida, e nunca qualquer soldado marcou presença. E o primeiro objectivo desta associação já está gorado: os soldados vão mesmo partir, ainda antes de haver conclusões definitivas sobre os riscos que podem correr. "Não se compreende, nunca se compreenderá e será indesculpável (...) que continue o envio de tropas. Poderá mais alguém acreditar e confiar nos seus governantes, se algum deles vier afectado?", lê-se numa carta enviada esta semana por um dos membros da associação aos responsáveis pelas Forças Armadas, Assembleia da República e Governo. Em terra ficam apenas dois militares, que, entretanto, renunciaram a acompanhar a missão, e um batalhão de pais e amigos, que, mais ou menos em surdina, aguardam expectantes e temerosos o desenrolar dos acontecimentos. Leonete Botelho e Luísa Pinto OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Ministro da Defesa por um fio

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