Operação Seguros & Pensões

03-08-2004
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Operação Seguros & Pensões

Segunda-feira, 26 de Julho de 2004

Com a compra dos ramos reais ao BCP, a Caixa prossegue a sua estratégia de conglomerado financeiro e liberta o banco de Jardim Gonçalves de uma actividade indesejada. Quem não ficou contente com a transacção foi a DECO que teme a concentração no sector

Cristina Ferreira

Depois de meses de indecisão, o BCP veio finalmente anunciar na semana passada um novo rearranjo accionista para a sua "holding" seguradora, a Seguros & Pensões (S&P), mantendo nas suas mãos 50 por cento do segmento de "bancassurance" (seguros de capitalização e produtos comercializados aos balcões do banco) e três por cento do sector Não Vida. Com a transacção, encaixará um total de 836 milhões de euros, ou seja, menos 80 milhões de euros do que o valor dispendido em 2003 pela totalidade da S&P, o que representa uma mais valia potencial próxima dos 350 milhões de euros.

Nas horas seguintes à divulgação do negócio celebrado entre o Banco Comercial Português (Millennium bcp), a Caixa Geral de Depósitos (CGD) e o grupo holandês Fortis para a venda e compra da S&P, os analistas aproveitaram para evocar a sua grande dimensão - o montante envolvido corresponde a cerca do dobro do valor de venda da Portucel (433 milhões de euros) - e destacar as consequências imediatas no sistema segurador nacional: o BCP retira-se do sector, delegando na Fortis o controlo da gestão dos activos, pois manterá uma presença forte no ramo Vida, com cerca de 21 por cento de quota de mercado; a CGD passará a controlar 38 por cento do ramo Não Vida e 28 por cento do negócio Vida e Não Vida. Com um volume de prémios superior a 2,6 mil milhões de euros, o banco público transforma-se ainda no terceiro maior operador segurador da Península Ibérica. Ao contrário do BCP, a Caixa prossegue uma estratégia de "conglomerado financeiro".

Apesar do efeito negativo nas suas contas, pois a compra dos activos ao BCP envolve uma menos valia de 300 milhões de euros para a Caixa, o banco público herda prémios de 806 milhões de euros, pois recebe a totalidade da Império Bonança, a Impergesto, a Servicomercial, a Seguro Directo (excluindo os produtos vendidos aos balcões do BCP), assim como os contratos da Medis vendidos pela Império (ICI).

Outra consequência imediata desta operação prende-se com uma das metas anunciadas pelo presidente do Comercial Português, Jorge Jardim Gonçalves, quando iniciou o processo de reestruturação do grupo: libertar a instituição da componente de risco associada à actividade seguradora (preservando o título BCP da volatilidade deste mercado), para se focalizar na actividade "core" em Portugal, Polónia e Grécia. A operação com a Caixa traduzir-se-á para o BCP num aumento imediato do seu rácio de Core Tier 1 de 0,3 por cento e num aumento de reservas de 150 milhões de euros.

O acordo envolvendo o ramo Não Vida da S&P (ramos reais, acidentes de trabalho e acidentes pessoais), prevê que setenta por cento dos 343 milhões de euros que a Caixa irá pagar a Jardim Gonçalves sejam em dinheiro, devendo o comprador liquidar os restantes 30 por cento até 2007, acrescidos dos juros correspondentes (mas a Caixa recebe a integralidade da gestão. A possibilidade de dispersar em bolsa os títulos que falta adquirir foi já admitida.

A transacção reflectiu-se ainda na estrutura accionista do BCP, pois a Caixa procedeu à venda de metade da sua participação neste banco, onde passou a controlar três por cento do capital - posição que António de Sousa já garantiu ser de "referência" e para manter. O presidente da CGD explicou que não seria possível continuar a deter seis por cento do capital do Comercial Português e adquirir a totalidade do canal não bancário da S&P (o que lhe custou 343 milhões de euros), pois isso "degradaria os rácios da instituição pública e implicaria o recurso a um aumento de capital". No âmbito do acordo, a Caixa colocou à venda 110 milhões de acções BCP, através de um processo de "accelerated book building".

Concentração investigada

Quem não ficou indiferente à transacção entre o BCP e a Caixa foi a associação de defesa dos consumidores DECO, que veio já a público chamar a atenção para "a excessiva concentração que se irá registar nos ramos Não Vida", o que "coloca sérios problemas aos consumidores, através da restrição à concorrência, pelo que esperamos que as autoridades competentes analisem este caso com muito cuidado". Jorge Morgado, secretário-geral da DECO, disse à Lusa ter pedido "à Autoridade da Concorrência e ao Instituto de Seguros de Portugal que analisem os efeitos destes negócios, que tornam Portugal um dos países europeus com maior concentração na área seguradora". Morgado apontou o caso do ramo automóvel, onde a CGD passa a controlar as duas maiores seguradoras que comercializam via telefone: "Estas companhias praticavam os preços mais baixos e pressionavam as restantes seguradoras a seguir essa tendência, mas isso pode estar agora em causa."

De fora das conversações entre os dois maiores bancos portugueses manteve-se 21 por cento de quota de mercado do ramo Vida e três por cento do Não Vida (Ocidental Vida, Ocidental Seguros, Pensões Gere e Médis, aqui exceptuando os seguros de doença vendidos pela Império). Nesta área, o BCP celebrou uma parceria com a Fortis, a que chamou Millennium Fortis, e que implicou a venda de 50 por cento, mais uma acção, da actividade de "bancassurance", que atinge prémios de 1,26 mil milhões de euros e activos sob gestão de 4,4 mil milhões de euros. O valor de negociação foi de 500 milhões de euros. Os holandeses ficam com a gestão da empresa e estabelecem com o BCP um acordo de exclusividade de longo prazo para a distribuição, no mercado português, através do seu canal bancário de produtos, em especial financeiros, que se caracterizam pela sua reduzida sinistralidade, permitindo à entidade que o gere transaccionar sem ficar proprietária dos seus riscos, mas assegurando os proveitos resultantes das comissões de distribuição, como ficou acordado. A venda da área de "bancassurance" à Fortis, trará, segundo o BCP, um aumento imediato no rácio de capital Core Tier 1 em 0,4 por cento e aumento de reservas de 218 milhões de euros.

Operação Seguros & Pensões

Segunda-feira, 26 de Julho de 2004

Com a compra dos ramos reais ao BCP, a Caixa prossegue a sua estratégia de conglomerado financeiro e liberta o banco de Jardim Gonçalves de uma actividade indesejada. Quem não ficou contente com a transacção foi a DECO que teme a concentração no sector

Cristina Ferreira

Depois de meses de indecisão, o BCP veio finalmente anunciar na semana passada um novo rearranjo accionista para a sua "holding" seguradora, a Seguros & Pensões (S&P), mantendo nas suas mãos 50 por cento do segmento de "bancassurance" (seguros de capitalização e produtos comercializados aos balcões do banco) e três por cento do sector Não Vida. Com a transacção, encaixará um total de 836 milhões de euros, ou seja, menos 80 milhões de euros do que o valor dispendido em 2003 pela totalidade da S&P, o que representa uma mais valia potencial próxima dos 350 milhões de euros.

Nas horas seguintes à divulgação do negócio celebrado entre o Banco Comercial Português (Millennium bcp), a Caixa Geral de Depósitos (CGD) e o grupo holandês Fortis para a venda e compra da S&P, os analistas aproveitaram para evocar a sua grande dimensão - o montante envolvido corresponde a cerca do dobro do valor de venda da Portucel (433 milhões de euros) - e destacar as consequências imediatas no sistema segurador nacional: o BCP retira-se do sector, delegando na Fortis o controlo da gestão dos activos, pois manterá uma presença forte no ramo Vida, com cerca de 21 por cento de quota de mercado; a CGD passará a controlar 38 por cento do ramo Não Vida e 28 por cento do negócio Vida e Não Vida. Com um volume de prémios superior a 2,6 mil milhões de euros, o banco público transforma-se ainda no terceiro maior operador segurador da Península Ibérica. Ao contrário do BCP, a Caixa prossegue uma estratégia de "conglomerado financeiro".

Apesar do efeito negativo nas suas contas, pois a compra dos activos ao BCP envolve uma menos valia de 300 milhões de euros para a Caixa, o banco público herda prémios de 806 milhões de euros, pois recebe a totalidade da Império Bonança, a Impergesto, a Servicomercial, a Seguro Directo (excluindo os produtos vendidos aos balcões do BCP), assim como os contratos da Medis vendidos pela Império (ICI).

Outra consequência imediata desta operação prende-se com uma das metas anunciadas pelo presidente do Comercial Português, Jorge Jardim Gonçalves, quando iniciou o processo de reestruturação do grupo: libertar a instituição da componente de risco associada à actividade seguradora (preservando o título BCP da volatilidade deste mercado), para se focalizar na actividade "core" em Portugal, Polónia e Grécia. A operação com a Caixa traduzir-se-á para o BCP num aumento imediato do seu rácio de Core Tier 1 de 0,3 por cento e num aumento de reservas de 150 milhões de euros.

O acordo envolvendo o ramo Não Vida da S&P (ramos reais, acidentes de trabalho e acidentes pessoais), prevê que setenta por cento dos 343 milhões de euros que a Caixa irá pagar a Jardim Gonçalves sejam em dinheiro, devendo o comprador liquidar os restantes 30 por cento até 2007, acrescidos dos juros correspondentes (mas a Caixa recebe a integralidade da gestão. A possibilidade de dispersar em bolsa os títulos que falta adquirir foi já admitida.

A transacção reflectiu-se ainda na estrutura accionista do BCP, pois a Caixa procedeu à venda de metade da sua participação neste banco, onde passou a controlar três por cento do capital - posição que António de Sousa já garantiu ser de "referência" e para manter. O presidente da CGD explicou que não seria possível continuar a deter seis por cento do capital do Comercial Português e adquirir a totalidade do canal não bancário da S&P (o que lhe custou 343 milhões de euros), pois isso "degradaria os rácios da instituição pública e implicaria o recurso a um aumento de capital". No âmbito do acordo, a Caixa colocou à venda 110 milhões de acções BCP, através de um processo de "accelerated book building".

Concentração investigada

Quem não ficou indiferente à transacção entre o BCP e a Caixa foi a associação de defesa dos consumidores DECO, que veio já a público chamar a atenção para "a excessiva concentração que se irá registar nos ramos Não Vida", o que "coloca sérios problemas aos consumidores, através da restrição à concorrência, pelo que esperamos que as autoridades competentes analisem este caso com muito cuidado". Jorge Morgado, secretário-geral da DECO, disse à Lusa ter pedido "à Autoridade da Concorrência e ao Instituto de Seguros de Portugal que analisem os efeitos destes negócios, que tornam Portugal um dos países europeus com maior concentração na área seguradora". Morgado apontou o caso do ramo automóvel, onde a CGD passa a controlar as duas maiores seguradoras que comercializam via telefone: "Estas companhias praticavam os preços mais baixos e pressionavam as restantes seguradoras a seguir essa tendência, mas isso pode estar agora em causa."

De fora das conversações entre os dois maiores bancos portugueses manteve-se 21 por cento de quota de mercado do ramo Vida e três por cento do Não Vida (Ocidental Vida, Ocidental Seguros, Pensões Gere e Médis, aqui exceptuando os seguros de doença vendidos pela Império). Nesta área, o BCP celebrou uma parceria com a Fortis, a que chamou Millennium Fortis, e que implicou a venda de 50 por cento, mais uma acção, da actividade de "bancassurance", que atinge prémios de 1,26 mil milhões de euros e activos sob gestão de 4,4 mil milhões de euros. O valor de negociação foi de 500 milhões de euros. Os holandeses ficam com a gestão da empresa e estabelecem com o BCP um acordo de exclusividade de longo prazo para a distribuição, no mercado português, através do seu canal bancário de produtos, em especial financeiros, que se caracterizam pela sua reduzida sinistralidade, permitindo à entidade que o gere transaccionar sem ficar proprietária dos seus riscos, mas assegurando os proveitos resultantes das comissões de distribuição, como ficou acordado. A venda da área de "bancassurance" à Fortis, trará, segundo o BCP, um aumento imediato no rácio de capital Core Tier 1 em 0,4 por cento e aumento de reservas de 218 milhões de euros.

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