Otelo conta como Costa Gomes conseguiu livrar-se de Vasco Gonçalves

01-08-2001
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Otelo Conta como Costa Gomes Conseguiu Livrar-se de Vasco Gonçalves

Quarta-feira, 1 de Agosto de 2001

Um homem sério, sibilino e duro

Otelo Saraiva de Carvalho recorda Costa Gomes como "um homem afável, simpático, de um enorme humanismo", mas dotado de "uma sibilina capacidade para resolver, de uma forma dura, situções que envolvessem amigos e camaradas". E para ilustrar tal ideia, conta como ele lidou com Vasco Gonçalves, no Verão de 1975.

"Era claro para toda a gente que Vasco Gonçalves, instrumentalizado pelo PCP, estava numa situação muito difícil, com o seu prestígio muito abalado, quer a nível militar, quer da classe média alta. Para o tirar da ribalta, Costa Gomes propôs-lhe a chefia do Estado-Maior General das Forças Armadas (EMGFA), o que provocou uma reacção extremamente dura por parte da generalidade dos oficiais, muitos dos quais acabaram por engrossar o Grupo dos Nove".

O antigo comandante do COPCON prossegue: "É claro que, perante aquela reacção, Vasco Gonçalves não podia ir chefiar o EMGFA. Então Costa Gomes convidou-o para ficar à frente do V Governo, que ia durar pouco. Perguntei-lhe qual era a ideia. Expôr Vasco Gonçalves, penalizá-lo mais? Muito calmamente, ele respondeu-me ''é isso mesmo que eu pretendo''".

Otelo declara que tal atitude, da parte do então Presidente da República, o deixou "chocado". "É que eles eram amigos, desde antes do 25 de Abril, Vasco Gonçalves fora indigitado pelo MFA para os contactos com Costa Gomes, e ambos participaram em reuniões militares clandestinas promovidas pelo PCP".

Para este oficial na reserva, em Costa Gomes "havia uma ambiguidade calculada". "Ele deixava arrefecer as situações para depois as resolver a frio, dava a ideia de que era indeciso, mas não era, apenas não agia de forma afectiva, era frio e racional, um homem de grande qualidade, de grande inteligência".

E, para ilustrar estas características de personalidade, vai buscar acontecimentos que situa no 25 de Novembro [de 1975]: "Ele evitou, juntamente comigo, um banho de sangue, uma guerra civil. Eu reivindico a minha parte. Nesse dia, ele telefonou-me para o COPCON a solicitar a minha presença em Belém, e só descansou quando eu me apresentei. Disse-me que estava apreensivo e que eu o tinha sossegado, mas que devíamos tomar toda as providências para evitar que os militares saíssem para a rua".

Uma dessas "providências" foi "fazer uma proposta para Costa Martins levar aos páraquedistas e conseguir assim que eles voltassem a Tancos". "Costa Gomes mandou dizer por Costa Martins que iria comigo a Tancos garantir aos páraquedistas que eles deixariam de ser tutelados pelo Estado-Maior da Força Aérea e que passavam a depender do COPCON. Ficámos os dois à espera de uma reacção à proposta, mas Costa Martins nunca mais apareceu".

Estes episódios, na opinião do antigo militar de Abril, hoje tenente-coronel na reserva, revelam que houve sempre, da parte daquele que era o único marechal português, "uma vontade enorme de impedir confusões". "Era um homem extremamente ponderado, tomava decisões mas aguardava o melhor momento para as anunciar, era sério, sábio e capaz de gerir o tempo".

Isabel Braga

Otelo Conta como Costa Gomes Conseguiu Livrar-se de Vasco Gonçalves

Quarta-feira, 1 de Agosto de 2001

Um homem sério, sibilino e duro

Otelo Saraiva de Carvalho recorda Costa Gomes como "um homem afável, simpático, de um enorme humanismo", mas dotado de "uma sibilina capacidade para resolver, de uma forma dura, situções que envolvessem amigos e camaradas". E para ilustrar tal ideia, conta como ele lidou com Vasco Gonçalves, no Verão de 1975.

"Era claro para toda a gente que Vasco Gonçalves, instrumentalizado pelo PCP, estava numa situação muito difícil, com o seu prestígio muito abalado, quer a nível militar, quer da classe média alta. Para o tirar da ribalta, Costa Gomes propôs-lhe a chefia do Estado-Maior General das Forças Armadas (EMGFA), o que provocou uma reacção extremamente dura por parte da generalidade dos oficiais, muitos dos quais acabaram por engrossar o Grupo dos Nove".

O antigo comandante do COPCON prossegue: "É claro que, perante aquela reacção, Vasco Gonçalves não podia ir chefiar o EMGFA. Então Costa Gomes convidou-o para ficar à frente do V Governo, que ia durar pouco. Perguntei-lhe qual era a ideia. Expôr Vasco Gonçalves, penalizá-lo mais? Muito calmamente, ele respondeu-me ''é isso mesmo que eu pretendo''".

Otelo declara que tal atitude, da parte do então Presidente da República, o deixou "chocado". "É que eles eram amigos, desde antes do 25 de Abril, Vasco Gonçalves fora indigitado pelo MFA para os contactos com Costa Gomes, e ambos participaram em reuniões militares clandestinas promovidas pelo PCP".

Para este oficial na reserva, em Costa Gomes "havia uma ambiguidade calculada". "Ele deixava arrefecer as situações para depois as resolver a frio, dava a ideia de que era indeciso, mas não era, apenas não agia de forma afectiva, era frio e racional, um homem de grande qualidade, de grande inteligência".

E, para ilustrar estas características de personalidade, vai buscar acontecimentos que situa no 25 de Novembro [de 1975]: "Ele evitou, juntamente comigo, um banho de sangue, uma guerra civil. Eu reivindico a minha parte. Nesse dia, ele telefonou-me para o COPCON a solicitar a minha presença em Belém, e só descansou quando eu me apresentei. Disse-me que estava apreensivo e que eu o tinha sossegado, mas que devíamos tomar toda as providências para evitar que os militares saíssem para a rua".

Uma dessas "providências" foi "fazer uma proposta para Costa Martins levar aos páraquedistas e conseguir assim que eles voltassem a Tancos". "Costa Gomes mandou dizer por Costa Martins que iria comigo a Tancos garantir aos páraquedistas que eles deixariam de ser tutelados pelo Estado-Maior da Força Aérea e que passavam a depender do COPCON. Ficámos os dois à espera de uma reacção à proposta, mas Costa Martins nunca mais apareceu".

Estes episódios, na opinião do antigo militar de Abril, hoje tenente-coronel na reserva, revelam que houve sempre, da parte daquele que era o único marechal português, "uma vontade enorme de impedir confusões". "Era um homem extremamente ponderado, tomava decisões mas aguardava o melhor momento para as anunciar, era sério, sábio e capaz de gerir o tempo".

Isabel Braga

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