Fisco contra benefício fiscal de comentadores de televisão

11-12-2003
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Informação do gabinete do director-geral dos impostos não foi distribuída

Fisco Contra Benefício Fiscal de Comentadores de Televisão

Segunda-feira, 01 de Dezembro de 2003

Os rendimentos que um comentador recebe quando vai à televisão deve estar em parte isento de IRS? A administração fiscal vê "com dificuldade" que sim. Mas não instruiu os seus serviços nesse sentido

João Ramos de Almeda

Os rendimentos auferidos pelos comentadores de televisão não devem ser considerados como direitos de autor e, como tal, não devem beneficiar de uma redução de metade da tributação sobre as quantias recebidas, refere uma informação do gabinete do director-geral dos impostos. Mas esta nota, apesar de ter o acordo do director-geral, não foi traduzida em instruções para os serviços tributários e fonte oficial do ministério das Finanças não consentiu ao PÚBLICO o seu acesso.

A informação nº AL12/2003 foi elaborada em Junho passado com o fim de uniformizar critérios de tributação de rendimentos provindos de diversas situações (como artigos de opinião, críticas publicadas e comentários em programas televisivos), até ao momento consideradas pela administração fiscal como abrangidas pelo disposto no artigo 56º do Código do Estatuto de Benefícios Fiscais (ver caixa).

O processo foi desencadeado pela Direcção de Finanças de Lisboa, que ainda em 2002 tinha elaborado sobre o assunto, e que, posteriormente, foi apreciado tanto pelos serviços do IRS como da Direcção de Serviços dos Benefícios Fiscais. Caso se concordasse com as propostas, sugeria-se que aquelas direcções de serviço coordenassem a divulgação para as diversas direcções distritais de Finanças. Ora, o gabinete do director-geral apreciou igualmente esses documentos e sistematizou as suas ideias em meia dúzia de páginas.

No que toca aos comentadores, a interpretação da legislação, incluindo o Código do Autor aprovado em 1985, foi taxativa, concordando com o parecer da Direcção de Finanças de Lisboa e das direcções de serviços do IRS e dos Benefícios Fiscais, e considerando que "estes comentários não são obras", baseando-se no artigo 7º do Código do Autor.

"É do conhecimento de todos que os debates ou comentários de factos ou eventos na televisão (por exemplo no Telejornal), efectuados por conhecidas figuras públicas, se têm generalizado", refere a técnica autora da nota. "Ora, independentemente do mérito dos oradores, é com dificuldade que se considera justificável a aplicação da norma da isenção parcial, atendendo a que os benefícios fiscais visam um fim extrafiscal superior ao da própria tributação." Assim sendo, não deveriam beneficiar "da protecção legal dos direitos de autor", com a consequente redução de tributação.

Apesar dessa certeza, levantaram-se outros "problemas de enquadramento". O facto do número 2 do mesmo artigo excluir da isenção as "obras escritas sem carácter literário, artístico ou científico, obras de arquitectura e obras publicitárias", levantava dúvidas e riscos de aproveitamento. Um parecer do Centro de Estudos Fiscais, a funcionar no ministério das Finanças, concluía que "existiria uma 'imperfeição' da norma que levaria a considerar no âmbito do benefício fiscal as obras não escritas, por exemplo materializadas em suporte cinematográfico ou vídeo, radiodifundidas, etc", devido à redacção da norma. Os comentários poderiam ser assim enquadrados como isentos, quando no entender dos serviços não o deviam ser.

O gabinete do director-geral propunha que "essa matéria deverá ser devidamente ponderada" e que se deveria alterar o próprio artigo 56º para aclarar a situação, com vista a articulá-la com o Código do Autor, para que os comentários não fossem considerados "obras".

Apesar dessa sugestão, a conclusão final da informação era clara. Se "os artigos para jornal ou outra publicação periódica são verdadeiras obras para efeito de aplicação" do benefício fiscal - com excepção das "notícias do dia e relatos de acontecimentos diversos com carácter de simples informação de qualquer modo divulgados", o mesmo não acontecia com os comentadores.

"Os rendimentos derivados de debates ou comentários de factos ou eventos na televisão devem ser enquadrados no artigo 7º do Código do Autor como 'debates públicos de interesse comum', desse modo não beneficiando da protecção legal dos direitos de autor e consequentemente da exclusão tributária", esclarece o documento. "De outro modo, será difícil exclui-los do benefício fiscal previsto", pelo que "só se poderá defender a sua exclusão através da interpretação extensiva, sempre difícil em sede de benefícios fiscais". E propunha-se a sua divulgação pelas restantes direcção distritais de Finanças.

Mas isso não aconteceu. O director-geral dos impostos deu o seu aval à informação, mas as instruções não foram distribuídas. O PÚBLICO questionou o ministério das Finanças, há cerca de uma semana, sobre a razão que poderia justificar a falta dessas instruções e solicitou o acesso à informação nº AL12/2003. Insistiu-se mesmo na resposta a esse pedido. Mas até ao encerramento desta edição não foi dada nenhuma resposta.

Informação do gabinete do director-geral dos impostos não foi distribuída

Fisco Contra Benefício Fiscal de Comentadores de Televisão

Segunda-feira, 01 de Dezembro de 2003

Os rendimentos que um comentador recebe quando vai à televisão deve estar em parte isento de IRS? A administração fiscal vê "com dificuldade" que sim. Mas não instruiu os seus serviços nesse sentido

João Ramos de Almeda

Os rendimentos auferidos pelos comentadores de televisão não devem ser considerados como direitos de autor e, como tal, não devem beneficiar de uma redução de metade da tributação sobre as quantias recebidas, refere uma informação do gabinete do director-geral dos impostos. Mas esta nota, apesar de ter o acordo do director-geral, não foi traduzida em instruções para os serviços tributários e fonte oficial do ministério das Finanças não consentiu ao PÚBLICO o seu acesso.

A informação nº AL12/2003 foi elaborada em Junho passado com o fim de uniformizar critérios de tributação de rendimentos provindos de diversas situações (como artigos de opinião, críticas publicadas e comentários em programas televisivos), até ao momento consideradas pela administração fiscal como abrangidas pelo disposto no artigo 56º do Código do Estatuto de Benefícios Fiscais (ver caixa).

O processo foi desencadeado pela Direcção de Finanças de Lisboa, que ainda em 2002 tinha elaborado sobre o assunto, e que, posteriormente, foi apreciado tanto pelos serviços do IRS como da Direcção de Serviços dos Benefícios Fiscais. Caso se concordasse com as propostas, sugeria-se que aquelas direcções de serviço coordenassem a divulgação para as diversas direcções distritais de Finanças. Ora, o gabinete do director-geral apreciou igualmente esses documentos e sistematizou as suas ideias em meia dúzia de páginas.

No que toca aos comentadores, a interpretação da legislação, incluindo o Código do Autor aprovado em 1985, foi taxativa, concordando com o parecer da Direcção de Finanças de Lisboa e das direcções de serviços do IRS e dos Benefícios Fiscais, e considerando que "estes comentários não são obras", baseando-se no artigo 7º do Código do Autor.

"É do conhecimento de todos que os debates ou comentários de factos ou eventos na televisão (por exemplo no Telejornal), efectuados por conhecidas figuras públicas, se têm generalizado", refere a técnica autora da nota. "Ora, independentemente do mérito dos oradores, é com dificuldade que se considera justificável a aplicação da norma da isenção parcial, atendendo a que os benefícios fiscais visam um fim extrafiscal superior ao da própria tributação." Assim sendo, não deveriam beneficiar "da protecção legal dos direitos de autor", com a consequente redução de tributação.

Apesar dessa certeza, levantaram-se outros "problemas de enquadramento". O facto do número 2 do mesmo artigo excluir da isenção as "obras escritas sem carácter literário, artístico ou científico, obras de arquitectura e obras publicitárias", levantava dúvidas e riscos de aproveitamento. Um parecer do Centro de Estudos Fiscais, a funcionar no ministério das Finanças, concluía que "existiria uma 'imperfeição' da norma que levaria a considerar no âmbito do benefício fiscal as obras não escritas, por exemplo materializadas em suporte cinematográfico ou vídeo, radiodifundidas, etc", devido à redacção da norma. Os comentários poderiam ser assim enquadrados como isentos, quando no entender dos serviços não o deviam ser.

O gabinete do director-geral propunha que "essa matéria deverá ser devidamente ponderada" e que se deveria alterar o próprio artigo 56º para aclarar a situação, com vista a articulá-la com o Código do Autor, para que os comentários não fossem considerados "obras".

Apesar dessa sugestão, a conclusão final da informação era clara. Se "os artigos para jornal ou outra publicação periódica são verdadeiras obras para efeito de aplicação" do benefício fiscal - com excepção das "notícias do dia e relatos de acontecimentos diversos com carácter de simples informação de qualquer modo divulgados", o mesmo não acontecia com os comentadores.

"Os rendimentos derivados de debates ou comentários de factos ou eventos na televisão devem ser enquadrados no artigo 7º do Código do Autor como 'debates públicos de interesse comum', desse modo não beneficiando da protecção legal dos direitos de autor e consequentemente da exclusão tributária", esclarece o documento. "De outro modo, será difícil exclui-los do benefício fiscal previsto", pelo que "só se poderá defender a sua exclusão através da interpretação extensiva, sempre difícil em sede de benefícios fiscais". E propunha-se a sua divulgação pelas restantes direcção distritais de Finanças.

Mas isso não aconteceu. O director-geral dos impostos deu o seu aval à informação, mas as instruções não foram distribuídas. O PÚBLICO questionou o ministério das Finanças, há cerca de uma semana, sobre a razão que poderia justificar a falta dessas instruções e solicitou o acesso à informação nº AL12/2003. Insistiu-se mesmo na resposta a esse pedido. Mas até ao encerramento desta edição não foi dada nenhuma resposta.

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