Baptista-Bastos*: Não tenho medo de dizer que tive medo

25-11-2000
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Onde é que estava no 25 de Novembro?

Baptista-Bastos*: Não Tenho Medo de Dizer Que Tive Medo

Sábado, 25 de Novembro de 2000

No dia 25 de Novembro, fui registar o meu filho Filipe, que nasceu no dia 18 de Outubro, o único dos meus três filhos que nasceu em liberdade. Sabia que as armas estavam a ser contadas. Estava muito preocupado porque não sabia o que ia acontecer e tive a impressão que tudo isto se ia transformar num banho de sangue. Hoje, sabemos que havia forças de direita interessadas nisso, num confronto que recuperasse o antigamente. Estive na redacção do "Diário Popular". O ambiente era de cortar à faca. Tive a noção de que ia voltar a censura. A correlação de forças pendia para as forças de direita e da extrema-direita, que estavam todas debaixo do guarda-chuva do PS. Não tenho medo de dizer que tive medo.

Era militante do PCP. Hoje sei, por aquilo que o meu querido amigo Raimundo Narciso disse ao PÚBLICO, que há um recuo político, estratégico, de Álvaro Cunhal que penso que foi benéfico.

Quero dizer uma coisa que nunca disse a ninguém e quero que seja público: se não houvesse o 25 de Novembro eu tenho a impressão de que as coisas seriam muito complicadas para várias pessoas e entre essas pessoas estaria eu, porque não tenho papas na língua e já estava em desacordo com o rumo de certas coisas, era previsível que houvesse um choque.

Mas acho que o 25 de Novembro devia ter sido dois anos depois. Talvez não houvesse tanta regressão relativamente às coisas essenciais. Tinha-se solidificado muito mais coisas daquilo a que se chama, apropriada ou inapropriadamente, as conquistas do 25 de Abril. A revolução com mais dois anos teria sedimentado, pelo menos, uma consciência democrática mais popular e mais cívica. Porque esta democracia lúgubre em que vivemos não interessa a ninguém. Há muitas pessoas que traíram a alma. E não há pior traição que a traição da própria alma.

Mas estou muito feliz por Portugal ter pregado um grande susto à Europa. Pregámos um grande susto à Europa.

*escritor e jornalista

Onde é que estava no 25 de Novembro?

Baptista-Bastos*: Não Tenho Medo de Dizer Que Tive Medo

Sábado, 25 de Novembro de 2000

No dia 25 de Novembro, fui registar o meu filho Filipe, que nasceu no dia 18 de Outubro, o único dos meus três filhos que nasceu em liberdade. Sabia que as armas estavam a ser contadas. Estava muito preocupado porque não sabia o que ia acontecer e tive a impressão que tudo isto se ia transformar num banho de sangue. Hoje, sabemos que havia forças de direita interessadas nisso, num confronto que recuperasse o antigamente. Estive na redacção do "Diário Popular". O ambiente era de cortar à faca. Tive a noção de que ia voltar a censura. A correlação de forças pendia para as forças de direita e da extrema-direita, que estavam todas debaixo do guarda-chuva do PS. Não tenho medo de dizer que tive medo.

Era militante do PCP. Hoje sei, por aquilo que o meu querido amigo Raimundo Narciso disse ao PÚBLICO, que há um recuo político, estratégico, de Álvaro Cunhal que penso que foi benéfico.

Quero dizer uma coisa que nunca disse a ninguém e quero que seja público: se não houvesse o 25 de Novembro eu tenho a impressão de que as coisas seriam muito complicadas para várias pessoas e entre essas pessoas estaria eu, porque não tenho papas na língua e já estava em desacordo com o rumo de certas coisas, era previsível que houvesse um choque.

Mas acho que o 25 de Novembro devia ter sido dois anos depois. Talvez não houvesse tanta regressão relativamente às coisas essenciais. Tinha-se solidificado muito mais coisas daquilo a que se chama, apropriada ou inapropriadamente, as conquistas do 25 de Abril. A revolução com mais dois anos teria sedimentado, pelo menos, uma consciência democrática mais popular e mais cívica. Porque esta democracia lúgubre em que vivemos não interessa a ninguém. Há muitas pessoas que traíram a alma. E não há pior traição que a traição da própria alma.

Mas estou muito feliz por Portugal ter pregado um grande susto à Europa. Pregámos um grande susto à Europa.

*escritor e jornalista

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