Quem deve mandar na função pública

03-08-2004
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Quem Deve Mandar na Função Pública

Por ESTÊVÃO DE MOURA

Segunda-feira, 26 de Julho de 2004

Nesta, que será a última crónica antes das férias de Verão iremos analisar uma questão à qual nem sempre é dada a devida atenção: na estrutura do governo de Portugal a administração pública está bem inserida no minsitério das Finanças?

Antes de explanar argumentos devemos colocar uma questão prévia: esta questão deve ser discutida? É discutida? Se a resposta for afirmativa, isso significará que o assunto não está suficientemente consolidado e sobre o mesmo existem dúvidas importantes. Em caso negativo o significado é o de que o assunto é pacífico e nem valerá a pena perder tempo com ele. Na minha opinião à volta deste assunte existe alguma confusão e isso é razão quanto baste para que o discutamos aqui.

Num recente comentário na SIC Notícias, a propósito do novo governo, o Director da estação, Ricardo Costa, comentando a acção do governo de Durão Barroso disse mais ou menos o seguinte: uma das coisas que o governo fez bem foi integrar a administração pública nas Finanças já que assim pôde controlar melhor a despesa, ao contrário do Governo anterior (de António Guterres) que a colocou sobre a supervisão de um ministério próprio (Jorge Coelho).

No modo e com a convicção com que o jornalista disse o que disse até parece que a sua afirmação era o mais consensual que existe: que é uma verdade insofismável que o melhor local para colocar a administração pública, na orgânica de um Governo é o ministério das Finanças e que tal deve ser feito, sobretudo, porque essa é a melhor maneira de controlar a despesa. Será tudo isto verosímil?

A localização orgânica do órgão que tutela a administração pública nunca terá sido objecto de uma discussão profunda: parecendo reger-se por critérios de mera sensibilidade orgânica. Neste aspecto, a posição assumida pelo editor de política nacional da SIC não surpreende: ela corresponde a um lugar comum que é fácil aceitar como bom: quem paga os salários e benefícios (a despesa) é o ministério das finanças e logo, quem deve ficar com a responsabilidade pela supervisão da Administração é quem paga.

Na aparência verdadeira esta premissa é, na realidade, muito discutível. Se a questão da inserção orgânica do órgão responsável pela administração pública fosse discutida, em vez de ser resolvida (na aparência...) de forma expedita, mas inconsequente, teríamos espaço para um debate profundo.

Olhando para a realidade, em termos de simples constatação, o que é que verificamos? A integração da administração pública no ministério das Finanças resolveu algum dos problemas crónicos com que o Estado se debate nesta área?

Não seria esta razão suficiente para repensar o modelo privilegiado em Portugal e repensar outra solução? Em condições normais sim! No contexto em que vivemos, não! Porquê? Por uma razão, em meu entender, bem simples: a acção dos órgãos políticos, raramente é avaliada em termos dos resultados obtidos (desempenho) porque quando chega o tempo de isso ser feito não há tempo, nem vontade de o fazer. Alguém: quem? vai fazer o balanço do que foi a gestão da administração pública durante o Governo de Durão Barroso e da sua ministra das Finanças Manuela Ferreira Leite? Temos dúvidas que haja alguém verdadeiramente interessado nessa acção.

E como correram as coisas? Os resultados foram bons? Maus? Alguma vez saberemos?

Voltemos á questão da inserção orgânica da administração pública no Governo. Para enquadrar esta questão é necessário responder a esta outra: o que é a administração pública? Na perspectiva orgânica, a administração pública é as pessoas (os recursos humanos) que trabalham para o Estado.

Ora, se o Estado fosse uma organização lucrativa ou mesmo não-lucrativa, onde é que estariam localizados organicamente os recursos humanos: na Direcção Financeira? Que é quem se responsabiliza, em última instância, pelo despoletar do processo de pagamento de salários e benefícios?

Hoje em dia contam-se pelos dedos as organizações com expressão, sejam lucrativas ou não-lucrativas em que as pessoas (os recursos humanos) estão integrados organicamente na área financeira. Este modelo é, aliás, considerado ultrapassado e julgado pouco apropriado para gerir pessoas no actual marco organizacional.

A integração da administração pública no ministério das Finanças corresponde a um modelo desajustado de gestão de pessoas que não permite obter o máximo desempenho das pessoas.

A função de gestão das pessoas, a que corresponde no Estado a administração pública, é hoje uma área que tanto em termos estratégicos, como operacionais, desfruta de grande autonomia orgânica. A localização orgânica da gestão de pessoas não tem nada a ver com a despesa, mas sim com os objectivos que esta deve alcançar e tal como nas organizações privadas se aconselha que a função de gestão das pessoas esteja o mais próximo possível do líder máximo da organização, também no Estado isso deveria acontecer.

O lugar da administração pública, no Estado, é junto do primeiro-ministro. Porque é aí que reside a autoridade para obrigar a fazer aquilo que é necessário fazer no domínio organizacional. O ministro das Finanças poderá sempre dizer que não tem dinheiro: mas esse nunca foi, nem será, no futuro previsível, o problema central das mudanças que há que fazer na administração pública.

estevaomoura@yahoo.com

Quem Deve Mandar na Função Pública

Por ESTÊVÃO DE MOURA

Segunda-feira, 26 de Julho de 2004

Nesta, que será a última crónica antes das férias de Verão iremos analisar uma questão à qual nem sempre é dada a devida atenção: na estrutura do governo de Portugal a administração pública está bem inserida no minsitério das Finanças?

Antes de explanar argumentos devemos colocar uma questão prévia: esta questão deve ser discutida? É discutida? Se a resposta for afirmativa, isso significará que o assunto não está suficientemente consolidado e sobre o mesmo existem dúvidas importantes. Em caso negativo o significado é o de que o assunto é pacífico e nem valerá a pena perder tempo com ele. Na minha opinião à volta deste assunte existe alguma confusão e isso é razão quanto baste para que o discutamos aqui.

Num recente comentário na SIC Notícias, a propósito do novo governo, o Director da estação, Ricardo Costa, comentando a acção do governo de Durão Barroso disse mais ou menos o seguinte: uma das coisas que o governo fez bem foi integrar a administração pública nas Finanças já que assim pôde controlar melhor a despesa, ao contrário do Governo anterior (de António Guterres) que a colocou sobre a supervisão de um ministério próprio (Jorge Coelho).

No modo e com a convicção com que o jornalista disse o que disse até parece que a sua afirmação era o mais consensual que existe: que é uma verdade insofismável que o melhor local para colocar a administração pública, na orgânica de um Governo é o ministério das Finanças e que tal deve ser feito, sobretudo, porque essa é a melhor maneira de controlar a despesa. Será tudo isto verosímil?

A localização orgânica do órgão que tutela a administração pública nunca terá sido objecto de uma discussão profunda: parecendo reger-se por critérios de mera sensibilidade orgânica. Neste aspecto, a posição assumida pelo editor de política nacional da SIC não surpreende: ela corresponde a um lugar comum que é fácil aceitar como bom: quem paga os salários e benefícios (a despesa) é o ministério das finanças e logo, quem deve ficar com a responsabilidade pela supervisão da Administração é quem paga.

Na aparência verdadeira esta premissa é, na realidade, muito discutível. Se a questão da inserção orgânica do órgão responsável pela administração pública fosse discutida, em vez de ser resolvida (na aparência...) de forma expedita, mas inconsequente, teríamos espaço para um debate profundo.

Olhando para a realidade, em termos de simples constatação, o que é que verificamos? A integração da administração pública no ministério das Finanças resolveu algum dos problemas crónicos com que o Estado se debate nesta área?

Não seria esta razão suficiente para repensar o modelo privilegiado em Portugal e repensar outra solução? Em condições normais sim! No contexto em que vivemos, não! Porquê? Por uma razão, em meu entender, bem simples: a acção dos órgãos políticos, raramente é avaliada em termos dos resultados obtidos (desempenho) porque quando chega o tempo de isso ser feito não há tempo, nem vontade de o fazer. Alguém: quem? vai fazer o balanço do que foi a gestão da administração pública durante o Governo de Durão Barroso e da sua ministra das Finanças Manuela Ferreira Leite? Temos dúvidas que haja alguém verdadeiramente interessado nessa acção.

E como correram as coisas? Os resultados foram bons? Maus? Alguma vez saberemos?

Voltemos á questão da inserção orgânica da administração pública no Governo. Para enquadrar esta questão é necessário responder a esta outra: o que é a administração pública? Na perspectiva orgânica, a administração pública é as pessoas (os recursos humanos) que trabalham para o Estado.

Ora, se o Estado fosse uma organização lucrativa ou mesmo não-lucrativa, onde é que estariam localizados organicamente os recursos humanos: na Direcção Financeira? Que é quem se responsabiliza, em última instância, pelo despoletar do processo de pagamento de salários e benefícios?

Hoje em dia contam-se pelos dedos as organizações com expressão, sejam lucrativas ou não-lucrativas em que as pessoas (os recursos humanos) estão integrados organicamente na área financeira. Este modelo é, aliás, considerado ultrapassado e julgado pouco apropriado para gerir pessoas no actual marco organizacional.

A integração da administração pública no ministério das Finanças corresponde a um modelo desajustado de gestão de pessoas que não permite obter o máximo desempenho das pessoas.

A função de gestão das pessoas, a que corresponde no Estado a administração pública, é hoje uma área que tanto em termos estratégicos, como operacionais, desfruta de grande autonomia orgânica. A localização orgânica da gestão de pessoas não tem nada a ver com a despesa, mas sim com os objectivos que esta deve alcançar e tal como nas organizações privadas se aconselha que a função de gestão das pessoas esteja o mais próximo possível do líder máximo da organização, também no Estado isso deveria acontecer.

O lugar da administração pública, no Estado, é junto do primeiro-ministro. Porque é aí que reside a autoridade para obrigar a fazer aquilo que é necessário fazer no domínio organizacional. O ministro das Finanças poderá sempre dizer que não tem dinheiro: mas esse nunca foi, nem será, no futuro previsível, o problema central das mudanças que há que fazer na administração pública.

estevaomoura@yahoo.com

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