Declaração interpretativa salva TPI

18-02-2001
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Declaração Interpretativa Salva TPI

Por EUNICE LOURENÇO

Domingo, 18 de Fevereiro de 2001 Conferência no Parlamento começa amanhã Prisão perpétua é o tema mais polémico, mas vai ficar fora da fora da proposta do Governo. Vitalino Canas considera que não é necessário. O Governo considera que não é necessário reafirmar a oposição de Portugal à prisão perpétua na declaração interpretativa sobre o Tribunal Penal internacional (TPI) que irá propor à Assembleia da República. "Seria chover no molhado", disse ao PÚBLICO o secretário de estado da presidência do Conselho de Ministro, Vitalino Canas, encarregado de elaborar a proposta de resolução que o Governo irá levar ao Parlamento. A proposta do Governo irá apenas garantir que Portugal se compromete a julgar pelo seu direito interno portugueses ou estrangeiro acusados dos crimes previstos pelos TPI: genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e de agressão. Segundo Vitalino Canas com essa formulação, até porque remete para a Constituição, não se justifica que, na declaração, Portugal deixe expresso que é contra a prisão perpétua. A declaração interpretativa - que no fundo é uma declaração de princípios feita por um Estado em relação a um tratado que não permitir a colocação de excepções à sua aplicação - é a formula encontrada pelo Governo e pelo PS para "salvar" a ratificação do TPI e a revisão extraordinária da Constituição, depois de alguns deputados terem manifestado problemas de consciência em admitir a prisão perpétua, prevista por aquele tribunal. A proposta de que fosse feita uma declaração interpretativa até foi apresentada pela primeira vez pelo deputado do PSD, Pedro Roseta, numa reunião do seu grupo parlamentar, em que foi discutido o Estatuto do TPI. Perante as dúvidas de alguns deputados sobre se Portugal não estaria a ir contra os princípios consagrados no século XIX e a atitude de outros que até concordam em que a pena perpétua deve ser aplicada quando se trata de crimes como os que aquele tribunal pretende julgar, Pedro Roseta defendeu que a ratificação do Estatuto do TPI deveria ser acompanhada por uma declaração interpretativa, na qual deveria ficar expresso Portugal é contra a pena de morte e contra a prisão perpétua e que se compromete unilateralmente a julgar portugueses pelo seu direito interno. O Tratado de Roma, que estabelece o estatuto do TPI, não admite reservas à suas normas e, portanto, Portugal não poderia estabelecer um acordo, como já faz nos casos de extradição, de entregar o acusado desde que o tribunal garantisse que não se lhe aplicaria uma pena superior à pena máxima da moldura penal portuguesa (25 anos). Por isso, a Portugal só restariam duas opções: não ratificar o estatuto ou fazer uma alteração constitucional em que admite entregar pessoas ao TPI, sujeitando-as assim a prisão perpétua. Essa alteração não irá, contudo, reintroduzir a pena perpétua em Portugal. Ela só poderá ser aplicada no âmbito do TPI e este, como é um tribunal complementar dos tribunais nacionais, só deve actuar quando os tribunais nacionais não possam ou não o queiram fazer. O TPI pode, no entanto, entender que o julgamento não decorreu da forma mais correcta e impor a sua jurisdição. As várias audições realizadas pela comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais foram unânimes na aprovação do TPI e o relatório feito pelo socialista Alberto Costa - que conclui haver problemas constitucionais e defende o desencadeamento de um procedimento de revisão, em moldes idênticos ao daquele que propiciou, em 1992, a ratificação do Tratado de Maastricht - foi aprovado, em Dezembro do ano passado, apenas com os votos contra do PCP. Foi já perante um consenso entre PS e PSD para a revisão extraordinária da Constituição que pessoas como o eurodeputado social-democrata Pacheco Pereira e o bastonário da ordem dos advogados, António Pires de Lima, lançaram a discussão sobre o que consideram ser um "retrocesso", que é Portugal ratificar um tratado que implica o reconhecimento da prisão perpétua. Garantir os quatro quintos A polémica chegou, então, ao Parlamento. No PSD, o assunto ficou resolvido com a proposta de Pedro Roseta. Proposta que o PS e o Governo acabaram por adoptar, pelo menos em parte, quando se viram perante a oposição da secretária-geral da JS, Jamila Madeira. A declaração interpretativa parece, assim, resolver os problemas de consciência que alguns deputados poderiam ter e garantir aos dois partidos do bloco central que não irão faltar votos aos quatro quintos de parlamentares (184) necessários para permitir a revisão extraordinária da Constituição e os dois terços (171 votos) necessários à aprovação das suas alterações. É que, com os já anunciados votos contra do PCP e a liberdade de voto do CDS-PP, nas bancadas do PS e do PSD não poderá haver muito espaço para a liberdade. O PSD já anunciou que conta ter a sua proposta de revisão constitucional pronta dentro de duas semanas, mas o PS deverá demorar mais algum tempo, pois precisa de esperar pela reunião da sua comissão política. Mas, já amanhã, os deputados podem começar a discutir o TPI, pois a AR promove uma conferência sobre a ratificação do tratado de Roma pelos países lusófonos, na qual participam parlamentares, governantes e juristas de Portugal, dos PALOP e do Brasil. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Declaração interpretativa salva TPI

As posições dos deputados

O que diz o Código Penal

EDITORIAL Dúvidas pertinentes

Os problemas constitucionais

Um tribunal que ainda não saiu do papel

Prisão perpétua é "falsa questão"

Os crimes julgados pelo TPI

P&R - Perguntas e respostas

Declaração Interpretativa Salva TPI

Por EUNICE LOURENÇO

Domingo, 18 de Fevereiro de 2001 Conferência no Parlamento começa amanhã Prisão perpétua é o tema mais polémico, mas vai ficar fora da fora da proposta do Governo. Vitalino Canas considera que não é necessário. O Governo considera que não é necessário reafirmar a oposição de Portugal à prisão perpétua na declaração interpretativa sobre o Tribunal Penal internacional (TPI) que irá propor à Assembleia da República. "Seria chover no molhado", disse ao PÚBLICO o secretário de estado da presidência do Conselho de Ministro, Vitalino Canas, encarregado de elaborar a proposta de resolução que o Governo irá levar ao Parlamento. A proposta do Governo irá apenas garantir que Portugal se compromete a julgar pelo seu direito interno portugueses ou estrangeiro acusados dos crimes previstos pelos TPI: genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e de agressão. Segundo Vitalino Canas com essa formulação, até porque remete para a Constituição, não se justifica que, na declaração, Portugal deixe expresso que é contra a prisão perpétua. A declaração interpretativa - que no fundo é uma declaração de princípios feita por um Estado em relação a um tratado que não permitir a colocação de excepções à sua aplicação - é a formula encontrada pelo Governo e pelo PS para "salvar" a ratificação do TPI e a revisão extraordinária da Constituição, depois de alguns deputados terem manifestado problemas de consciência em admitir a prisão perpétua, prevista por aquele tribunal. A proposta de que fosse feita uma declaração interpretativa até foi apresentada pela primeira vez pelo deputado do PSD, Pedro Roseta, numa reunião do seu grupo parlamentar, em que foi discutido o Estatuto do TPI. Perante as dúvidas de alguns deputados sobre se Portugal não estaria a ir contra os princípios consagrados no século XIX e a atitude de outros que até concordam em que a pena perpétua deve ser aplicada quando se trata de crimes como os que aquele tribunal pretende julgar, Pedro Roseta defendeu que a ratificação do Estatuto do TPI deveria ser acompanhada por uma declaração interpretativa, na qual deveria ficar expresso Portugal é contra a pena de morte e contra a prisão perpétua e que se compromete unilateralmente a julgar portugueses pelo seu direito interno. O Tratado de Roma, que estabelece o estatuto do TPI, não admite reservas à suas normas e, portanto, Portugal não poderia estabelecer um acordo, como já faz nos casos de extradição, de entregar o acusado desde que o tribunal garantisse que não se lhe aplicaria uma pena superior à pena máxima da moldura penal portuguesa (25 anos). Por isso, a Portugal só restariam duas opções: não ratificar o estatuto ou fazer uma alteração constitucional em que admite entregar pessoas ao TPI, sujeitando-as assim a prisão perpétua. Essa alteração não irá, contudo, reintroduzir a pena perpétua em Portugal. Ela só poderá ser aplicada no âmbito do TPI e este, como é um tribunal complementar dos tribunais nacionais, só deve actuar quando os tribunais nacionais não possam ou não o queiram fazer. O TPI pode, no entanto, entender que o julgamento não decorreu da forma mais correcta e impor a sua jurisdição. As várias audições realizadas pela comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais foram unânimes na aprovação do TPI e o relatório feito pelo socialista Alberto Costa - que conclui haver problemas constitucionais e defende o desencadeamento de um procedimento de revisão, em moldes idênticos ao daquele que propiciou, em 1992, a ratificação do Tratado de Maastricht - foi aprovado, em Dezembro do ano passado, apenas com os votos contra do PCP. Foi já perante um consenso entre PS e PSD para a revisão extraordinária da Constituição que pessoas como o eurodeputado social-democrata Pacheco Pereira e o bastonário da ordem dos advogados, António Pires de Lima, lançaram a discussão sobre o que consideram ser um "retrocesso", que é Portugal ratificar um tratado que implica o reconhecimento da prisão perpétua. Garantir os quatro quintos A polémica chegou, então, ao Parlamento. No PSD, o assunto ficou resolvido com a proposta de Pedro Roseta. Proposta que o PS e o Governo acabaram por adoptar, pelo menos em parte, quando se viram perante a oposição da secretária-geral da JS, Jamila Madeira. A declaração interpretativa parece, assim, resolver os problemas de consciência que alguns deputados poderiam ter e garantir aos dois partidos do bloco central que não irão faltar votos aos quatro quintos de parlamentares (184) necessários para permitir a revisão extraordinária da Constituição e os dois terços (171 votos) necessários à aprovação das suas alterações. É que, com os já anunciados votos contra do PCP e a liberdade de voto do CDS-PP, nas bancadas do PS e do PSD não poderá haver muito espaço para a liberdade. O PSD já anunciou que conta ter a sua proposta de revisão constitucional pronta dentro de duas semanas, mas o PS deverá demorar mais algum tempo, pois precisa de esperar pela reunião da sua comissão política. Mas, já amanhã, os deputados podem começar a discutir o TPI, pois a AR promove uma conferência sobre a ratificação do tratado de Roma pelos países lusófonos, na qual participam parlamentares, governantes e juristas de Portugal, dos PALOP e do Brasil. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Declaração interpretativa salva TPI

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Um tribunal que ainda não saiu do papel

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